Visto pelo prisma da elaboração teórica, o cetidsmo de Pirro adota em rela
ção às filosofias instituídas a mesma atitude que assume em relação ao saber em
geral, de sorte que a critica não significa renúnda à filosofia e sim uma nova ma
neira de questionar que aceita a ausênda de resposta. De fato, Pirro se recusa a
levar a sério as pretensões dos filósofos de construir um sistema definitivo. Por
isso expõe suas oposições, as contradições internas a cada filosofia e as incoerên
das entre vida e doutrina de cada filósofo. Ao fazê-lo, não abandona a filosofia e
sim a ilusão de sistema, resgatando a vocação da filosofia como sabedoria refleti
da. A contingênda de todo ponto de vista filosófico salva a diversidade filosófica
em vez de anulá-la porque a pretensão tética das doutrinas (ou a pretensão de
uma linguagem referendal, capaz de dizer o ser) pode ser neutralizada exatamen
te porque se tornou pensável. Na medida em que é recusada a pretensão dogmá
tica de fazer coinddir o pensamento e as coisas, cada filosofia é apenas uma forma
particular de representação que equivale às outras, todas elas nada mais sendo do
que o desejo de introduzir alguma coerênda na diversidade fenomenal.A indiferença de Pirro não é, portanto, indiferença à filosofia, mas indiferença filosó
fica. [ ... ] a pretensa verdade afirmada sobre os fe nômenos pelos filósofos inverte-se
em proveito do estatuto fe nomenal do discurso de verdade. Aparecem [as filosofias]
pelo que são: uma aparência que duplica a aparência, uma porção limitada de uma
série infinita de pontos de vista teóricos possíveis sobre o mundo, o qual é função da
percepção relativa que dele se pode ter (Cossutta, 1994, p. 49).No entanto, é predso, agora, enfrentar uma nova dificuldade: se o ponto de
vista cético encontra-se imerso na série das aparêndas filosóficas, se há o primado
das aparêndas e a instabilidade das coisas, pode haver um discurso cético? As de
signações e as significações não são indiferendadas e intercambiáveis? A canônica
cética, ao evitar tanto uma linguagem referendal quanto uma lógica do absurdo,
permitiria conciliar a necessidade prática de expressão e sua impossibilidade teó
rica? Em suma, estamos diante da objeção permanente dirigida ao cético, na me
dida em que não poderia justificar nem sua ação, nem seu pensamento nem sua
linguagem, embora aja, pense e fale.
Ora, o texto de Aristócles indica a solução pirrônica, qual seja, o uso de ex
pressões e termos negativos, à maneira de Parmênides. Rigorosamente, o "a" que
antecede adiaphora, astathmeta, anepikrita, no tocante às coisas, e adoxastous akli-
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