é imanente aos átomos. Esse movimento vertical é velocíssimo -"veloz como o
pensamento", diz Epicuro. Embora o peso varie segundo a grandeza e a forma
dos átomos, todos eles caem paralelamente com a mesma velocidade e na mesma
direção quando se deslocam no vazio sem encontrar obstáculos, ou seja, a altera
ção da velocidade e da direção vertical depende do choque entre átomos de gran
deza e peso diferentes, de maneira que a variação da velocidade e da direção só
ocorre nos corpos compostos.
Se todos os átomos se deslocam paralelamente na mesma direção e com a
mesma velocidade, isso significa que são independentes e nunca se chocam.
Como, então, explicar a origem dos compostos ou o encontro e entrelaçamento
de átomos? A resposta é a teoria da declinação -parégklisis, * clínamen * -segundo
a qual o encontro ou a colisão de átomos decorre do desvio de trajetória de alguns
deles, em qualquer ponto do espaço e em qualquer momento do tempo. Em ou
tras palavras, esse desvio é espontâneo, indeterminado, desprovido de causa e,
portanto, aleatório. A exposição mais clara do clínamen encontra-se no poema de
Lucrécio, Da natureza das coisas:Quando os corpos são levados em linha reta através do vazio e de cima para
baixo pelo próprio peso, afastam-se um pouco de sua trajetória, em altura incer
ta e incerto lugar, e tão somente o necessário para que se possa dizer que se
mudou o movimento. Se não pudessem desviar-se, todos eles, como gotas de
chuva cairiam pelo profundo espaço sempre de cima para baixo e não haveria
para os elementos nenhuma possibilidade de colisão ou de choque, se assim
fo sse, jamais a Natureza teria criado coisa alguma (Lucrécio, Da natureza das
coisas, Livro JI, 216-24).7A teoria da declinação, no entanto, é problemática. Em primeiro lugar, por
que não há textos de Epicuro que mencionem explicitamente a declinação; em
segundo, porque introduz o acaso na Natureza e contradiz o esforço de Epicuro
para eliminar toda e qualquer arbitrariedade no universo. Como, indagam alguns
intérpretes, depois de afastar os deuses e os princípios transcendentes, afirmar a
regularidade, imutabilidade e necessidade da ordem natural, poderia Epicuro in
troduzir o clínamen, um capricho indeterminado e arbitrário?
Todavia, a maioria dos intérpretes responde a essas duas objeções lem
brando, quanto à primeira, que não possuímos a totalidade dos textos de Epicu-
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