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A8 QUINTA-FEIRA, 23 DE ABRIL DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO
“N
ão somos o Estado de No-
va York”, afirmou a go-
vernadora do Alabama,
Kay Ivey, em 26 de março, explican-
do porque não ordenou um confina-
mento em seu Estado. Na época, ela
estava certa. Nova York contabiliza-
va duas vezes mais o número de ca-
sos de coronavírus confirmados em
todos os Estados do Sul dos EUA
somados (os 11 Estados confedera-
dos mais Kentucky).
No entanto, agora, o sul está se
assemelhando mais a Nova York. O
vírus vem se propagando por toda a
região com uma velocidade inquietan-
te. Entre o fim de março e o dia 20, o
número de casos em uma dezena de
Estados sulistas aumentou de 11,7 mil
para 127,5 mil, três vezes mais rápido
do que o aumento verificado no plano
nacional.
Como em outros lugares, a maior
concentração de casos tem sido nas
cidades. A Grande Miami e New Or-
leans têm cerca de 15 mil, mais do que
Los Angeles. “Nos dias após o primei-
ro caso confirmado em New Orleans,
o número de pacientes no Estado de
Louisiana cresceu mais rápido do que
o observado em qualquer outra parte
do mundo”, disse Gary Wagner, da
Universidade da Louisiana.
Em meados de abril, a área de New
Orleans registrou a mais alta taxa de
mortes por covid-19 entre todas as ci-
dades americanas, e o Estado é o se-
gundo, depois de Nova York, em nú-
mero de mortes.
O sul também vem registrando um
contágio mais acelerado nos subúr-
bios e em pequenas cidades. Dados do
New York Times mostram que o núme-
ro de doentes vem dobrando em cada
condado. Em 18 de abril, eram 27 con-
dados onde os casos dobravam a cada
dois dias e meio. A taxa de aumento
desde então caiu, mas as infecções
contraídas no início de abril acarreta-
rão hospitalizações e mortes no início
de maio. Segundo Gary Wagner, qua-
tro Estados do sul (Louisiana, Flórida,
Tennessee e Georgia) registraram au-
mentos mais rápidos de casos – duran-
te os primeiros 36 dias após o primeiro
caso confirmado – do que a Espanha e
a Itália.
Em consequência, o sul vem entran-
do no período mais perigoso em que
os números são elevados, o crescimen-
to ainda é alto e os sistemas de saúde
começam a entrar em colapso. Segun-
do o Institute for Health Metrics and
Evaluation, da Universidade de
Washington, Nova York e New Jersey
passaram o pico de demanda hospita-
lar, mas Geórgia e Texas não atingirão
o pico antes do início de maio. “O pior
ainda está por vir”, teme Peter Hotez,
da Universidade Baylor em Waco, Te-
xas. E isso é preocupante não só pelo
problema em si, mas porque três coi-
sas tornam o sul particularmente vul-
nerável à covid-19.
Em primeiro lugar, os governantes
foram lentos na resposta ao vírus e es-
tão sendo muito rápidos na flexibiliza-
ção do confinamento. Quatro governa-
dores de Estados sulistas esperaram
até o início de abril para ordenar um
confinamento, ou seja, quase duas se-
manas depois da ordem baixada na Ca-
lifórnia. E, mal passaram três sema-
nas, sete Estados reabriram ou preten-
dem reabrir tudo.
Como resultado, os sulistas estão fa-
lando e agindo diferentemente. Estão
mais propensos do que outros ameri-
canos a afirmar que não estão preocu-
pados com o vírus, segundo pesquisa
da YouGov para a Economist. E demora-
ram a adotar o distanciamento social.
A segunda razão da vulnerabilida-
de do sul é demográfica. A região
abriga números desproporcionais
de pessoas idosas, negras, hispâni-
cas, doentes, sem um plano de saú-
de, e de americanos encarcerados.
No condado de Sumter, na Flórida,
que registra os maiores complexos
residenciais de idosos, os asilos
vêm tendo um crescimento expo-
nencial de casos e a taxa de mortes
pela covid-19 chega a 10%.
