Introdução à História da Filosofia 2 Marilena Chauí

(Zelinux#) #1

  • fato que iria marcá-lo decisivamente - e travou conhecimento com a filosofia
    dos cínicos -tratada no volume I -, pois também se encontrava na expedição
    um discípulo de Diógenes, Onesícrito. Possivelmente, com os cínicos Pirro desco­
    briu a crítica de um fundamento racional das relações sociais e políticas, bem
    como uma forma de indiferença, a adiáphora, * que, como veremos, será central
    no vocabulário cético. E com Onesícrito, aprendeu a interessar-se pelos ginosofis­
    tas e magos hindus. A esse respeito, escreve Diógenes de Laércio que Pirro


[ ... ] teve a possibilidade de estabelecer relações com os ginosofistas da Índia e com os
magos. Disso tirou grande estímulo para suas convicções filosóficas, e parece ter
aberto para si a via mais nobre da filosofia quando introduziu e adotou os princípios
da akatalexía* (ou seja, a irrepresentabilidade ou incompreensão das coisas) e da
epoché (ou seja, a suspensão do juízo) (Diógenes de Laércio, IX, 69).

A prova do impacto dos ginosofistas é dada pelo modo de vida praticado por
Pirro ao retornar à Grécia:

Retirava-se do mundo e buscava a solidão tranquila, de maneira que raramente se
mostrava aos da casa. Comportava-se assim porque ouviu um hindu reprovar a
Anaxarco, dizendo-lhe que jamais poderia instruir alguém a ser melhor enquanto
ele próprio frequentasse as cortes dos reis e os obsequiasse (Diógenes de Laércio,
IX, 63).

Na Vida de Alexandre, Plutarco narra um episódio que teria marcado profun­
damente Pirro: o suicídio do sábio Calano, que se deitou nas chamas de uma pira
funerária, suportando impassivelmente os espasmos e as queimaduras, sem qual­
quer sinal de sofrimento. O fogo, escreve Plutarco, "se aproximou, mas ele não se
moveu; permaneceu deitado, imolando-se segundo o uso dos sábios de seu país".
Qual o testemunho de Calano? Que o sábio é capaz de pôr-se acima do que os
homens consideram males e que pode ser fe liz mesmo ,em meio a tormentos.
Não se trata de dizer que Pirro teria adotado a doutrina religiosa dos ginosofistas,
e sim que, muito provavelmente, articulou o que lhe viera da filosofia dos megá­
ricos, cínicos e democriteanos e a conduta de impassibilidade dos ginosofistas,
isto é, articulou dúvida apaziguante e indiferença fe liz.
Como diz um historiador do ceticismo, a importância da viagem ao Oriente


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