mencionarmos o poema de Tímon, que Pirro afirma que " em toda parte reina o
fe nômeno, seja onde for" (to phainomenon pante sthenei), ou seja, abandonada a
oposição entre ser e não ser resta somente o aparecer das coisas, sua manifestação,
sem qualquer referência a algo em si que nos escaparia.
De fato, Pirro não diz que as coisas aparecem indiferenciadas, instáveis e in
determinadas para nós, ou seja, que seria por uma limitação nossa que as percebe
mos dessa maneira. Em outras palavras, não diz que não temos meios adequados
(sensação, opinião, razão) para diferenciá-las, identificá-las e determiná-las, e sim
que elas não possuem uma natureza que lhes dê uma configuração estável e por
isso mesmo nossos sentidos, opiniões e razão não podem dizer nem o verdadeiro
nem o falso sobre elas. Estão sempre em movimento e nos escapam sempre. Por
conseguinte, não podemos falar nem pensar em essências ou em substâncias, em
algum fundo estável, permanente, idêntico a si mesmo e que seria um sujeito de
predicados. A predicação é impossível e, portanto, não é possível a distinção onto
lógica entre o verdadeiro e o falso.b) Segunda etapa: neutralização do juízo e indiferença
Visto que as coisas são indiferentes ao ser e não ser e que nossas sensações e
opiniões são indiferentes ao verdadeiro e ao falso e que não devemos dar-lhes
nossa confiança, devemos permanecer sem opinião (adoxastos), ou seja, abster
-nos do juízo ou, então, suspender o juízo (epoché).
Juízos pretendem identificar e estabilizar coisas instáveis e indeterminadas,
moventes, que por isso mesmo não podem receber identidade e estabilidade.
Por conseguinte, juízos tornam-se crenças opostas que nos dilaceram e nos pu
xam em direções contrárias. O cético experimenta os dados imediatos da sensa
ção sem lhes dar adesão e sem lhes atribuir um coeficiente de realidade ou de
verdade. Isso lhe permite o equilíbrio entre opiniões, impulsos, motivos e por
isso pode viver não só sem opinião, mas também "sem inclinação (aklineis), sem
oscilação (akradantous)".
A epoché, isto é, suspensão do juízo não significa aurencia de reflexão. Pelo
contrário, significa que diante de toda suposta evidência obtida pelo raciocínio e
de toda ideia fe ita recebida, o cético, por um exercício da vontade, faz aparecer a
opinião ou a ideia contrária para constatar que estas e aquelas se equivalem e se
equilibram, nenhuma delas merecendo mais confiança ou mais adesão que a ou
tra. A suspensão do juízo, portanto, é um exercício intelectual que impede a cris-
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