nhecido, os intérpretes tenderam a desvalorizar a originalidade com que os filó
sofos helenísticos trataram a antiga filosofia da Natureza.
O segundo preconceito é designado por Reale como "teoricismo", isto é, o
fato de Platão e Aristóteles terem sido erguidos como paradigmas e parâmetros
exclusivos para a avaliação das filosofias, uma vez que (como vimos no volume I)
só no final do século XIX e no século xx os chamados filósofos pré-socráticos passa
ram a ser conhecidos. Uma vez que Platão e Aristóteles foram lidos e interpreta
dos a partir das questões da ontologia e gnosiologia e dos aspectos mais altamen
te especulativos ou teóricos de seu pensamento, era inevitável a desqualificação
das filosofias helenísticas que, além de mal conhecidas por falta de fontes fidedig
nas, deram ênfase aos aspectos práticos ou éticos.
Além disso, como observaJacques Brunschwig, apesar do prestígio inegável
da moral estoica no mundo cristão, não devemos esquecer que o materialismo
(no plano da filosofia da natureza), o empirismo (no plano da gnosiologia) e a re
cusa da transcendência do bem (na ética) tornavam as filosofias helenísticas pouco
propícias à sua absorção pelo cristianismo, diferentemente de Platão e Aristóteles,
cristãmente espiritualizados e adotados pelos Padres da Igreja.
Finalmente, um terceiro preconceito pode ser denominado "classissístico",
ou seja, proveniente daquela imagem idealizada (que examinamos no volume I)
do espírito grego como harmonia, medida, equilíbrio e luminosidade e do que
Hegel havia chamado de 'bela totalidade", isto é, a perfeita fusão e integração
entre indivíduo e pólis, a plena vida cívica. Assim, quando as filosofias helenísti
cas não recusaram a presença do pensamento oriental, de um lado, e do romano,
de outro, passou-se a considerá-las expressões menores e decadentes do belo es
pírito grego.
A ideologia dos historiadores da filosofia
Detenhamo-nos, por um momento, na "Oração fúnebre", que Tucídides
atribuiu a Péricles.
Em sua obra A invenção de Atenas, Nicole Loraux analisa e interpreta o gê
nero retórico-literário grego oração fúnebre ou epitáfio, do qual o exemplo mais
conhecido é aquele que Tucídides, no decorrer da História da Guerra do Pelo pone-
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