Introdução à História da Filosofia 2 Marilena Chauí

(Zelinux#) #1

  1. Os átomos se movem continuamente desde a eternidade. Alguns, ao se
    chocar com outros, se afastam; mas há os que freiam o movimento e vibram
    quando envolvidos por átomos próprios ao entrelaçamento. É da natureza do
    vazio separar os átomos, pois não lhes pode fo rnecer um suporte ou lhes oferecer
    resistência - graças a seu peso, os átomos caem no vazio e essa queda é seu pri­
    meiro movimento; por outro lado, a solidez dos átomos provoca ricochete em
    caso de colisão com outros, à medida que isso lhes permite retornar ao estado
    anterior após a colisão.

  2. Há inumeráveis mundos (kosmói*), tanto semelhantes ao nosso como di­
    ferentes dele. De fato, os infinitos átomos percorrem os mais remotos lugares e os
    que dão nascimento a um mundo não se esgotam nele nem são esgotados pela
    formação de um ou vários mundos e por isso nada se opõe à existência de inume­
    ráveis mundos.
    O todo, ou o universo, é constituído de mundos e um mundo é feito de cor­
    pos dotados de tamanho, peso e forma (comprimento, largura, altura e profundi­
    dade), em perpétuo movimento no vazio; corpos capazes de ocupar um lugar ou
    de abandoná-lo, capazes de agir uns sobre os outros e de sofrer as ações uns dos
    outros porque oferecem contato e resistência. O vazio preenche a função fisica de
    assegurar o movimento local dos corpos (é sua "função cinética") e o átomo, a de
    assegurar a divisibilidade dos corpos.
    Como observa Jacques Brunschwig, essas duas funções decorrem de uma
    reflexão sobre os argumentos de Zenão de Eleia. No caso do movimento local, a
    argumentação de Epicuro consiste em mostrar a impossibilidade de dois corpos
    ocuparem simultaneamente o mesmo lugar, de maneira que um corpo só pode
    mover-se para um lugar se este estiver vazio. No caso da divisibilidade, se se admi­
    tir com Zenão a divisibilidade infinita, será preciso admitir que: a) ou o corpo é
    dotado de grandeza e, portanto, é constituído por um número infinito de partes
    infinitesimais dotadas de grandeza e o corpo teria uma grandeza infinita; b) ou
    que se tais partes não tivessem nenhuma grandeza, o corpo composto também
    não teria grandeza alguma. Além das duas hipóteses serem contrárias à evidência
    da experiência, é necessário que a divisibilidade fisica dos corpos chegue a um li­
    mite indivisível que não pode ser transposto (ainda que os indivisíveis possam ter
    grandezas variadas entre um máximo e um mínimo). Se não fosse assim, um cor­
    po seria composto por partes divisíveis ao infinito e aniquiláveis. Em outras pala­
    vras, a divisibilidade fisica ao infinito introduz o não ser. Ora, o primeiro princípio


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