Dossiê Superinteressante - Edição 415-A (2020-05)

(Antfer) #1
DOSSIÊ SUPER 55

É apenas no
território do
inconsciente
que o id e
suas loucuras
operam.
Já ego e
superego
têm partes
expostas na
consciência.
Assim, a
segunda
tópica
dialoga com
a primeira.

ego


Enquanto o id é guiado pelo princípio do pra-
zer, o ego se baseia no princípio da realidade. É
uma espécie de mediador entre a impulsividade
do id e as condições externas, fazendo a interação
entre a sua personalidade e as leis do seu país,
a cultura do seu tempo, as regras de etiqueta e
as normas do bom convívio. Dependendo do
livro de Freud que você encontrar, o ego pode
ser traduzido por “Eu”, o que dá bem a ideia de
que essa instância, adequando as suas vontades
ao mundo em volta, acaba sendo quem você é de
fato aos olhos das outras pessoas. E essa parte
da nossa personalidade não existiria sem o
id – é dele que o ego tira suas forças.
Nessa condução do cavalo selvagem que
existe dentro de cada um, o ego pesa os custos
e benefícios dos desejos do id antes de liberar
este ou aquele comportamento. E ele também
possui um agudo senso de timing. Em diver-
sas situações, vai acabar permitindo a gratifi-
cação exigida pelo id, mas só na hora certa. Por
exemplo: um rapaz está no meio do público
de um show de rock, dançando de pé no setor
pista, e dá vontade de fazer xixi. Só que o ba-
nheiro mais próximo fica a 10 minutos de
muito empurrão em meio a uma massa de fãs
do Guns N’Roses. Isso gera uma tensão que o
id vai querer eliminar na hora – “abre a bra-
guilha e manda brasa aqui mesmo”. É então
que o princípio da realidade faz o ego disparar
um pensamento mais senhor da razão: “calma,

se fizer isso você vai revoltar toda essa galera,
além de molhar a própria calça; o show já es-
tá no bis, a vontade ainda é administrável, dá
para esperar numa boa o Axl parar de cantar,
aí você vai ao banheiro sossegado”.
Em outras situações, o ego vai ter de negar
mesmo a gratificação. Naquele mesmo show,
o rapaz vê uma garota bonita cantarolando
“Sweet Child O’ Mine” com a camiseta molha-
da de suor e de chuva. O id logo lhe dá a ideia
pouco inteligente de ir correndo se atracar
àquele corpo que o pano mal consegue escon-
der. O ego então rebate com o mundo real:
levando em consideração que a satisfação des-
se desejo renderia a) um grito de “tarado” por
parte da moça, b) a possibilidade de um lin-
chamento, c) provavelmente prisão... