Introdução à História da Filosofia 2 Marilena Chauí

(Zelinux#) #1
Do mesmo modo que na vida, quando indagamos sobre um fato de pouca impor­
tância, interrogamos uma só testemunha, quando o fato é de máxima importân­
cia, mais de uma testemunha, e se a coisa nos diz respeito, também cada uma das
testemunhas com base nos depoimentos de outras, assim também, diz Carnéades,
nas coisas de pouca importância usamos como critério a representação apenas
provável, nas de alguma importância, a não contradita, nas que concernem a feli­
cidade, a examinada em todas as suas partes (Sexto Empírico, Contra os matemáti­
cos, VIII, 184).

o exame pormenorizado de uma representação aumenta, assim, a seguran­
ça para conservá-la. Bréhier sugere que essa perspectiva introduz uma espécie de
método de análise e síntese, substituindo a evidência, ou a pretensa visão direta
das coisas em si mesmas.
A não contradição entre representações conexas e o exame minucioso de
todas elas permitem reforçar uma opinião ou mudar de opinião, sem supor que
num caso ou no outro uma realidade terá sido alcançada.
Essa teoria do critério levou os intérpretes a falarem no probabilismo de Car­
néades e considerá-lo um intermediário entre o dogmatismo e o ceticismo. Como
observa Bréhier, com o probabilismo, Carnéades se distancia das negações radi­
cais de Arcesilau. No entanto, interpretações mais recentes julgam que o pithanón
de Carnéades é exatamente como o eulogón de Arcesilau: ambos são conceitos
estoicos dirigidos contra os próprios estoicos.
De fato, segundo Diógenes de Laércio, os estoicos definem o eulogón como
um juízo razoável que, em certas circunstâncias, pode ser verdadeiro, e o provável
como o juízo que induz ao assentimento, sem ser necessariamente verdadeiro.
Assim, Arcesilau e Carnéades mostravam que o sábio estoico, a despeito de suas
pretensões, não podia ir além do razoável e do provável.
Quanto à critica da física, os testemunhos disponíveis se referem sobretudo
à teologia natural e à teoria da adivinhação.
Dizem os estoicos que os deuses são seres vivos ou animados, felizes e de
virtude perfeita. Se são animados, argumenta Carnéades, têm sensações e, por­
tanto, os sentidos do paladar, do olfato, da visão, da audição e do tato. Ora, uma
sensação é uma alteração e cada sensação pode se transformar em outra, contrá­
ria. Portanto, os deuses mudam. Ora tudo o que muda é corruptível, logo os
deuses não são eternos, mas corruptíveis - ou seja, não são deuses. Dizem os


(^175)

Free download pdf