saber se há ou não um acordo entre a natureza do homem e a do universo [ ... ]. E
somente a fisica pode nos dizer o que vale a natureza para a observação da justiça, a
conservação das amizades e outros sentimentos (Cícero, Dos fins, m, 23-5).
Eticamente, a virtude é uma disposição (héxis) para viver em conformidade
com a natureza; é desejável por si mesma e não pela esperança de uma recompen
sa ou o temor de um castigo; é o exercício da reta razão (orthos lógos) e nela reside
a felicidade. O objetivo da virtude é a vida feliz e esta é o fim (télos) alcançado pela
conformidade ou harmonia da natureza humana com a natureza universal. Ela é
a presença do sumo bem e, portanto, uma perfeição. Assim sendo, nada lhe falta
e por isso o virtuoso não é carente de nada, goza da autarquia, vivendo sem depen
der de coisa alguma. Como relata Diógenes de Laércio, "viver virtuosamente é
viver conforme à experiência das coisas que acontecem naturalmente". Ou seja,
como a lógica e a fisica, a ética se refere à interpenetração dos acontecimentos. É
virtuoso aquele que "quer o acontecimento".
A virtude é um saber - ciência dos bens e dos males - e por isso pode ser
ensinada, isto é, possui teoremas ou um conhecimento inabalável do bem e regras
práticas de conduta segundo a reta razão - é, pois, uma ciência e uma arte de vi
ver. Como os epicuristas, os estoicos consideram que todos -homens e mulhe
res, homens livres e escravos, nobres e plebeus, jovens e velhos, gregos e bárbaros
- podem ser sábios e, portanto, virtuosos. Das regras práticas, duas são as mais
importantes: a primeira enuncia que uma ação não deve ser julgada reta e virtuo
sa pelo seu êxito e sim pelo seu ponto de partida, pois o que conta é a reta disposi
ção interior; a segunda, que uma ação não pode ser julgada reta ou virtuosa pelos
seus aspectos exteriores, mas apenas intrinsecamente, de maneira que duas pes
soas realizando uma mesma ação, uma delas poderá ser virtuosa e a outra, não.
Os estoicos declaram que entre a virtude e o vício não há intermediários -
ou se é virtuoso ou se é vicioso. Afirmam também a unidade da virtude, pois ela é
a ciência do bem e do mal, e é célebre o aforismo: "quem possui uma virtude,
possui todas". Zenão formula a unidade das virtudes tomando todas elas como
formas ou expressões da prudência (prhónesis), pois esta é saber o que se deve ou
não fazer, o que significa saber o que se deve ou não desejar e temer, assim como
o que se deve dar a cada um. Crisipo, entretanto, embora julgue a virtude una e
única, considera que ela pode exprimir-se sob uma pluralidade de perspectivas,
havendo, assim, quatro virtudes principais: prudência (phrónesis), ciência do que
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