Valor Econômico (2020-05-09,10 e 11)

(Antfer) #1

JornalValor--- Página 3 da edição"11/05/20201a CADA" ---- Impressa por cgbarbosaàs 10/05/2020@20:21:


Sábado,domingoesegunda-feira, 9, 10 e11demaio de 2020 |Valor|A

Brasil


IMPACTOSDO


CORONAVÍRUS


ContaspúblicasIdeiaéquitaresteano90%dedébitodeR$81bicomfundoeducacionalquesearrastahácincoanos


União quer pagar dívida para aliviar Estados


Luísa Martins
De Brasília

Os efeitos da pandemia no
agravamentoda crisefiscaldos
Estados levaram aUniãoapro-
por um acordo paralhes pagar,
aindano exercíciode 2020,90%
de uma dívidade R$ 81,3 bilhões
cuja quitação se arrastahá mais
de cinco anos.O montante,rela-
tivo aprecatóriosdo Fundo Na-
cional de Desenvolvimento do
Ensino Fundamental(Fundef),
seriarepassado aos governado-
res medianteabertura de crédito
extraordinário no Orçamento,
parainvestimentoimediatono
combateao coronavírus.Em tro-
ca, segundo documentoao qual
oValorteve acesso,ogovernofe-
deralquerdeságio entre30% e
40% e oarquivamento de ações
judiciais.
A conciliação vem sendo costu-
radanoâmbitodoSupremoTribu-
nal Federal (STF), a quemos gover-
nadores recorreram paratentar

evitar o colapsoeconômicodiante
da propagaçãoda covid-19.Pelo
“Plano Nacional de Negociação:
Fundef”, a Advocacia-Geral da
União(AGU) sugere diminuir de
100%para 10% ovalor do fundo
destinado à educação,para que a
maiorparte sejaaplicada pelos Es-
tados nas áreas de saúdeecidada-
nia —eainda abatida de suas dívi-
dascomogovernofederal.
Semsimpatia do Ministério
PúblicoFederal(MPF),que teme
perdasirreparáveis para aeduca-
ção básica,apropostaestá sendo
analisada pelos procuradores-
geraisde noveEstados:Alagoas,
Amazonas,Bahia,Maranhão, Pa-
rá, Paraíba, Pernambuco, Rio
Grandedo Nortee Sergipe. Com
umadívidade R$ 247 bilhões
com a União, São Paulo não po-
deria beneficiar-se do acordo,
pois já recebeua totalidade do
que lhe era devidoatítulode
Fundef(R$1,2milhão).
Consultados,os governadores,
emboradispostos a encerraras
demandasjudiciaispor meiode
um encontrode contascoma
União, demonstraram-se decidi-
dos a negociarumpercentual
menorde deságioe um indica-

dor de correçãomonetáriamais
vantajoso. As partes devemse
reunirvirtualmente até o fim
destasemanapara uma novaro-
dadade debates,mediadospelo
ministroAlexandredeMoraes.
OFundefvigorounopaísentre
1996 e 2006,quandofoi substi-
tuídopeloFundo de Manuten-
ção e Desenvolvimentoda Edu-
caçãoBásica(Fundeb).Em 2015,
a Justiçaentendeuque, devidoa
umerronafórmuladecálculo
dos repasses,a UniãopagouR$
90 bilhõesa menosdo que deve-
ria. Condenadaa fazera comple-

mentação, executouaté hoje me-
nos de 10% da dívida:R$ 8,7 bi-
lhões,de acordocom monitora-
mentodo Tribunalde Contasda
União(TCU).
Nos termossugeridospela Ad-
vocacia-Geral da União(AGU),as
verbaspara aárea da saúdeeci-
dadaniachegariamaos cofreses-
taduaisjá nesteano,mas as da
educação ficariam para 2022,
comapresentaçãodeprecatórios
nestesegundosemestre.O res-
tanteseriaabatidoda dívidados
Estadoscom a União. Ovalor que
sobrar,sesobrar,engordariaafa-

