Introdução à História da Filosofia 2 Marilena Chauí

(Zelinux#) #1
nas a vontade abstrata do governante individual do mundo, também o princípio in­
terior do pensamento tinha que ser uma abstração capaz de trazer apenas uma re­
conciliação formal e subjetiva. Somente um dogmatismo erigido como princípio e
efetivado sob a forma do intelecto poderia satisfazer a mentalidade romana. Essas
filosofias são, pois, conformes ao espírito do mundo romano, visto que a filosofia em
geral sempre se encontra em estreita conexão com o mundo em seu aparecer ordi­
nário (Hegel, 1968, t. 11, 235).

As filosofias helenísticas, portanto, "estavam conformes ao espírito do
mundo romano", que produziu um patriotismo formal e um sistema do Direito,
mas foi incapaz de produzir uma filosofia especulativa, oferecendo ao mundo
apenas bons moralistas e advogados.
Três contrapontos determinam a interpretação do Helenismo por Bréhier,
Windelband e Zeller, tendo como pano de fundo a interpretação hegeliana: o
contraponto entre Ocidente livre e Oriente despótico, ou entre civilizados e bár­
baros (o Helenismo implicando a forte presença do orientalismo); o contraponto
entre filosofia clássica no apogeu e doutrinas helenísticas no declínio; e o contra­
ponto entre a "prosaica Roma" imperial e a "luminosa Grécia" democrática da
"Oração fúnebre" de Péricles.
Antes de examinarmos este último aspecto, acompanhemos brevemente o
historiador da filosofia Giovani Reale quando este examina os principais pre­
conceitos que limitaram durante séculos a compreensão do significado das filo­
sofias helenísticas.
O primeiro preconceito é a imagem decadente da filosofia helenística, fre­
quentemente designada como pós-aristotélica e pós-platônica para indicar que
se trataria do pensamento pouco original de epígonos divididos por disputas es­
téreis. A origem desse preconceito deve-se ao desaparecimento da maior parte
da produção das escolas helenísticas. De seus fundadores não possuímos obras
inteiras e de alguns, sequer uma obra (mesmo porque alguns, como Pirro, nada
escreveram) - possuímos fragmentos, muitos deles indiretos, e testemunhos de
discípulos ou de adversários. E somente a partir do final do século XIX e durante
o século xx textos e fragmentos foram compilados, sistematizados e organizados.
Ora, as escolas helenísticas deixaram Platão e Aristóteles de lado (quando não os
combateram explicitamente) e retomaram muito do pensamento pré-socrático,
transfigurando-o. Visto, porém, que esse pensamento era praticamente desco-


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