Folha de São Paulo - 25.03.2020

(nextflipdebug5) #1

aeee


quena escala,com 200 paci-
entes chineses, nãotevesu-
cesso. Épossível queofracas-
so se deva ao estado já muito
deterioradodasaúdedesses
doentes.OtestedaOMStam-
bém deverá oferecer adupla
deremédios juntocom inter-
feron-beta, substânciaregu-
ladoradaatividade do siste-
madedefesadoorganismo.
Por fim, os ensaios clínicos
do Solidaritytambémavalia-
rãoodesempenhodacloro-
quina, droganormalmente
empregadacontraamalária.
Apesar da empolgação dos
presidentesDonaldTrump e
Jair Bolsonarocom essamolé-
cula, seu sucessocontra aCo-
vid- 19 está longedeser mira-
culoso,aomenos por enquan-
to.Osrelatospublicadosaté
agorapor cientistas chineses
efrancesesnãosão detalha-
dososuficienteparaavaliar
aeficácia do medicamento.
Testescomoutros vírus in-
dicam queofármacoprecisa
ser usado em dosesmuitoal-
tasparater efeito, comefeitos
colaterais sérios,inclusive so-
breocoração—que jáéum
fatorderisco paramuitos pa-
cientescomCovid- 19.
Diversasequipes de pesqui-
sa mundo afora, seguindoa
mesma lógicadaOMS, estão
fazendo análises virtuais de
fármacosjáconhecidos,veri-
ficando se suaestrutura mole-
cular poderiabloquearainva-
são docoronavírus nascélu-
las.Avaliações desse tipo po-
dem acelerarabuscaporre-
médios eficazesequetalvez
já estejam em usocontraou-
tras doenças,oquetambém
facilitaria ostestes.
Otrabalhocompossíveis
vacinascontraoSars-CoV- 2
também aconteceemritmo

acelerado. NosEUA,uma em-
presa de biotecnologiaeum
institutoprivado,com finan-
ciamentodogovernofede-
ral, já estão ministrandoavo-
luntários umavacina de RNA,
considerada bastantesegura
porque os pacientes nãote-
rãocontatocomovírusreal.
Emvezdisso,avacina insere
um trecho do materialgenéti-
co do parasitanas células hu-
manas, as quais, porsuavez,
encarregam-se daprodução
de uma proteína viral.
Isso seria suficientepara
queoorganismo“achasse”
quefoiinvadido pelo vírus e
iniciasse umareaçãode de-
fesa, produzindo anticorpos,
moléculas cuja funçãoéneu-
tralizaroinvasor.Assim,osis-
tema de defesa docorpo esta-
ria preparado para ocontato
comoverdadeiroSars-CoV- 2.
Amesma abordagem es-
tá sendoadotada pela Cure-
Vac, uma empresa alemã, e
por pesquisadores chineses.
Oproblemaéque ainda não
houveaprovação devacinas
de RNAparausocomercial.

Algunstestes indicam que a
reação do sistema imune que
elasconseguemprovocarnão
seriaforteosuficientepara
proteger os pacientes.
Pesquisadores do Incor
(InstitutodoCoração,liga-
doàUSP) estão trabalhando
comuma abordagem alter-
nativa, que usa as chamadas
VLPs(partículas semelhantes
avírus). Essencialmente, são
“cascas”virais, sem material
genético, mascarregando pro-
teínas do vírus parainduzir a
respostadosistemaimune.
Enquantoremédiosevaci-
nas sãotestados,écrucialma-
pearquem jáfoiinfectado pe-
lo vírusesetornou imune por
meio detestesrápidosebara-
tos. Diversos grupos de cien-
tistas mundo aforaestão tra-
balhandonisso,entreosquais
pesquisadores do Laboratório
de Engenharia de Cultivos Ce-
lulares da Coppe/UFRJ.
Ogrupo,liderado por Leda
Castilho, planejadisponibili-
zaratecnologia paraareali-
zação de doistestes diferen-
tes, um deles laboratorial e
outrorápidoedefácilvisua-
lização,similaraumtestede
gravidez defarmácia, afirma
apesquisadora.
“Estamosfazendooajuste
finoevalidando as amostras
testadas,comparandocomos
resultados detestes dePCR
[maiscarosecomplexos, que
identificamomaterialgené-
ticodovírus no sangue]”,ex-
plicaela. Tais testes custariam
apenas um quartodosfeitos
atualmente commaterialge-
nético, estima Castilho.
Setudocorrer bem, seria
possível transferiratecnolo-
gia paraempresaseentida-
desgovernamentais dentro
de 30 ou 40 dias.


