O Estado de São Paulo (2020-05-09)

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A8 Política SÁBADO, 9 DE MAIO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO


Rafael Moraes Moura
Vinícius Valfré / BRASÍLIA


Enquanto a pandemia do no-
vo coronavírus impõe uma cri-
se econômica e causa desem-
prego em todo o País, Estados
têm aberto o cofre para benefí-
cios concedidos a procurado-
res, promotores e juízes. A re-
lação de privilégios inclui “bô-
nus-covid” de até R$ 1 mil para
promotores e procuradores
de Mato Grosso, licença-prê-
mio a juízes do Pará, aumento
salarial de servidores públi-
cos e home office até janeiro
para funcionários do Supre-
mo Tribunal Federal (STF).

Em Mato Grosso, uma ajuda
de custo de até R$ 1 mil foi cria-
da para integrantes do Ministé-
rio Público estadual arcarem
com despesas de saúde. Após a
imprensa revelar o caso, o paga-
mento do “bônus covid” foi sus-
penso e virou alvo de uma ação
ajuizada pelo procurador-geral
da República, Augusto Aras.
“Há aqui aparente tentativa
de frustrar o congelamento de
salários dos servidores públi-
cos municipais, estaduais e fe-
derais e dos membros dos três
Poderes até dezembro de 2021,
havendo informações de que a
previsão de instituição da dita
ajuda de custo estava prevista
para o segundo semestre deste


ano e foi antecipada em razão
da nova legislação, motivação
esta que está alheia ao interesse
público”, observou o conselhei-
ro Sebastião Caixeta, do Conse-
lho Nacional do Ministério Pú-
blico (CNMP), em decisão que
barrou o pagamento do auxílio.
Segundo os últimos dados do
Ministério da Saúde, Mato
Grosso é um dos Estados me-
nos afetados pela doença, com
457 pessoas contaminadas e 14
óbitos, aparecendo em penúlti-
mo lugar no ranking nacional.
Ao entrar com ação no STF,
Aras apontou que o pagamento
do “bônus covid” pelo Ministé-
rio Público estadual agrava a cri-
se fiscal e afeta negativamente
as “receitas estaduais em uma
conjuntura de queda de arreca-
dação tributária, em decorrên-

cia dos impactos econômicos
do surto de epidemia nacional
do novo coronavírus”.
O benefício foi criado pelo
procurador-geral de Justiça do
Estado de Mato Grosso, José
Antônio Borges Pereira. No ca-
so de servidores (efetivos e co-
missionados), o valor do “bô-
nus covid” será de R$ 500. Para
promotores, o benefício é o do-
bro – salta para R$ 1 mil. O im-
pacto da medida aos cofres pú-
blicos pode chegar a R$ 9,65 mi-
lhões por ano.
O procurador-geral da Repú-
blica também aponta que o “bô-
nus covid” gera desigualdade
entre distintos órgãos do MP
brasileiro, “na medida em que
os membros de uns Estados re-
cebem determinadas vanta-
gens e outros não”.

Farra. O aumento de despesas
e a criação de regalias não são
exclusividade das autoridades
do Mato Grosso. Sete de cada
dez servidores em serviço nos
Estados e municípios vão poder
ter reajustes salariais até dezem-
bro de 2021. Enquanto isso, 5,
milhões de trabalhadores da ini-
ciativa privada tiveram redução
salarial e 50 milhões de infor-
mais pediram ajuda de custo de
R$ 600 do governo federal.
As alterações feitas na Câma-
ra dos Deputados e mantidas pe-

lo Senado reduziram o alcance
da medida proposta pelo minis-
tro da Economia, Paulo Gue-
des, como uma “cota de sacrifí-
cio” do funcionalismo público


  • que tem estabilidade no em-
    prego – na crise da pandemia da
    covid-19. O crescimento da fo-
    lha de pessoal é hoje o principal
    fator a corroer o Orçamento
    dos Estados e municípios.
    No Pará, o governador Hel-
    der Barbalho (MDB) sancio-
    nou, nesta quinta-feira, 7, uma
    lei que garante a juízes esta-


duais o direito à licença-prê-
mio. O benefício, concedido a
cada três anos de trabalho inin-
terrupto, tem efeito retroativo
e pode ser pago em dinheiro aos
magistrados. Como o benefício
pode ser pago em valores retroa-
tivos a 2006, magistrados pode-
rão receber até R$ 240 mil, se-
gundo o Sindicato dos Servido-
res do Judiciário do Pará.
Na semana passada, o presi-
dente do STF, ministro Dias
Toffoli, editou resolução autori-
zando o trabalho remoto de ser-

vidores da Corte até janeiro de
2021 por causa da pandemia do
novo coronavírus. O STF alega
que a medida pretende preve-
nir a contaminação de funcioná-
rios do tribunal – que até a sema-
na passada não havia registrado
nenhum caso positivo.
Em nota, o MP de Mato Gros-
so disse que o “bônus covid” foi
criado agora porque o Congres-
so congelou reajustes. O gover-
no do Pará afirmou que “não
compete ao governo direcionar
recursos do Tribunal de Justiça”.

PANDEMIA DO CORONAVÍRUS


l Reação

Justiça e MP criam


‘penduricalhos’ em


meio à pandemia


“Há aparente tentativa de
frustrar o congelamento de
salários dos servidores
públicos municipais,
estaduais e federais e dos
membros dos três Poderes
até dezembro de 2021,
havendo informações de
que a previsão da dita ajuda
de custo foi antecipada.”
Sebastião Caixeta
CONSELHEIRO DO CNMP

Aras quer barrar ‘bônus covid’ de R$ 1 mil no Ministério Público de


MT; no Pará, juízes terão licença-prêmio; País tem casos de privilégios


Bônus. O procurador-geral da República, Augusto Aras, tenta barrar benefício em MT

GABRIELA BILO/ ESTADÃO - 27/4/
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