O Estado de São Paulo (2020-05-09)

(Antfer) #1

%HermesFileInfo:B-3:20200509:
O ESTADO DE S. PAULO SÁBADO, 9 DE MAIO DE 2020 Economia B


Ociosidade global


pode tirar


projetos do País


Cleide Silva


A pandemia do coronavírus,
que forçou o fechamento de
todas as fábricas de veículos
do País, levou o setor a regis-
trar em abril seu pior desem-
penho em produção em 63
anos, quando o dado come-
çou a ser divulgado. Saíram
das linhas de montagem ape-
nas 1,8 mil unidades, volume
que, em épocas normais, é
muito próximo do que a Fiat
produz em um dia na fábrica
de Betim (MG).

O dado de abril representa
queda de 99% em relação ao mes-
mo mês de 2019 e também ante
março passado. “Nem em perío-
dos de greve ou de outras crises
tivemos uma produção tão bai-
xa”, diz o presidente da Associa-
ção Nacional dos Fabricantes de
Veículos Automotores (Anfa-
vea), Luiz Carlos Moraes.
No acumulado dos quatro pri-
meiros meses do ano foram pro-
duzidos 587,7 mil automóveis,
comerciais leves, caminhões e
ônibus, 39% menos na compara-
ção com igual período de 2019.
A exportação também teve o
pior resultado das últimas duas
décadas, com o embarque de
96,2 mil veículos, queda de 31%
ante o primeiro quadrimestre
do ano passado.
Mesmo com produção tão bai-
xa, fábricas e revendas ainda
têm 128 mil carros em estoques,
suficientes para quatro meses
de vendas de acordo com a atual
média diária de negócios. As fa-
bricantes estão apelando para
promoções como pagamento
da primeira parcela do financia-
mento só em janeiro de 2021 ou
venda a preços de fábrica.
As vendas de veículos novos
somaram 55,7 mil unidades, nú-
mero 76% inferior ao de um ano
atrás. No acumulado, os 613,
mil veículos vendidos estão
27% abaixo do resultado de



  1. Só no Estado de São Pau-
    lo, que normalmente fica com
    25% do total das vendas no País,
    a queda foi de quase 100% – de
    58,7 mil unidades em abril do
    ano passado para 551 neste ano.
    O segmento de carros usados
    reduziu as vendas em 84% – de
    946 mil unidades em janeiro pa-
    ra 153 mil no mês passado. Mo-
    raes ressalta que, assim como
    as fábricas, a maioria das con-
    cessionárias está fechada. Vá-
    rias marcas estão reforçando as
    vendas pela internet e entregan-
    do carros na casa do cliente.


Instabilidade política. A alta
cambial é outro problema para
as montadoras. Na opinião de
Moraes, grande parte da “desva-
lorização exagerada” não é por
problema econômico, mas po-
lítico. “Agentes que deveriam es-
tar trabalhando de forma coor-
denada para reduzir a crise es-
tão prejudicando ainda mais a
situação.” Segundo ele, há po-
líticos que ainda não percebe-
ram a gravidade dessa crise.
O executivo faz um apelo aos
Poderes Executivo, Legislativo
e Judiciário para que trabalhem
em conjunto para que o País te-

nha um achatamento da curva
das contaminações pelo corona-
vírus e, assim, poder ajudar na
retomada econômica. “Todo
dia tem uma crise de manhã, de
tarde e de noite”, critica ele.
A instabilidade política pode
inclusive prejudicar a manuten-
ção de empregos. A maioria das
empresas fez acordos de redu-
ção de jornada e salários com
manutenção de empregos por
cerca de três meses, mas, passa-
do esse período, é difícil falar em
garantias, diz Moraes. “Vai de-
pender da gestão correta da cri-
se para achatar a curva da reces-

são.” As montadoras empregam
hoje 125,3 mil trabalhadores, 4,
mil a menos que há um ano.
A Anfavea tem negociado
com o governo há 40 dias uma
linha de financiamento para aju-
dar as empresas da cadeia auto-
motiva que, segundo a entida-
de, estão sem liquidez de caixa e

com dificuldades financeiras.
O setor propõe dar como ga-
rantia de empréstimos os R$ 25
bilhões em crédito de tributos
federais e estaduais que deve-
riam ter sido devolvidos às em-
presas mas seguem nos cofres
dos governos. “Não estamos pe-
dindo nenhum subsídio”, afir-

ma Moraes. Ainda não há retor-
no por parte do Ministério da
Economia. Bancos privados
que participam das discussões
queriam que as matrizes das em-
presas assumissem as garan-
tias. Montadoras, autopeças e
revendas precisam de R$ 40 a
R$ 45 bilhões em capital de giro.

