O Estado de São Paulo (2020-05-12)

(Antfer) #1

%HermesFileInfo:A-6:20200512:
A6 Política TERÇA-FEIRA, 12 DE MAIO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO


A Polícia Federal deflagrou on-
tem a Operação Expurgo para
investigar irregularidades
em contrato de R$ 1,
milhão para presta-
ção de serviços de
limpeza, desinfec-
ção e assepsia no
combate ao corona-
vírus em Santana,
no Amapá. Segundo
a PF, há indícios de
direcionamento na licita-
ção. Mandados de busca e
apreensão foram cumpridos na
Secretaria Municipal de Saúde.
A pasta não se manifestou.

O Ministério Público Federal
lançou vídeo em que lista “irre-
gularidades e graves pro-
blemas” que podem
surgir no País caso a
Medida Provisória
910, a “MP da Gri-
lagem”, seja apro-
vada pelo Congres-
so. Entidades civis,
ONGs e a própria
Procuradoria já afir-
maram que a medida, edi-
tada pelo governo Bolsonaro,
beneficia grileiros na Amazô-
nia que ocupam terras públi-
cas de maneira ilegal.

Lorenna Rodrigues
Rafael Moraes Moura / BRASÍLIA


O Estadão apresentou reclama-
ção ao Supremo Tribunal Fede-
ral (STF) pedindo a suspensão
da decisão do presidente do Su-
perior Tribunal de Justiça
(STJ), João Otávio de Noronha,
que desobrigou o presidente
Jair Bolsonaro de apresentar
exames feitos para detectar o
coronavírus. Após o jornal ter
obtido na Justiça decisões ga-
rantindo o acesso aos laudos,
Noronha atendeu, na sexta-fei-
ra, ao Palácio do Planalto e aca-
tou recurso apresentado pela
Advocacia-Geral da União, o
que livrou Bolsonaro de divul-


gar os exames.
O Estadão argumenta que a
decisão de Noronha “interrom-
peu a livre circulação de ideias e
versões dos fatos, bloqueou a
fiscalização dos atos dos agen-
tes públicos pela imprensa e as-
fixiou a liberdade informativa”
do jornal. A reclamação ressalta
que três decisões diferentes fo-
ram favoráveis ao pleito do jor-
nal, assim como parecer do Mi-
nistério Público Federal. “To-
dos eles aquiesceram ser urgen-
te e pertinente ao interesse pú-
blico o acesso à documentação
escondida pela Presidência.”
O jornal recorrerá também
ao próprio STJ contra a decisão
monocrática de Noronha. O re-
curso será apreciado por um co-
legiado de ministros daquele tri-
bunal. “A decisão do ministro
João Otávio de Noronha ofen-
de escandalosamente a decisão
do STF na ação direta de incons-
titucionalidade que tirou do
mundo jurídico a Lei de Impren-

sa, em 2009. Nessa decisão, hou-
ve infinitas alusões ao alcance
da liberdade de imprensa e de
expressão, todas descumpridas
pela decisão do presidente do
STJ”, afirmou o advogado do Es-
tadão, Afranio Affonso Ferrei-
ra Neto.
A Justiça Federal de São Pau-
lo e, posteriormente, o Tribu-
nal Regional Federal da 3.ª Re-
gião (TRF-3) garantiram ao Es-
tadão o direito de ter acesso
aos resultados, por conta do in-
teresse público sobre a saúde
do presidente da República. A
decisão de Noronha, no entan-
to, derrubou o entendimento
da primeira e da segunda instân-
cias. “Agente público ou não, a
todo e qualquer indivíduo ga-
rante-se a proteção a sua intimi-
dade e privacidade, direitos ci-
vis sem os quais não haveria es-
trutura mínima sobre a qual se
fundar o Estado Democrático
de Direito”, escreveu Noronha.
Na reclamação apresentada

ao STF, o Estadão lembra que
Noronha antecipou sua posi-
ção sobre o tema em entrevista
ao site jurídico JOTA, na quin-
ta-feira passada e, no dia seguin-
te, a AGU apresentou recurso
ao próprio ministro, o que con-
traria a Lei Orgânica da Magis-
tratura Nacional.
Na entrevista, o presidente
do STJ afirmou que “não é repu-
blicano” exigir que os documen-
tos de Bolsonaro sejam torna-
dos públicos. “Não é porque o