Juntamente com os idosos vulne-
ráveis, os negros apresentam taxas
de mortalidade desproporcional-
mente altas. Na Louisiana, eles re-
presentam 32% da população do Es-
tado, mas 70% das mortes por co-
vid-19. Os negros (e hispânicos) são
mais propensos do que os brancos a
viver em aglomerações e ter uma
saúde mais debilitada. E 24 milhões
deles (58%) vivem nos antigos Esta-
dos confederados. / TRADUÇÃO DE
TEREZINHA MARTINO
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Coronavírus se alastra
pelo sul dos EUA
Região foi a que mais demorou a adotar o confinamento
e tem grande número de idosos, negros e latinos
Internacional
WASHINGTON
Apesar dos alertas de autori-
dades sanitárias, vários Esta-
dos americanos vêm retoman-
do as atividades econômicas
em meio à pandemia do novo
coronavírus. Os EUA têm
mais de 830 mil casos confir-
mados e 46 mil mortos, a
maioria em Nova York, New
Jersey, Massachusetts e Cali-
fórnia, onde a curva de contá-
gio mostra desaceleração do
vírus. O problema é que, em
um país grande e diverso, cien-
tistas temem que a crise ainda
não tenha atingido o pico em
Estados menos populosos.
Pressionados por empresá-
rios, grupos de extrema direita e
pelo presidente Donald Trump,
muitos governadores, principal-
mente os republicanos, estão
acelerando o relaxamento das
medidas de distanciamento so-
cial, ainda que os cientistas di-
gam que pode ser cedo demais e
alertem que uma segunda onda
de infecções pode ser mais de-
vastadora do que a primeira.
Amanhã, os moradores da
Geórgia terão permissão para
voltar à academia, cortar o cabe-
lo e até fazer tatuagens. Na se-
gunda-feira, já vão poder jantar
em restaurantes e ir ao cinema.
O relaxamento tem a assinatura
do governador republicano
Brian Kemp, apesar dos sinais
de que o surto está apenas come-
çando no Estado.
Deborah Birx, membro da for-
ça-tarefa da Casa Branca de
combate ao vírus, reagiu e disse
que não sabe como as pessoas
podem operar salões de beleza
e estúdios de tatuagem e man-
ter o distanciamento social ao
mesmo tempo. “Se existe uma
maneira de fazer essas coisas,
eles podem”, afirmou. “Eu não
sei como. Mas as pessoas são
muito criativas.”
No Tennessee, o governador
Bill Lee, também republicano,
disse que não estenderia a qua-
rentena, que expira dia 30. Se-
gundo ele, “a grande maioria
das empresas” terá permissão
para reabrir em 1.º de maio.
Kemp e Lee expressaram preo-
cupação com as liberdades civis
e com a tensão que o fechamen-
to da economia provocou.
Em Ohio, o governador, Mike
DeWine, também autorizou a
reabertura de empresas no pri-
meiro dia de maio. “Faremos o
que achamos certo, que é tentar
reabrir a economia”, disse.
“Mas faremos com cuidado pa-
ra não matarmos muita gente.”
Na Carolina do Sul, o governa-
dor Henry McMaster disse que
lojas de departamento e outras
de varejo, que antes eram consi-
deradas não essenciais, pode-
riam reabrir na semana que
vem, mas seguindo distancia-
mento social. O acesso às praias
também será liberado.
