Introdução à História da Filosofia 2 Marilena Chauí

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porque não se encontra nenhuma representação verdadeira que seja tal de modo a
não poder ser falsa (Sexto Empírico, Contra os matemáticos, VII, 154).

Há, portanto, duas contradições: a primeira entre a definição da percepção e a
do assentimento, pois os estoicos definem a primeira como assentimento a uma
representação, mas definem o segundo como aquilo que só pode ser dado a um
discurso ou a um juízo; a segunda, entre sua definição da representação verdadeira
e os fatos constatados por eles mesmos, ou seja, a representação verdadeira é tal que
jamais pode tornar-se falsa, porém os fatos negam essa definição - os erros dos
sentidos, os sonhos, as alucinações engendram representações falsas que não po­
dem ser distinguidas das verdadeiras por aquele que as experimenta. Ora, isto signi­
fica que podemos dar assentimento ao falso e, portanto, nunca podemos ter certeza
da verdade, mas somente opinião. Conclui-se, portanto, que ou o sábio deverá
contentar-se com opiniões, como o ignorante e o mau (o que é inaceitável para um
estoico), ou deverá suspender o juízo sobre todas as coisas, isto é, praticar a epoché,
termo cuja invenção muitos intérpretes atribuem justamente a Arcesilau.
Os estoicos reagiram, afirmando que isso conduziria à abstenção pirrônica e
à inatividade completa, deixando sem solução os problemas da vida, únicos que
interessam ao verdadeiro sábio.
Arcesilau era socrático demais para aceitar essa consequência e considerava
a prudência, ou as ações retas, condição da felicidade. Por outro lado, não podia
admitir o dogmatismo estoico, que fazia a vida reta repousar sobre a ciência, mas,
ao contrário, considera que o homem pode realizar ações sem lhes dar o assenti­
mento. É o que acontece, por exemplo, com as ações praticadas por hábito. Ela­
bora, então, um critério (khanón
) para que se possa distinguir as ações praticadas
apenas por hábito e aquelas, prudentes ou retas, que, depois de praticadas, podem
ser razoavelmente defendidas: o eulógon, ou o bom argumento, o argumento ra­
zoável, o plausível. Visto que o estoico aceita que o não sábio é capaz de ações
morais segundo o conveniente (kathekón
), não há motivo para que não aceite o
eulógon.


Carnéades


Considerado um dos pensadores mais sutis e originais da época helenística,
Carnéades, como Sócrates, Pirro e Arcesilau, nada escreveu. Dele sabemos por


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