Introdução à História da Filosofia 2 Marilena Chauí

(Zelinux#) #1

intermediárias ou convenientes, realizadas segundo os kathékonta. Em outras
palavras, certamente sob o impacto da sociedade romana florescente, passa a dar
um novo lugar aos indiferentes (adiáphora
), como a saúde, a abundância, os
meios de vida e a potência. Não se trata de abandonar o prinápio estoico de que
o sumo bem é a virtude, mas de considerar as coisas que a facilitam e as que a di­
ficultam e que, por sua relação com a ação virtuosa, não podem ser consideradas
simplesmente indiferentes. Embora mantenha a afirmação estoica de que a virtu­
de é a vida conforme à natureza, Panécio introduziu a fórmula "viver segundo as
disposições dadas pela natureza", de maneira que cada um possa realizar a virtude
conforme sua própria constituição natural.
Também introduziu uma distinção, inexistente no antigo estoicismo, entre
virtude teórica - o saber - e prática -justiça, magnanimidade, temperança.
Essas virtudes atuam sobre as tendências para lhes dar racionalidade e retidão,
operando sobre quatro apetites fundamentais: o apetite de puro saber, o de auto­
conservação e conservação da comunidade, o de não depender de ninguém ou
autarquia, e o de moderação.
Sem afirmar a superioridade da virtude prática sobre a teórica, Panécio
deu grande valor à sociabilidade e, por sua relação com Cipião, aderiu ao forte
sentimento ávico romano, deixando esmorecer o cosmopolitismo de seus pre­
decessores estoicos. Segundo Bréhier, Panécio viu em Cipião um homem de
conduta moral e política admiráveis, e, por sua vez, Cipião nele encontrou um
guia moral necessário no momento da ascensão de Roma, com todas as ambi­
ções daí decorrentes. No relato de Cícero, Cipião teria dito a Panécio que aque­
le era o momento para "conduzir os homens demasiado confiantes na fortuna
aos ditames da razão, para se darem conta da fragilidade das coisas humanas e
da sorte".
Mas não apenas isso. Diferentemente de céticos, epicuristas e estoicos do
período antigo, que prezaram a aponía, a ataraxía e a apatheia, Panécio encon­
trou em Roma a vivacidade das ideias ávicas e de um Estado em ascensão, e por
isso, em lugar dos antigos ideais do sábio, escolheu a euthymía,
a alegria de viver,
nascida de viver em paz consigo mesmo, com os outros e com as coisas.
É interessante observar o desinteresse de Panécio pela lógica, pois, se escre­
veu sobre ela, nada nos chegou. E as fontes existentes não mencionam qualquer
escrito sobre o assunto.


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