tiadestinadaàeducação.
AAGUoferecetrês modelosde
acordo:quantomaioro deságio,
maiora fatia do pagamentoaser
recebidade imediato.Por exem-
plo, se oEstadoconcordarem
desvalorizaroprecatórioem40%
(percentual máximo), receberá
60% parainvestirno enfrenta-
mentoao vírusaindaeste ano,
10% paraa educaçãoem 2022e
30%paraabaterdesuadívida.
Alémde renunciar às açõesju-
diciaisenvolvendodívidascom a
União, o governador que aderir
ao acordodeveráapresentarum
planode aplicaçãodos recursos
tantona área da saúde(compra
de equipamentos,por exemplo)
quantona mitigaçãodos efeitos
socioeconômicoscausadospelo
avançodadoença.Omesmopara
os investimentosem ensinobási-
co. Afiscalizaçãocaberiaaos ór-
gãosde controlede cadaEstado.
Emrelaçãoaoabatimentodasdí-
vidas,a própriaUniãodeverá ci-
tarquaisseriamcompensadas.
OValorprocurouas assesso-
rias dos novegovernos estaduais
que,juntoà AGU,negociamo
acordono Supremo, mas apenas
quatroresponderam: Bahia,Ma-

ranhão, PernambucoeRio Gran-
de do Norte.Todos se dizemre-
ceptivosao acordo, desdeque o
deságioseja reduzidoequehaja
garantiadequeoIPCAvaibalizar
oscálculosdosvaloresdevidos.A
AGUpreferiunão se manifestar,
paranãoprejudicarastratativas.
As negociaçõesaindapoderão
ser ampliadasparaoutrosEsta-
dos.Umadashipóteseséqueos
entes federativos que não te-
nhamdívidascom a Uniãotam-
bém possamreceberos comple-
mentosdo Fundefparaaplicá-
losnocombateàpandemia.Adi-
ferençaestarianos percentuais,
que ficariam divididos apenas
entre saúde,cidadaniaeeduca-
ção,tambémmediantedeságio.
Já para unidadesda federação
comoAcre,DistritoFederal,Espí-
rito Santo, MatoGrosso, Mato
Grossodo Sul, Paraná,Rondônia,
SantaCatarina,São Paulo eTo-
cantins,que não têm créditosde
Fundef,oacordodeveráser pro-
posto de outra forma —por
exemplo,adiandoaretomadado
pagamento da dívida com a
Uniãoparaque averbaequiva-
lente seja utilizada para lidar
comacrisesanitária.

Fonte:PlanoNacionaldeNegociação- Fundef(AGU)

ModeloA ModeloBModeloC

0

10

20

30

40

50

60

70 Saúdee Cidadania Educação Compensaçãode dívida

Deságio

40

10

50 50

10

40

60

10

30

Opções deacordo
Propostada AGUpararepassesa títulode Fundef,em %

30 35 40

Guedes querfazerda Economia


o modelo dereforma dagestão


Lu Aiko Otta
De Brasília

No iníciode 2019,quandore-
ceberamseu primeiro contra-
chequedo ano,os funcionários
do recém-criado Ministério da
Economiajá podiamler que tra-
balhavam paraanova pasta,re-
sultadoda fusãode cincominis-
térios: Fazenda, Planejamento,
Trabalhoe Emprego, Previdência
e Indústria, Comércio Exterior e
Serviços. Pouco maisde um ano
depois, aideia éque administra-
ção da pastaseja um modelopa-
raosdemaisministérios.
“Era importante agir rápido”,
disseasecretáriadeGestãoEstra-
tégica,Danielle Calazans. “Se as
pessoas começassematrabalhar
cadaumaemseumundinho,não
aconteceria afusãoquepreten-
díamos.” Esse era oprincipal
pontodareformapretendidape-
lo ministro Paulo Guedes:não fa-
zer um ajuntamento de pastas,
como tradicionalmente ocorre
na Esplanada dos Ministérios,
massimumafusãodeestruturas,
culturaserotinasdetrabalho.
Apontada por observadores
experientescomoinadministrá-
vel, apasta chefiada pelo minis-
tro Paulo Guedestem pertode
100 mil funcionários, entreati-
vos e aposentados. “É pratica-
menteuma Ambev”, compara
Danielle.A folhasalarialconso-
me nadamenosque R$ 2,5 bi-
lhõesaomês.
Do pontode vista físico,apas-
ta tambémé gigante. Está pre-