  • PatríciaPasquini


sãopauloAauxiliar de enfer-
magemNair PereiraBarbosa
tinha três marcasregistradas:
asolidariedade,odom de me-
lhoraravida das pessoaseo
lagartocozido quefazia aos
domingos.
Nair tinhaocoração gran-
de, um ombroaconchegante
esábiaspalavras. Quandoas


amigasestavam aflitas, entra-
va em açãoadoceconselhei-
ra.“Ela semprefoi referência
entreasamigaseasajudava
emtodas as situações. Lide-
rava todo mundo”,conta afi-
lha,ajornalistaSonia Maria
Barbosa Dias, 53.
Asadversidades queenfren-
toununcaimpediram que
seu passofosse semprepa-
ra afrente.

Nair nasceu em Igaporã,
no interiordaBahia.Naépo-
ca,olocal não tinha status
de município.Porcausa dos
estragoscausados pela seca,
seu pai abandonouolugar e
conseguiu empregoemuma
fazenda decafé,naregião de
Bauru (a 329 km de SP). Anos
depois, quase na adolescên-
cia,Nair mudou-se paraMi-
randópolis (a 594 km de SP).
Quandoatingiuaidade
adulta, passouatrabalhar co-
mo empregada domésticana
capital paulista.Nair fezcur-
so de auxiliardeenfermagem
na CruzVermelhaeempou-
cotempo entrou paraoHos-

pital Infantil DarcyVargas, on-
de ficou por 32 anos.Paralela-
mente,atuou em outros hos-
pitais, na mesma área.
Por onde passou,fezami-
gos. Um grupoaacompanha-
va desdeoinício de suaativi-
dade na enfermagem.Nos úl-
timostempos,asaudade tinha
data ehoraparaacabar,pois
as amigas sereencontravam
pelo menos umavezaoano.
Cada uma tinhasua história
especial paracontareNairfoi
protagonistadetodas.
Ela secasouetevedoisfi-
lhos,mas ficou viúvacedo,
aos 45 anos. Cuidou dosfi-
lhoseenfrentouavida sozi-

nha. Quandocompletou 65
anos,refezavidacomumno-
vocompanheiro.
Comogostavadasativida-
descomunitárias, entroupa-
ra oLianGong,uma prática
corporal chinesa paraelimi-
nar doreseequilibrarcorpo
emente.
DevotadeNossa Senhora
do Perpétuo Socorro, Nair ia
àmissatodos os domingos.

Aspalavras decoragemecon-
fiançasempre partiam dela.
Nair morreu dia 23 de mar-
ço,aos 84 anos, porcomplica-
ções causadaspela Covid- 19.
Deixaocompanheiro,doisfi-
lhosedois netos. “Ficou uma
lacuna provocada pelocoro-
navírus. Os amigosefamilia-
resnão conseguiram se despe-
dir dela.Omomentonão per-
mitiu”,lamentaSonia.

Protagonizou histórias de


amizadeesolidariedade


NAIR PEREIRABARBOSA( 1935 - 2020 )


MORTES [email protected]


ProcureoServiço Funerário Municipal de São Paulo:
tel. ( 11 ) 3396 - 3800 ecentral 156 ;prefeitura.sp.gov.br/servicofunerario.
Anúncio pagonaFolha:tel. ( 11 ) 3224 - 4000 .Seg.asex.: 10 hàs 20 h. Sáb.edom.: 12 hàs 17 h.
Aviso gratuitonaseção:folha.com/mortesatéas 18 hparapublicação no dia seguinte
( 19 hdesextaparapublicação aosdomingos) ou pelotelefone ( 11 ) 3224 - 3305 das 16 hàs
18 hemdias úteis. Informe um númerodetelefone parachecagem dasinformações.

coronavírus saúde


QUARTA-FEIRA,25 DE MARÇODE 2020 B7

Asarmastestadascontraocoronavírus
Vacinasemedicamentos são postosàprova mundo afora

Vacinas comogenoma do vírus

Vacina com“casca de vírus”
Abordagemadotadapor
cientistasdoIncor (Instituto
do Coração, da USP)usaas
VLPs,“cascas”devírussem
materialgenético(portanto,
também nãodesencadeiam
infecções), unidasauma
molécula do coronavírus.
Com isso,esperam produzir
uma imunidademaisfortedo
organismo ao patógeno

Medicamentos
já conhecidos
AOMS(Organização
Mundial daSaúde)está
coordenando umteste
amplo, em dezpaíses
diferentes, do uso de
diversasdrogas
antivirais (entreelas
duasjáempregadas
contraoHIV)ea
cloroquina,
medicamento contra a
malária.Tais remédios
poderão sertestados
sozinhos ou em
diferentes
combinações

