Valor Setorial - Energia (2020-04)

(Antfer) #1
O mercado livre, que hoje responde por um terço,
passará por mais um teste. Consumidores discutem
evocar cláusulas de força maior em contratos com co-
mercializadoras. A princípio, as discussões devem ser
bilaterais e privadas. A queda do preço no mercado de
curto prazo abre oportunidades para os consumidores,
aponta Barroso, da PSR, mas a abertura do segmento
para chegar ao mercado residencial, como proposto no
Projeto de Lei 232, deve ser adiada. “Abertura do mer-
cado tem impacto sobre as distribuidoras, que já estão
com problemas”, aponta o presidente da PSR.
A abertura também depende da resolução de alguns
pontos, como o reforço da figura do comercializador
varejista, criada em 2015 para tornar mais simples a atu-
ação de empresas de menor porte, que contratam uma
gestora para administrar seus contratos na Câmara de
Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), que propôs
que todo consumidor com demanda abaixo de 1 MW
pudesse ficar sob esse guarda-chuva. “Essa seria uma for-
ma mais estruturada para a migração”, diz o presidente
da CCEE, Rui Altieri. O principal obstáculo é a eventual
inadimplência de um consumidor que esteja sob gestão
de comercializadora, como também a dificuldade de
suspender o fornecimento de energia para a empresa
inadimplente em função da judicialização do tema.

Altieri, da CCEE:
acesso para
demanda
residencial
abaixo de 1 MW

CAROL CARQUEJEIRO / VALOR
A Conta de Desenvolvimento Energético funciona
com múltiplas funções, muito diferentes daquelas de
sua criação em 2002, com o objetivo de incentivar o
ingresso de usinas eólicas, pequenas centrais hidrelé-
tricas, biomassa, gás natural e carvão mineral. Há cinco
anos, ela vem incorporando novos objetivos, como o de
permitir a amortização de operações financeiras vincu-
ladas à indenização por ocasião da reversão de conces-
sões de energia elétrica. Ainda contempla a concessão
de descontos tarifários a diversos usuários do serviço,
como clientes de baixa renda, e modicidade da tarifa
em sistemas elétricos isolados – Conta de Consumo de
Combustíveis (CCC). Seu orçamento neste ano supera
R$ 20 bilhões, pagos por todos os consumidores, apesar
de contemplar subsídios nacionais e regionais.
No início do ano, a expectativa era de que em 2020
se assistiria à primeira migração de um consumidor
industrial para o mercado livre de gás natural. Hoje essa
expectativa se tornou nebulosa. “A questão primordial
é sobreviver a esse momento”, diz Belmonte, da Abivi-
dro. A regulação para a desverticalização, que dependia
de regras para o livre acesso de gasodutos que eram
da Petrobras e sobre a disponibilidade de capacidades
nesses dutos, ainda está sem solução. Previa-se que até
o fim do primeiro trimestre seria feito um leilão com
o gás excedente vindo da Bolívia que não seria usado
pela Petrobras.
O mercado livre, que hoje responde por um terço
da carga do país, vinha direcionando a demanda nos
últimos leilões de contratação de fontes renováveis, com
cerca de 70% da aquisição dos projetos. Os contratos são
bilaterais privados, firmados entre empresas de energia
e grandes consumidores. “Este é um momento, a prin-
cípio, de respeito aos contratos, que possuem cláusulas
de força maior e de arbitragem para o tratamento de
divergências. Neste ambiente esta crise pode ser discuti-
da bilateralmente, com soluções de mercado, deixando
para o governo atuar onde já tem que atuar, no mercado
regulado. As instituições do setor, no entanto, podem
ter papel importante, em um primeiro momento, apu-
rando e monitorando as operações, para evitar abusos
e arbitragens comerciais que sejam justificados erro-
neamente pela pandemia”, diz Barroso. No entanto, ele
observa que o segmento não está imune a problemas. Há
possibilidade de agravamento da crise, com quebras em
cadeia, o que poderá exigir a interferência do governo,
que poderia assumir a forma de garantia de liquidez
para o cumprimento dos compromissos.
Para Santana, ex-diretor da Aneel, os riscos são me-
nores no mercado livre, mas não são desprezíveis. Atual-
mente, 40% da expansão da capacidade instalada de ge-
ração já decorre de contratos firmados no mercado livre,
com usinas que também vendem energia em ambiente
regulado. “Os riscos serão, em grande proporção, corpo-
rativos, mas, como é um setor organizado sob a forma de
rede, é bom que tenha uma coordenação efetiva, para que
os riscos de um não sejam pagos pelo outro”, observa.


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