Introdução à História da Filosofia 2 Marilena Chauí

(Zelinux#) #1
Não é possível viver fe liz sem ser prudente, honesto e justo, nem ser prudente, ho­
nesto e justo sem ser fe liz. Aquele que está privado de uma dessas coisas, como, por
exemplo, a prudência, não pode viver feliz, mesmo se fo r honesto e justo.

Vontade racionalmente esclarecida, a prudência não é apenas uma virtude
interior, mas determina o modo de relação com os outros. É ela que leva a com­
preender que a justiça exprime o desejo de não prejudicar o outro, de dar a cada
um o que lhe é devido e de realizar pactos para uma vida em comum pacífica. É
também a prudência que faz conceber a honestidade como desejo, na vida priva­
da, de conduta leal de quem não usa subterfúgios na relação com o outro e, na
vida pública, de respeito pelo bem público ou comum. Numa palavra, a prudência
traz segurança interior, confiança na vida em comum e felicidade pública.

o sábio ou a vida feliz


A ética epicurista, explica Pessanha, é uma terapêutica. De fato, duas situações
são possíveis: o corpo pode estar em bom estado, mas a alma conturbada, ou o
corpo pode estar em mau estado e alma sadia. A cada uma dessas situações, duas
terapias ou dois remédios distintos são propostos. Para a primeira, o remédio é a
correção de falsas opiniões e a supressão dos temores ocasionados por elas. Para a
segunda, o remédio consiste na anulação da dor fisica por meio de uma reorientação
das imagens mentais, com o resgate de imagens passadas prazerosas ou a antecipa­
ção de imagens futuras também positivas. Em que consiste, portanto, a sabedoria?

A sabedoria está, assim, em saber contrapor prazeres corpóreos e fazer com que, no
caso de o presente ser doloroso, neutralizá-lo pela memória e pela esperança, no
pressuposto de que a imagem - resgatada do passado ou antecipada do futuro -
pode ser mais forte do que uma sensação (Pessanha, 1992, p. 77).

Esse remédio pressupõe a ação voluntária livre que, como vimos, é o clína­
men na e da alma humana, o desvio do curso necessário das sensações e das ima­
gens pelo auto controle da alma sobre os afetos, isto é, "o desvio em relação à de­
terminação que rege a natureza das coisas". O desvio no tempo, pela memória ou
pela antecipação, assegura alegria em meio à adversidade e afasta o sábio de todo
fatalismo.


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