PANDEMIA DO CORONAVÍRUS


Produção de


veículos cai 99%


com pandemia


Daniela Amorim / RIO


A pandemia do novo coronaví-
rus fez os preços da economia
registrarem em abril a maior
queda em mais de duas déca-
das. O Índice Nacional de Pre-
ços ao Consumidor Amplo (IP-
CA) recuou 0,31%, a segunda
maior deflação já registrada des-
de o início do Plano Real, de
1994, informou o Instituto Bra-
sileiro de Geografia e Estatísti-
ca (IBGE).
“É o menor resultado em
mais ou menos 22 anos”, ressal-
tou Pedro Kislanov, gerente do
Sistema Nacional de Índices de
Preços do IBGE. “Pode haver
questão de demanda, menos
gente nas ruas. Mas boa parte


da economia realmente está pa-
rada, e a gente sente esse efeito
principalmente no componen-
te de serviços”, disse Kislanov.
A taxa de inflação acumulada
em 12 meses desceu a 2,4% em
abril, ante uma meta de inflação
de 4% perseguida pelo Banco
Central ao fim deste ano. O re-
sultado foi o mais baixo desde
fevereiro de 1999.
“Em linhas gerais, o índice e
seus núcleos vêm reforçar a ne-
cessidade de corte de juros na
reunião de junho”, avaliou Éto-
re Sanchez, economista-chefe
da Ativa Investimentos, em no-
ta. O BC já reduziu nesta sema-
na a taxa básica de juros, a Selic,
de 3,75% para 3% ao ano, a séti-
ma redução consecutiva e me-
nor patamar da história.
Em abril, os alimentos volta-
ram a pesar mais no orçamento,
mas as famílias gastaram me-
nos com transportes, artigos de
residência, habitação, saúde e
cuidados pessoais, despesas
pessoais e comunicação.

A crise do petróleo, que derru-
bou a cotação da commodity no
mercado internacional e fez a
Petrobrás reduzir os preços dos
combustíveis nas refinarias,
deu a principal contribuição pa-
ra a deflação de abril. O preço
da gasolina recuou 9,31%.
As passagens aéreas ficaram
15,10% mais caras, mas a coleta
de preços foi feita em fevereiro,
antes do agravamento do surto
da covid-19 no Brasil. “Provavel-
mente o maior impacto de co-
vid ( sobre os preços das passagens
aéreas ) será sentido agora em
maio”, ressaltou Kislanov.

Sobe e desce. Se por um lado,
em meio à pandemia, houve
maior demanda por alimentos,
por outro, caiu a procura por
uma série de outros serviços. “A
gente coleta os preços todo o
dia. É difícil identificar um pon-
to específico onde começa ( o im-
pacto da covid-19 ). Quando co-
meçaram as medidas de isola-
mento social, aumentaram os

impactos de demanda sobre o
IPCA. As pessoas indo mais ao
mercado, comprando mais ali-
mentos para cozinhar em ca-
sa”, mencionou Kislanov. “À
medida que começou o isola-

mento social, as pessoas passa-
ram a consumir menos servi-
ços. Muitos serviços fecharam.
No caso daqueles ainda aber-
tos, houve redução de preços pa-
ra atrair consumidores.”

O grupo Alimentação e Bebi-
das saiu de uma taxa de 1,13%
em março para 1,79% em abril.
Os alimentos ficaram mais ca-
ros por uma pressão de deman-
da, mas também por questões
climáticas que prejudicaram al-
gumas lavouras, o que reduziu a
oferta de alguns itens in natura.
“A única coisa que está puxan-
do para cima a inflação ao con-
sumidor é aquilo que afeta qua-
se todos os brasileiros, que é a
alimentação. O resto é o que a
gente não está conseguindo
consumir, como salão de bele-
za, clube, teatro, cinema. Bens
duráveis ninguém vai comprar
agora, máquina de lavar, gela-
deira, carro. Quem está empre-
gado não vai se endividar, quem
já se desempregou não vai ter
renda. E não tem no radar pres-
são de administrados. Esses
três grupos estão com tendên-
cia de queda mesmo e respon-
dem por cerca de 80% da infla-
ção ao consumidor”, enumerou
André Braz, coordenador do
Índice de Preços ao Consumi-
dor do Instituto Brasileiro de
Economia da Fundação Getú-
lio Vargas (Ibre/FGV).