sente,literalmente, do Oiapoque
aoChuí,poisospostosdaReceita
Federalestãosobsuaadministra-
ção.Ete muma rede com grande
capilaridadeno interior,com os
postosdoINSSedoMinistériodo
Trabalho.Nototal,são 600 pré-
diossobadministração.Háainda
23 unidades vinculadas,comoo
BNDES,aCaixa,oInmetro.
Tal comono mundocorporati-
vo,afusãodecincoministériosim-
pôs eliminarredundâncias. Nesse
caso,não há demissões porque os
servidores públicossão estáveis.
Foi possível, porém,cortarperto
de 40%dos cargos pelos quais
erampagosadicionais.
As áreasadministrativasfo-
ram unificadasem uma só secre-
taria,a de Gestão Estratégica.Ne-
la, estãojuntossetoresque nor-
malmente operam separados,
comoas áreasde planejamento,
orçamento, recursos humanos,
logística, contabilidadeetecno-
logiada informação (TI). “E opu-
lo do gato é umagestãoestraté-
gica alinhada,voltadaà eficiên-
cia”,descreveasecretária.
Aideiaéqueadministraçãoda
pastada Economiaseja um mo-
delo para os demaisministérios,
disseosecretário-executivo da
pasta,MarceloGuaranys.Segun-
do Danielle,umaárea de gestão
estratégica nos mesmosmoldes
foi estruturadano Ministériodo
DesenvolvimentoRegional. Isso
ocorreu coma ida de Rogério
Marinhoparaaquelapasta.Mari-
nho foi secretárioespecial de
PrevidênciaeTrabalho,noMinis-

MarceloGuaranys: ideiaé que administraçãoda pasta da Economiasejaum modelopara os demaisministérios

DIVULGAÇÃO

Desemprego pode ser o maior dos


últimos 25 anos, preveem analistas


BrunoVillasBôas
Do Rio

A forçade trabalho do país em
buscade emprego deverácrescer
nesteanoparaonívelmaiseleva-
do em, pelo menos,25 anospor
causa da crise,mostramcálculos
paralelos feitos pelo Instituto
Brasileirode Economia da Fun-
daçãoGetulioVargas (Ibre/FGV)
epelaLCAConsultores.
Para chegara essa conclusão,o
Ibre/FGVeaLCA costurarame
trataram diferentes pesquisasdo
IBGEpara criaruma série históri-
camaislongado mercadodetra-
balho,já que a série da atualpes-
quisa,a PnadContínua,retroage
apenasaté2012.
Os levantamentos mostram
que nem na recessãoeconômica
que duroude 2014a2016, nem
nas sucessivas crisesdos anos
1990, quandopaís preciso recor-
rer ao Fundo MonetárioInterna-

cional (FMI),aperda de vagaste-
rá sido tão intensaquantoda re-
cessãoqueseanuncia.
SegundoDaniel Duque,pesqui-
sador do Ibre/FGV, a taxa de de-
semprego deverá crescer para
18,7%namédiaanualde2020,aci-
ma da médiade 11,9% do ano pas-
sado.Seconfirmadaaprojeção, se-
rá amaior taxa desde 1992, início
da série histórica elaborada pelo
instituto. Diferentementede crises
anteriores,destavez osetor infor-
mal não vai funcionar comoum
“colchão” paraosdemitidos.
“Quemjá perdeuo emprego
nessemomentofoi umagrande
parcela dos informais.Muitos
destesmigrarampara forada
forçade trabalho.Noentanto,
muitas empresas formais tam-
bém estãodemitindo, eaocupa-
ção informalnão é maisuma
possibilidadeparaestesque fo-
ramdemitidos”, explicaDuque.
Na série reconstruída pelo

Ibre/FGV, os piores momentos do
mercadode trabalhoforamre-
gistrados em 1999,ano em que o
Brasildeixouorealflutuar,aban-
donandooregimedecâmbioad-
ministrado.Ataxade desempre-
go foi de 11% na médiadaquele
ano.Elaatingirianovamenteesse
percentual em 2003, primeiro
anodogovernoLula.
Adeterioração do mercadode
trabalhofoi maisintensa, no en-
tanto, na recessão recentedo
país, do segundo trimestre de
2014 até o quartotrimestrede
2016.No mercado de trabalho, o
pico do desempregogeradopor
essa crisefoi em 2018,com taxa
médiaanualde12,7%.
NasprojeçõesdaLCA,ataxade
desemprego deverá subir de
12,2%noprimeirotrimestrepara
15,4%no quartotrimestre,sem
ajustesazonal.Essataxaserá a
maiorregistradadesde1996,iní-
cio da sérieconstruídapela con-