cidadão se elege presidente ou
e ministro que não tem direito a
um mínimo de privacidade. A
gente não perde a qualidade de
ser humano por exercer um car-
go de relevância na República”,
argumentou.
O Estadão entrou com ação
na Justiça depois de questionar
sucessivas vezes o Palácio do
Planalto e o próprio presidente
sobre a divulgação do resultado
do exame. Na ação, o jornal
aponta “cerceamento à popula-
ção do acesso à informação de
interesse público”, que culmi-
na na “censura à plena liberda-
de de informação jornalística”.
A Presidência da República se
recusou a fornecer os dados via
Lei de Acesso à Informação, ar-
gumentando que elas “dizem
respeito à intimidade, vida pri-
vada, honra e imagem das pes-
soas, protegidas com restrição
de acesso”.
Em parecer encaminhado na
quinta-feira passada ao TRF-3,

o Ministério Público Federal
(MPF) defendeu o direito do Es-
tadão de ter acesso os “laudos
de todos os exames” realizados
por Bolsonaro, já que a informa-
ção é de interesse público.
“Embora existam aspectos
da vida da pessoa que exerce o
cargo de Presidente da Repúbli-
ca que podem ficar fora do es-
crutínio da sociedade, tradicio-
nalmente a condição médica
dos presidentes é de interesse
geral uma vez que pode impac-
tar o exercício de suas relevan-
tes funções públicas”, escreveu
a procuradora regional da Repú-
blica Geisa de Assis Rodrigues.
Bolsonaro disse que o resulta-
do deu negativo, mas se recusa
a divulgar os papéis. Em entre-
vista à Rádio Guaíba, no fim de
abril, ele admitiu que “talvez”
tenha sido contaminado pelo
novo coronavírus. O presiden-
te se submeteu a pelo menos
dois testes para saber se foi con-
taminado ou não pela covid-


  • em 12 e 17 de março – e divul-
    gou que os resultados foram ne-
    gativos, mas se recusa a apresen-
    tar os exames.


Thiago Faria
Patrik Camporez / BRASÍLIA

Os gastos sigilosos da Presi-
dência da República com car-
tão corporativo, usado para
bancar despesas do presiden-
te Jair Bolsonaro, aumenta-
ram nos primeiros quatro me-
ses do ano, mesmo quando
descontado o valor da opera-
ção que resgatou brasileiros
em Wuhan, na China. Após o
Estadão revelar que a fatura
de janeiro a abril havia dobra-
do, o presidente justificou a
alta com os custos da viagem,
que utilizou aeronaves da
Força Aérea Brasileira (FAB).
Segundo o presidente afir-
mou ontem, foram utilizados
R$ 739.598, via cartão corporati-
vo, com os três voos enviados
ao país asiático em fevereiro
deste ano. Como mostrou a re-
portagem no domingo, as des-
pesas sigilosas vinculadas a Bol-
sonaro foram de R$ 3,76 mi-
lhões neste ano, segundo infor-
mações do Portal da Transpa-
rência. O valor representa um
aumento de 98% em relação à
média dos últimos cinco anos
no mesmo período.
“3 aviões da @fab_oficial, vin-
culados à Presidência, foram à
China buscar brasileiros em
Wuhan. Na operação foram gas-
tos R$739.598,00 com cartão
corporativo. Ao contrário do no-
ticiado, retirando despesas ex-
traordinárias, nossos gastos se-
guem abaixo da média de anos

