DOSSIÊ SUPER 25
Foi apenas em 1953, mais de
meio século após a publicação de
Estudos sobre a Histeria, que o
mundo veio a conhecer a verda-
deira identidade de Anna O. Seu
nome era Bertha Pappenheim
(1859-1936), uma jovem amiga
de Martha Bernays – a esposa
de Freud. A revelação foi feita no
livro A Vida e Obra de Sigmund
Freud, por seu biógrafo Ernest
Jones, e desagradou muito os
herdeiros de Bertha. Até porque
ninguém que a conhecesse mais
velha poderia ligar a mulher de
carne e osso à personagem ator-
mentada que deu início à história
da psicanálise.
Bertha Pappenheim foi uma
figura importante do feminismo
judeu alemão, fundando uma or-
ganização para promover a eman-
cipação feminina por meio do
trabalho. Em 1922, escreveu: “Se
houver justiça no mundo de ama-
nhã, esta será: as mulheres farão
as leis, e os homens trarão os fi-
lhos ao mundo”.
Ela se manifestou contra a par-
tida dos judeus da Alemanha,
desafiando Hitler, e também foi
ativista de causas humanitárias,
viajando pelo mundo para estudar
e combater o tráfico de escravas
brancas. Como se não bastasse,
foi ainda diretora de um orfanato
e escreveu peças de teatro para
crianças. Uma supermulher. Nada
mais distante daquela imagem que
vimos no começo deste capítulo,
da garota fechada em si mesma,
cujo corpo sofria porque a mente
não tinha canais de expressão.
Aquela personagem, uma cons-
trução do texto de Josef Breuer,
talvez correspondesse mesmo à
Bertha mais jovem, antes de pas-
sar pelo tratamento catártico. Mas
será? Bertha Pappenheim nunca
quis falar do seu tratamento com
Breuer e proibiu sua família de
fornecer qualquer informação
sobre esse período da sua vida.
Passou a ser uma mulher hostil à
psicanálise e aos psicanalistas.
Fato incontestável mesmo é que
a epidemia de histerias no fim do
século 19 – o suposto problema
de Bertha/Anna – foi tão fun-
damental para o surgimento e a
expansão da psicanálise que a
própria definição da doença se
transformou, tornando-se um
conceito totalmente associado
às teorias de Freud. O diagnós-
tico genérico de histeria frag-
mentou-se em diversas outras
doenças, mais específicas de
acordo com cada manifestação
- e geralmente mais associadas à
psicose que à neurose.
F
A VERDADEIRA
ANNA O.
A paciente que
inspirou Freud
se tornou líder
feminista e
desafiou Hitler.
Só nunca mais
quis ouvir falar
de psicanálise.
Nunca ficou claro que Bertha
Pappenheim realmente te-
nha sido curada pela terapia
de Breuer. O fato é que, mais
tarde, ela renegou seu pas-
sado e proibiu os familiares
de mencionar o período em
que teve ataques.
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