sultoria, superandoo atualre-
cordedo primeirotrimestre de
2017 (13,7%).No pior cenárioda
consultoria, a taxachegaria a
25%aofimdesteano.
CosmoDonato,economistada
LCA Consultorese autordos cál-
culos,prevêque 2,6 milhõesde
pessoasdevemperderseus em-
pregosaté o fim desteano,pelo
cenáriobásico.
Nos seus cálculos,o mercado
de trabalhoviveuseu primeiro
bommomentonahistóriarecen-
telogoapósaimplementaçãodo
PlanoReal,quando ataxa de de-
sempregooscilou de 6,6% a 6,7%
aolongode1995.
Osegundomelhormomento
da taxa de desempregofoi regis-
tradono primeiromandatodo
governo Dilma Rousseff, entre
2013 e2014.Ataxadedesempre-
go chegoua registrar6,2%no
quartotrimestrede 2014,amais
baixaaolongodetodasérie.

tériodaEconomia.
Desdeo ano passado, Danielle
lideraum trabalhode unificação
erevisãodecontratosdospresta-
doresde serviçoao Ministérioda
Economia.Em janeirode 2019,
eram2.200.Aintenção é chegar
ao fim de 2020com250,com
cortedeR$55milhõesaoano.
Um primeiro alvo foi a área de
TI, que éoitem mais caro do or-
çamentodoMinistériodaEcono-
mia.A pastaé responsável por
sistemasutilizados por todoo
governofederal,comoo Sistema
Interligadode AdministraçãoFi-
nanceira(Siafi),que registrato-
dos os gastosdo governo, ou o
SistemaIntegradode Adminis-
traçãode Pessoal(Siape).A esta-
tal Serprocuidaa base de dados
da ReceitaFederal,responsável
por todaarrecadaçãode impos-
tos e contribuições,e do Portal
Únicodo ComércioExterior, que
registraas exportaçõeseimpor-
taçõesdopaís.
Eram 14 diferentescontratos de
TI. Esses foram revistos, fundidos,
renegociados.Osaldofoiumaeco-
nomiade R$ 350 milhões. Outros
R$ 4,2milhões ao ano foram eco-
nomizados coma racionalização
dos contratosde serviços de im-
pressão emais R$ 9,8 milhões ao
anoemredesecircuitos.
O enxugamentochegoutam-
bém às instalações físicas. Na capi-
tal paulista, cincounidades do an-
tigo Ministério do Trabalhoforam
agrupadas num imóvelna Estação
daLuz.Outroscincoprédiosforam
entreguesà Secretaria de Patrimô-

nio da União (SPU). O mesmofoi
feito em Fortaleza no Espírito San-
to.Além de economizar R$ 3,6 mi-
lhões anuaisem itens comoalu-
guel,manutenção, água, luz, tele-
fone, serviços de limpeza, a junção
facilitou avida dos usuários dos
serviçosdoministério.
As economias no dia adia do
ministériopermitiramliberarre-
cursospara garantirofunciona-
mentodasáreasfinalísticas,mes-
mo numcenáriode contingen-

ciamento orçamentário. No ano
passado,comoorçamentorestri-
to, foi editadauma norma que fi-
cou conhecidacomo “portaria
do café”, que cortouesse item jo-
cosamenteclassificadocomoes-
sencialpara o funcionamento da
máquina pública. Era comum
ouvirautoridades se queixando
da falta do café, ou do açúcar, ou
deambos.Oobjetivoeragarantir
o funcionamentode operações
comofiscalizaçõese atendimen-

toaopúblico.
As demandas internasdo Mi-
nistério da Economia estão agora
todascentralizadasemumportal
chamado Solicite. Atende desde
um pedido de reparode impres-
sora de uma unidadeno interior
da Bahia até ocontrato firmado
comaCaixaparaopagamentodo
auxílio emergencial dos traba-
lhadores informais.Oportal dá
transparência do andamento da
demanda,explicouDanielle.

DanielDuque:“ocupaçãoinformalnão é maisopçãopara os que foram demitidos”

LEO PINHEIRO/VALOR

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