Introdução à História da Filosofia 2 Marilena Chauí

(Zelinux#) #1
que possamos viver conforme à nossa natureza. Numa alusão crítica aos estoicos,
escreve Epicuro:

Quando dizemos que o prazer é o fim, não queremos referir-nos aos prazeres dos
intemperantes ou aos produzidos pela sensualidade, como acreditam certos igno­
rantes, que se encontram em desacordo conosco ou não nos compreendem, mas ao
prazer de nos acharmos livres de sofrimento do corpo e de perturbações da alma.

Medida, senso do limite e cálculo dos prazeres são trazidos pelo "raciocínio
vigilante" , pelo exercício psíquico, que afasta o ímpeto dos impulsos instintivos e
encontra em toda circunstância os motivos do que é preciso escolher e do é preci­
so evitar, rejeitando todas as falsas opiniões, pois "delas provém a maior perturba­
ção da alma", uma vez que "nada é bastante para aquele que considera pouco o
que é suficiente".
O helenista]osé Américo Pessanha observa que a ética epicurista propõe "o
uso regrado dos prazeres" ou um "controle racional da afetividade", graças ao
qual

coloca a existência humana em sintonia com a natureza das coisas revelada pela físi­
ca e impede que se siga na direção apontada pelo desejo que não expressa uma ne­
cessidade natural, antes constitui a imposição do meio social em seu aparente pro­
gresso (Pessanha, 1992, p. 75).

Essa vigilância tem como princípio aquela que é a fo nte de todas as virtudes,
a virtude da prudência (phrónesis*), vontade esclarecida que


deve ser posta acima da própria filosofia, pois é feita para ser a fonte de todas virtu­
des, ensinando-nos que não há meio de vivermos prazerosamente se não se vive
com prudência, honestidade e justiça e que é impossível viver com prudência, ho­
nestidade e justiça se não se vive prazerosamente. As virtudes, com efeito, são ape­
nas a consequência da vida prazerosa e esta, por sua vez, não poderia realizar-se sem
as virtudes.

E nas Máximas fundamentais Epicuro escreve:


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