sempre foi poderosa na filosofia grega: seus representantes mais significativos
foram os atomistas. Por seu turno, o pitagorismo e o platonismo, polemizando
contra a superstição da religião popular e cívica, caminharam rumo à religiosi
dade filosófica: ascetismo e rituais de iniciação e purificação, metempsicose,
imortalidade da alma, visão do Bem em Deus, separação entre o corporal e o
espiritual, numerologia, eis alguns elementos das religiões filosóficas de Pitágo
ras e Platão.
Todavia, simultaneamente a essa continuidade do classicismo no Helenis
mo, a novidade deste último também não pode ser negligenciada. À continuação
de uma religiosidade filosófica, constantemente silenciada pelos historiadores da
filosofia, devemos acrescentar a novidade helenística no modo como religião e
filosofia passam a relacionar-se.
A religião dos filósofos sempre foi exclusiva de um grupo aristocrático que
separava, como vimos no primeiro volume desta série, ensino exotérico (desti
nado a um público amplo) e esotérico (voltado apenas para os iniciados). A expo
sição exotérica evitava um confronto mais profundo com as crenças estabelecidas
- as condenações de Sócrates e de Anaxágoras indicam o risco desse confronto
aberto -, reservando-o ao ensino esotérico, do qual pouco sabemos, mas de que
conhecemos o traço principal: o monoteísmo como crítica do irracionalismo
supersticioso da religião cívico-popular politeísta. No período helenístico, po
rém, essa,religião filosófica popularizou-se, oferecendo-se como substituto para
a antigá�eligião popular e cívica que os tempos presentes haviam desacreditado.
Em resumo, a filosofia (ou a religião filosófica) passou a ocupar o lugar deixado
vazio pela antiga religião.
É aqui que podemos perceber a diferença entre o ideal clássico do filósofo
e a figura do sábio helenístico, embora ambos se dirijam ao mesmo fim - a se
renidade conseguida pelo distanciamento dos tumultos do mundo. O conteúdo
da sabedoria se desloca. O filósofo clássico aspira ao conhecimento especulativo
dos primeiros princípios de todas as coisas e das verdades últimas; sua razão
volta-se para o puramente inteligível e imaterial. Em coptrapartida, o sábio he
lenístico procura o autodomínio de sua vontade racional, fortalecendo-a para
que se exerça como potência dominadora das paixões e dos vícios; sua razão
volta-se para a ética. Eis porque a filosofia aparece como caminho de salvação e,
sob este aspecto, assemelhada às religiões orientais. Além disso, o sábio fala,
agora, daquilo que é muito próximo e conhecido de todos nós - nossas emo-
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