Estoques da indústria e do varejo dão um salto e batem recorde. Pág. B4}


● Resultados do setor automotivo de janeiro a abril

QUEDA HISTÓRICA

FONTE: ANFAVEA INFOGRÁFICO/ESTADÃO

EM MILHARES DE UNIDADES

ABR
2019

ABR
2019

ABR
2020

ABR
2019

ABR
2020

Produção Vendas Exportações

0

100

200

300

0

100

200

300

0

15

30

45

1,

55,
7,

Acumulado no ano
587,7 mil
39,1% a menos que em 2019

Acumulado no ano
613,8 mil
26,9% a menos que em 2019

Acumulado no ano
96,2 mil
31% a menos que em 2019

ABR
2020

Resultado de abril é o pior desde que o setor automotivo começou a


divulgar dados no País, em 1957; foram produzidas 1,8 mil unidades


http://www.sodresantoro.com.br


Em cumprimento à legislação vigente e preocupados com a

saúde de todos, os leilões estão sendo realizados somente online,

sem visitação pública, a fim de evitar aglomerações.

E COM DELIVERY DOS ARREMATES, EM CIDADES NUM RAIO DE ATÉ 100 KM DO

PÁTIO ONDE O VEÍCULO ESTIVER, AO CUSTO OBRIGATÓRIO DE R$ 500,00 PARA

VEÍCULOS LEVES E R$ 800,00 PARA UTILITÁRIOS PESADOS E CAMINHÕES.

Para distâncias maiores, consulte-nos sobre a disponibilidade.

DEFLAÇÃO

FONTE: IBGE INFOGRÁFICO/ESTADÃO

IPCA no mês Acumulado em 12 meses
EM PORCENTAGEM EM PORCENTAGEM

JAN
2000

ABR
2020

● Índice oficial de preços do País, o IPCA de abril recuou 0,31%





0

1

2

3

4

-0,
JAN
2000

ABR
2020

0

5

10

15

20

2,

IPCA tem a 2ª maior deflação desde o início do Plano Real


Em abril, por conta da


covid-19, preços caíram


0,31%; em 12 meses, a


taxa ficou em 2,4%, abaixo


da meta do BC de 4,0%


Fabricantes de veículos come-
çam a retomar a produção de
forma gradual, mas ainda há 55
fábricas paradas e 95 mil traba-
lhadores estão em casa, infor-
ma a Anfavea. Algumas voltam
a operar ao longo deste mês e
outras só em junho.
Luiz Carlos Moraes, presiden-
te da Anfavea, afirma que a enti-
dade ainda não tem uma previ-
são de mercado para este ano,
mas a consultoria IHS Markit
trabalha com projeção de 1,8 mi-
lhão de unidades. “Significa
que vamos operar com ociosida-
de de 3 milhões de veículos, o
que é uma situação dramática.”
A IHS também projeta que,
no mundo todo, haverá sobra
de cerca de 20 milhões de veícu-
los neste ano, diante das expec-
tativas de redução da produção
global de 90 milhões para 70 mi-
lhões de veículos.
Com isso, aumenta o risco de
o Brasil não receber novos pro-
jetos. A competição já existia e
o País, segundo Moraes, já per-
dia em competitividade por pro-
blemas estruturais, tributários,
logísticos e por burocracia.
“As montadoras que têm
plantas nos diversos lugares do
mundo, até por questão de so-
brevivência vão olhar as fábri-
cas que são mais competitivas”,
afirma. “Mesmo tendo o dólar
como contraponto, aumenta
sim o risco de não recebermos
projetos de novos veículos
pois, no longo prazo, os países
mais eficientes é que vão ga-
nhar os projetos.”/ C.S.
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