pensando-os pela obediência e castigando-os pela transgressão. Materialismo por
que concebe a alma como material ou corpórea, portanto, mortal - a vida é
composição de átomos e a morte, separação de átomos - e a recusa da imortali
dade da alma acarreta o abandono da ideia de punição ou recompensa numa vida
puramente espiritual depois da morte.
O helenista HowardJones enfatiza três aspectos na oposição cristã ao "ateís
mo" epicurista. Em primeiro lugar, a configuração contingente dos átomos signi
fica, de um lado, a recusa da ideia de criação do mundo por um criador inteligente
e onipotente e, de outro, a negação do governo do mundo pela Providência divina
como espírito, razão, lei e destino. Em segundo, a indiferença divina, porque con
tradiz o ponto mais alto do cristianismo, qual seja, a Encarnação, em que, por
amor aos homens, o divino se faz humano e aceita submeter-se à Paixão, condição
da redenção e salvação eterna dos homens. Em terceiro, a ideia de que alma é um
aglomerado de partículas atômicas e, sendo composta de partes, é divisível, por
tanto, sujeita à dissolução, contradiz a ide ia de imortalidade. Ora, um cristão,
ainda que vivendo neste mundo,
não concebia sua vida temporal como a soma total de sua existência e sim como
preparação para uma vida por vir que durará toda a eternidade. As condições dessa
existência futura poderiam ser-lhe desconhecidas: os terrores do inferno eram seu
pavor, a visão do paraíso, sua esperança. Porém, estava seguro da sobrevivência
pessoal. A morte não era o fim, mas o inicio. A noção de que o além da morte era o
nada aparecia-lhe como cavilação filosoficamente inaceitável, negação do desígnio
de Deus e do lugar privilegiado do homem entre as criaturas (Jones, 1992, p. 99).Escreve Epicuro:Habitua-te a pensar que a morte nada é para nós, visto que todo o mal e todo o bem
se encontram na sensação, e a morte é ausência de sensação.Não nos surpreende, portanto, que, nas Confissões, Agostinho escreva:
Teria sido a Epicuro que, em meu espírito, eu teria conferido a palma, se eu não
acreditasse na continuação da vida da alma depois da morte e nas sanções de nossos
atos, crença que Epicuro recusou. Era assim que eu punha a questão: se fossemos75