Introdução à História da Filosofia 2 Marilena Chauí

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Providência, por causa de seu valor prático, procuravam com suas predicações e
conselhos propagar o hábito da reflexão moral e do exame de consciência (Bréhier,
1962, I, p. LXV).

Dessa maneira, o estoicismo se oferecerá como uma visão de mundo exaus­
tiva e um sistema de pensamento que auxiliarão os indivíduos a encontrar seu
lugar no universo para nele viver virtuosamente. Bréhier denomina os estoicos
do período imperial "diretores de consciência".
Finalmente, é preciso considerar que o desamparo dos indivíduos é fo rte­
mente determinado pela política imperial, à medida que o Senado romano fo i
perdendo poder e o cesarismo dos imperadores fo i impondo a todos insegurança
e instabilidade: aos políticos, exílio e morte, aos ricos, os impostos para custear as
guerras e o clientelismo cortesão, à plebe, a adoração ou execração do governante


da hora. À crueldade dos imperadores contrapunham-se a violência intempestiva


dos tiranicidas, as conspirações no Senado e nos exércitos. Como escreve Hegel,
"o estoicismo só podia surgir numa época de temor e insegurança universais". Ou
seja, somente numa época imersa no medo e na insegurança, uma filosofia pode­
ria propor a ideia da liberdade como liberdade da consciência, indiferente às cir­
cunstâncias, ao trono e aos grilhões.
Dessa maneira, as condições sociais, políticas e culturais tornam compreen­
sível por que a contribuição fu ndamental dos estoicos do período imperial fo i a
ética.
De fa to, no que tange à lógica, o ensino tradicional nas escolas estoicas era a
transmissão comentada das obras dos mestres antigos. Nelas também prevalecia
a ideia (em decorrência das posições de Panécio e Posidônio) de que o aprendiza­
do começava pela lógica (gramática, retórica e dialética), o que será criticado por
Epicteto, para quem somente aquele que aprendeu a se exercitar no domínio das
paixões e no cumprimento das obrigações estará apto a passar à lógica e esta não
pode se contentar com raciocínios instáveis e hipotéticos. Todavia, por considera­
rem que o essencial havia sido estabelecido pelos antigos, nenhuma nova contri­
buição à lógica fo i dada pelos estoicos do período imperial. Deram-lhe duas fu n­
ções instrumentais: a primeira, oferecer teoremas e demonstrações para os
princípios éticos; a segunda, ser uma arma eficaz no combate ao ceticismo, evi­
denciando suas contradições e incoerências. Essa atitude se evidencia, por exem­
plo, numa passagem de Epicteto em que sublinha a importância dos princípios e


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