Embora haja sinais de que o
surto está se estabilizando em
partes dos EUA, a ameaça cresce
em outros Estados, principal-
mente no sul. Robert Redfield, di-
retor do Centro de Controle e
Prevenção de Doenças (CDC),
disse que uma segunda onda de
infecções no país teria efeitos
muito piores, uma vez que coinci-
diria com o início da temporada
de gripe. “Existe a possibilidade
de que o ataque do vírus no inver-
no (em dezembro) seja ainda
mais difícil do que este que acaba-
mos de passar”, disse Redfield,
que teme misturar casos de coro-
navírus e H1N1 no mesmo perío-
do. Ele lembrou que, durante a
pandemia de H1N1, em 2009, os
EUA registraram a primeira on-
da de casos na primavera, segui-
da por uma segunda onda maior
no outono e inverno, durante a
temporada de gripe. / NYT
Estados americanos desafiam riscos de
novas infecções e retomam economia
PANDEMIA DO CORONAVÍRUS
EUA têm mais de 830 mil casos confirmados, a maioria em Nova York, New Jersey, Massachusetts e Califórnia, onde o contágio vem
diminuindo; cientistas temem que pandemia ainda não tenha atingido pico em outras regiões, que podem estar relaxando cedo demais
O
coronavírus atingiu
em cheio uma indús-
tria de US$ 74 bi-
lhões nos Estados Unidos.
Organizadores, DJs, bandas,
floristas, fotógrafos e forne-
cedores de comida ficaram
sem trabalho. Mas, mesmo
durante a pandemia, as pes-
soas não desistiram do so-
nho de se casar.
Desde sexta-feira, o condado
de Orange, na Califórnia, vem
realizando cerimônias no esta-
cionamento do Honda Center,
ginásio usado pelo Anaheim
Ducks, time da liga americana
de hóquei no gelo. Um dos pri-
meiros casais foi Natasha e Mi-
chael Davis, que na segunda-fei-
ra compareceram diante da es-
crivã Erika Patronas para conso-
lidar sua união.
Ao jornal Los Angeles Times , o
escrivão Hugh Nguyen disse
que o condado vinha recebendo
uma grande demanda de noivos
que tiveram de desmarcar a ceri-
mônia e não sabiam o que fazer
- muitos precisam de uma certi-
dão de casamento para ques-
tões práticas, como dividir o pla-
no de saúde em um momento
decisivo. “As pessoas queriam
casar pelo FaceTime”, disse
Nguyen. “Por isso, começamos
a procurar lugares que tivessem
um vidro separando a equipe de
funcionários e o público.”
A primeira opção foram os ci-
nemas, que foram logo descarta-
dos porque estavam todos fe-
chados. O centro de conven-
ções do condado de Orange
também foi desconsiderado,
porque está abrigando morado-
res de rua durante a pandemia.
Foi quando o Honda Center ofe-
recer o estacionamento. Como
os guichês já são vedados, por
proteção, era o local perfeito.
Apenas uma pessoa pode
acompanhar a cerimônia. Ami-
gos e parentes devem aguardar
a distância, nos carros. Mas a
testemunha pode gravar e trans-
mitir o casamento por Zoom –
como geralmente acontece.
Na semana passada, o Estado
de Nova York já havia autoriza-
do cerimônias por teleconfe-
rência. “Não há desculpa agora
quando a questão é casar.
Sem desculpa. Você pode fa-
zer isso por Zoom. Então,
sim ou não?”, brincou o go-
vernador nova-iorquino, An-
drew Cuomo. Os Estado de
Ohio e Colorado também
adotaram medidas seme-
lhantes.
Enquanto isso, a indústria
americana do casamento pas-
sa os dias calculando os pre-
juízos. Ninguém sabe quanto
tempo pode aguentar sem re-
ceitas e se tem direito de pe-
dir ajuda financeira ao gover-
no. Há ainda a preocupação
extra sobre como a pande-
mia pode mudar as cerimô-
nias nos próximos anos. / NYT
Estados sulistas querem
reabrir tudo o quanto antes,
apesar do número crescente
de pessoas com covid-
l Pressa
UNIÃO EM DIAS DE
SEPARAÇÃO TOTAL
“Faremos o que achamos
certo: tentar reabrir a
economia. Mas faremos
com cuidado para não
matarmos muita gente”
Mike DeWine
GOVERNADOR DE OHIO
APU GOMES/AFP
Proteção. Natasha e Michael Davis em cerimônia celebrada pela escrivã Erika Patronas, no estacionamento do Honda Center, em Anaheim
Sem festa
Califórnia faz casamentos em estacionamento
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