anteriores”, postou o presiden-
te no Twitter.
Diferentemente do que diz
Bolsonaro, ao abater o valor ci-
tado por ele com os voos para a
China, os R$ 3 milhões relacio-
nados a outros gastos sigilos ain-
da assim representam uma alta
de 59% em relação à média do
que gastaram Dilma Rousseff e
Michel Temer, seus antecesso-
res no cargo.
Desde domingo, quando a re-
portagem foi publicada, o presi-
dente tem citado os voos para a
China como justificativa para o
aumento dos gastos sigilosos
com cartão corporativo, mas,
até então, ele não havia revela-
do o valor.
“O que eu posso falar da Chi-
na é que ontem (domingo) a im-
prensa, como sempre, dá licen-
ça aí, a imprensa como sempre
criticando o cartão corporati-
vo”, afirmou o presidente on-
tem pela manhã, em frente ao
Palácio da Alvorada, ao respon-
der uma mulher que o questio-
nou se o país asiático escondia
dados sobre o coronavírus.
“Parte da operação da China,
três aviões da FAB, por ser
avião militar, foi financiada
com cartão corporativo meu.
Apareceu eu usando o cartão
para fazer festa. Falta de cará-
ter e de responsabilidade des-
sa imprensa aí.”
Os gastos com a operação
que trouxe de volta ao País 34
brasileiros até então estavam
em sigilo. A hashtag “MostraA-

FaturaBolsonaro” ficou na lista
de assuntos mais comentados
do Twitter ontem.
Parlamentares de diferentes
partidos – desde Kim Kataguiri
(DEM-SP) a Jandira Feghali
(PCdoB-RJ) – cobraram de Bol-
sonaro que revele como gastou
o dinheiro público via cartão

corporativo. Vinicius Poit (No-
vo-SP) apresentou um requeri-
mento de informações para a
Presidência da República.

Viagens. Em resposta à repor-
tagem na semana passada, o Pa-
lácio do Planalto deu uma ver-
são diferente do que afirmou

Bolsonaro como principal moti-
vo do aumento.
Sem dar detalhes, a assesso-
ria de imprensa da Secretaria-
Geral da Presidência – órgão res-
ponsável pela gestão dos car-
tões corporativos – informou
que a maior parte das despesas
neste ano está relacionada às
viagens presidenciais em terri-
tório nacional e viagens interna-
cionais. Neste ano, o presiden-
te esteve na Índia em janeiro,
participou da posse do presi-
dente do Uruguai, no início de
março e, no mesmo mês, viajou
com uma comitiva de 31 pes-
soas aos Estados Unidos.
O cálculo que aponta o gasto
de R$ 3,76 milhões leva em con-
ta apenas os valores vinculados
à Secretaria Especial de Admi-
nistração, que é responsável
por despesas do presidente e de
sua família, das residências ofi-
ciais e demais gastos corriquei-
ros – material de escritório do
gabinete presidencial, por
exemplo. Quando considera-
dos outros órgãos vinculados à
Presidência da República, co-
mo o Gabinete de Segurança
Institucional (GSI) e a Agência
Brasileira de Inteligência (A-
bin), o valor salta para R$ 7,
milhões neste início de ano – au-
mento de 91% em relação à mé-
dia do mesmo período.
Na mesma resposta dada na

semana passada, a Secretaria-
Geral chegou a citar o aumento
a despesas com a operação na
China, mas sem detalhar qual
órgão foi o responsável pelos
gastos. Questionado novamen-
te ontem, o Palácio do Planalto
não se manifestou até a conclu-
são desta edição.

Sigilo. Em dezembro do ano
passado, o Estadão revelou que
o governo passou a ignorar uma
decisão do Supremo Tribunal
Federal (STF) e se recusa a expli-
car como tem usado o dinheiro
público via cartões corporati-
vos. A Presidência afirma que a
abertura dos dados e notas fis-
cais poderiam colocar em risco
a segurança do presidente.
Antes de ser eleito, Bolsona-
ro foi um crítico ferrenho dos
gastos com cartões corporati-
vos e, principalmente, do sigilo
dos extratos. Em 2008, em dis-
curso na Câmara, ainda como
parlamentar (na época filiado
ao PP) desafiou o então presi-
dente Luiz Inácio Lula da Silva a
“abrir os gastos” com o cartão.
Em 2018, durante o governo
de transição, o então coordena-
dor do grupo e atual ministro da
Cidadania, Onyx Lorenzoni,
chegou a afirmar que a gestão
Bolsonaro acabaria com o meio
de pagamento. A ideia, contu-
do, nunca foi levada adiante.

