No final do século XIX, em 1884, trabalhos arqueológicos na Ásia Menor des
cobriram Enoanda, na antiga colônia grega da Lígia, e, nela, fragmentos de um
imenso pórtico de pedra (estimado em oitenta metros de comprimento, quatro
metros de altura e um metro de espessura) no qual se encontra gravada uma ins
crição contendo obras de um epicurista, Diógenes de Enoanda, e citações de
obras de Epicuro. Durante mais de cem anos, essa inscrição tem sido objeto de
estudos filológicos, históricos, filosóficos e de edições críticas que visam determi
nar sua data (a data provável é o ano de 122 d.C.), seu conteúdo (há fragmentos de
sete tratados e de sete cartas) e a distinção entre as obras de Diógenes e as de
Epicuro.
Ao analisarmos o significado do Jardim, mencionamos o igualitarismo. A
inscrição de Enoanda introduz uma ideia inconcebível na Grécia clássica (que
distinguia os humanos em helenos e bárbaros): a de humanidade.Visto que, como em tempos de peste, os homens estão doentes em comum das fal
sas opiniões sobre as coisas e que as vítimas se tornam sempre mais numerosas -
com efeito, por causa da emulação reáproca, um se contagia com a doença do outro
como os carneiros -, visto que é justo socorrer também os que viverão depois de
nós, por que eles também são dos nossos, mesmo se ainda não nasceram, e visto que
é próprio de um amigo da humanidade (philantropós) vir em auxílio dos estrangeiros
que vivem entre nós e, portanto, visto que os socorros trazidos por meu escrito
concernem ao maior número de homens, eu quis, usando este pórtico, apresentar
em público os remédios da salvação (Diógenes de Enoanda, Fragmento 3).Além dos textos atribuídos diretamente a Epicuro, há testemunhos indiretos
de seu pensamento, isto é, citações, comentários e interpretações encontrados
nas doxografias de Aécio e Estobeu, bem como em obras de Cícero, Plutarco,
Lucrécio, de neoplatônicos como Pornrio, Proclo e Olimpiodoro, do cético Sexto
Empírico e de alguns Padres da Igreja, como Tertuliano, Clemente de Alexandria
e Agostinho.
A obra como sistema
Observamos, na introdução, que uma das características da filosofia helenís
tica é a articulação interna entre as partes da filosofia, formando um sistema. No
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