Introdução à História da Filosofia 2 Marilena Chauí

(Zelinux#) #1
to regular é necessário, e realiza-se por causa do modo pelo qual tais aglomerados
fo ram comprimidos inicialmente no todo na origem do mundo.

Eis porque alguns intérpretes julgam que a teoria da declinação oferece a pos­
sibilidade de uma explicação cósmica para a liberdade humana, opondo-se ao fata­
lismo e às superstições e infelicidades advindas da crença no destino. Além disso,
com ela surge uma concepção materialista do livre-arbítrio que, fundado na fisica,
não se ergue sobre especulações metafisicas. A esse respeito, escreve Jean Brun:

o ato voluntário não é senão um efeito da declinação dos átomos que constituem o
espírito humano; é, portanto, em função de uma fisica que se encontra definida a
situação do homem no mundo. O sábio não tem senhor, pode declinar fora dos
lances da sorte, exatamente como os átomos podem declinar fo ra de sua linha de
queda (Brun, 1959, p. 60).

Vimos que a fisica epicurista afirma a existência de mundos inumeráveis. Na
Carta a Heródoto, lemos:

Mas também os mundos são inumeráveis (ápeiron), alguns semelhantes a este nosso,
outros diferentes do nosso. Os átomos, com efeito, infinitos como já se demonstrou,
percorrem também as maiores distâncias e os que são capazes de fo rmar um mundo
não se esgotam na fo rmação de um só, nem de um número limitado de mundos,
quer se trate de mundos semelhantes ou desseme1hantes ao nosso. Assim, nada se
opõe a que existam inumeráveis mundos.

Esses mundos não são apenas simultâneos, mas também sucessivos, uma vez
que é próprio dos corpos compostos desagregar-se e desfazer-se. Sem cessar, mun­
dos nascem enquanto outros perecem, mas o todo, ou o universo, permanece imu­
tável, pois os átomos são imperecíveis e um mundo novo nasce da dissolução de um
antigo, assim como em cada mundo um corpo nasce da dissolução de outros.
A pluralidade de mundos e sobretudo a ideia de que muitos deles são dife­
rentes do nosso exprimem a recusa epicurista de todo antropocentrismo, isto é, a
suposição de que existe apenas o mundo habitado pelos humanos e que tal mun­
do é o centro do cosmo.


I0 3
Free download pdf