O engenheiro Antônio Carlos
Bronzeri, integrante da Frente
Brasileira Conservadora, e Ju-
randir Pereira Alencar foram
denunciados pelo Ministério
Público pelos crimes de amea-
ça, injúria e difamação cometi-
dos durante ato na frente da
casa do ministro Alexandre de
Moraes, do Supremo Tribunal
Federal, no dia 2. Bronzeri foi
preso durante a manifestação
por ameaçar familiares do mi-
nistro. “Os denunciados inju-
riaram e difamaram a vítima
chamando-a de ‘advogado do

PCC’, ‘ladrão’, ‘corrupto’, ‘co-
varde’, ‘canalha’, ‘safado’, ‘vea-
do’, ‘maricas’, dentre outras
ofensas”, disse a promotora
Alexandra Milaré Toledo San-
tos. As defesas dos acusados
não foram localizadas.

AMAZÔNIA

l ‘Lei de Imprensa’

‘Estadão’ vai ao STF para ter acesso a exame de presidente


Alvorada. Bolsonaro usa máscara na portaria do palácio; equipamento passou a ser obrigatório no DF, sob pena de multa

GOVERNO EM RISCO


R$ 1,8 mi
É O VALOR DO
CONTRATO SOB
SUSPEITA ALVO
DA PF NO AMAPÁ

Grupo de mulheres
pede direito de resposta
Um grupo de seis mulheres
reconhecidas como vítimas ou
familiares de vítimas do regi-
me militar pela Comissão Na-
cional da Verdade, em 2014,
apresentou ação por direito de
resposta à Secretaria Especial
de Comunicação da Presidên-
cia (Secom), que classificou
como “herói do Brasil” o tenen-
te-coronel da reserva Sebas-
tião Curió Rodrigues de Mou-
ra, de 85 anos. O militar atuou
no combate à Guerrilha do Ara-
guaia, no Pará, nos anos 1970, e
foi recebido no Planalto pelo
presidente Jair Bolsonaro.

HOMENAGEM A CURIÓ

O Twitter anunciou ontem
que está ampliando sua políti-
ca para conter a disseminação
de conteúdo falso em relação à
pandemia da covid-19. Segun-
do texto publicado no blog da
rede social, tuítes “que conte-
nham informações potencial-
mente prejudiciais ou engano-
sas relacionadas à covid-19”
serão exibidos com aviso de
“mídia sintética ou manipula-
da”. Os avisos também farão o
redirecionamento dos usuá-
rios para conteúdos verifica-
dos e confiáveis. O alcance dos
tuítes será limitado, informou.

Twitter amplia política
contra desinformação

COVID-
Operação apura contrato
suspeito no Amapá

MANIFESTAÇÃO COMBATE À PANDEMIA


Ministério Público de São Paulo denuncia


dois por ameaça e injúria contra Moraes


● Despesas da Secretaria de Administração, responsável por
gastos vinculados diretamente ao presidente

GASTOS SIGILOSOS

Gasto sigiloso com cartão corporativo*
EM MILHÕES DE REAIS

De janeiro a abril

1,

3,0**

2020 2015 a 2019

AUMENTO EM RELAÇÃO A ANOS ANTERIORES

1,

2016

1,

2017

1,

2018

2,

2019

*VALORES CORRIGIDOS PELA INFLAÇÃO NO PERÍODO (IPCA); ** VALOR DOS GASTOS DO CARTÃO
CORPORATIVO, DESCONTANDO OS R$ 739,6 MIL DOS VOOS À CHINA
FONTE: PORTAL DA TRANSPARÊNCIA INFOGRÁFICO/ESTADÃO

Média
5 anos

2,

2015

31% 68% 101% 56% 53% 59%

Procuradoria lança vídeo
contra ‘MP da Grilagem’

“A decisão do ministro João
Otávio de Noronha ofende
escandalosamente a decisão
do STF na ação direta de
inconstitucionalidade
que tirou do mundo
jurídico a Lei de
Imprensa, em 2009.”
Afranio Affonso Ferreira Neto
ADVOGADO DO ‘ESTADÃO’

Jornal havia garantido na


Justiça a divulgação dos


testes para covid-19, mas


STJ livrou Bolsonaro de


revelar os resultados


DIDA SAMPAIO/ESTADÃO

Mesmo sem


China, gasto


de Bolsonaro


aumenta


Presidente justificou alta nas despesas com


cartão corporativo com viagem a Wuhan

Free download pdf