Simulações de computador
buscamremédios
Cientistasestãousando
supercomputadorescomo o
Summit,daIBM,parasimular
ainteração entre aproteína
queovírus usa parase
conectaràs células e
“bibliotecas”demilharesde
moléculas já conhecidas.Isso
podeencurtarabuscapor
novas drogascontrao
coronavírus

Ferramentasdediagnóstico
Pesquisadores de instituições americanaseda
UFRJestãocriando metodologias para
identificaranticorposde reaçãoaocoronavírus
nosangue humano.Odadoéimportante para
mapear comoovírus estáseespalhandopela
populaçãoetraçarestratégiascontraele

ORNA dovírus,
inserido nas
célulashumanas,
serviria de receita
paraaproduçãode
proteínasvirais,
ativando,desse
modo,osistema
de defesado
organismo sem
risco deque a
doençaaparecesse

Pesquisadores de empresas e
institutos depesquisanos
EUA,naChinaenaAlemanha
iniciaramostestesdevacinas
deRNA,molécula“prima” do
DNAque compõeomaterial
genético do Sars-CoV- 2

2


3


4


5


1


Coronavírus

Célula humana

RNA
dovírus
Proteína
viral


Estamosfazendo
oajustefino e
validando as
amostrastestadas,
comparandocom
osresultados de
testes dePCR

Leda Castilho
pesquisadoradoLaboratório de
Engenharia de Cultivos Celulares
da Coppe/UFRJ

Funcionário da empresa alemã CureVac atua em pesquisa
paravacinacontraaCovid-19 Andreas Gebert-12.mar.20/Reuters

Pandemia geracorrida globalpor vacinas


Experimentos vão de novosusos paramedicamentos jáexistentesatécnicas inovadoras de imunização



  • Reinaldo José Lopes


sãocarlosAemergência glo-
bal de saúde públicacriada
peloavançodonovocoro-
navírus estálevandoaode-
senvolvimentoeteste deva-
cinas, medicamentosedi-
agnósticos numavelocidade
sem precedentes.
Astentativas de barrar os
pioresefeitosdapandemia
envolvemtantoabordagens
inovadoras, ainda sem aprova-
çãoparauso comercial, quan-
to medicamentos que já são
usados hádécadascontraou-
tras doenças.
Detodosostestes emexecu-
çãoouplanejadosatéagora,
omais ambicioso estásendo
coordenado pela OMS (Orga-
nização Mundial daSaúde) e
recebeonomedeensaioSoli-
darity(“Solidariedade”).
Oobjetivoéabranger alguns
milharesde pacientesemdi-
versos países —por ora, estão
confirmados braços doteste
clíniconaArgentina, no Cana-
dá,naFrança, no Irã,naNoru-
ega, na ÁfricadoSul enaEs-
panha, entreoutras nações.
Para desburocratizar ao má-
ximooinício do ensaio,os
hospitais que participarem
oferecerão aos doentes um
formulário deconsentimen-
toinformado (no qualopa-
cienteconcorda em ser inse-
rido no ensaio clínico)e, no
caso dosqueconcordarem,
apessoa serácolocada auto-
maticamentenumcadastro
eletrônicodaOMS.
Esse participante, então,
passaareceberumdos qua-
trotratamentos pré-selecio-
nados peloteste, ou então o
tratamento-padrão oferecido
atéagoraaosinfectados pelo
Sars-CoV- 2 .Aescolha datera-
pia específicaparacadapaci-
enteserárandomizada(ouse-
ja, aleatória), procedimento
feitoparadiminuir as chan-
cesdeque haja um viés esta-
tísticonos resultados.
Boaparte dos pacientes de-
ve receber medicamentosque
foramcriados paracombater
outros tipos de vírus.
Um deleséoremdesivir,
projetado paraenfrentar o
ebola—eque nãoteve suces-
so duranteumsurtorecente
da doençanaRepúblicaDe-
mocráticadoCongo.
Oremdesivir bloqueia a
ação da chamada RNA-poli-
merase,molécularesponsável
porformarafita de material
genéticodovírus(queéfei-
ta de RNA,molécula “prima”
do DNAdonúcleodas células
humanas). Emtestescomani-
mais, ele apresentou eficácia
contraoutroscoronavírus,
antes queoatual aparecesse.
Dois outrosfármacos inclu-
ídos no ensaio clínicodaOMS
sãoolopinavireoritonavir,
produzidos em grande escala
desdeocomeçodeste século
como medicamentoscontra
oHIV,causadordaAids. Am-
bos barramaaçãodemolécu-
las do vírus importantes para
a“linha de montagem”desu-
as proteínas.
Nopapel,seria um meio ide-
al de enfrentaroSars-CoV- 2 ,
masoprimeirotestedepe-

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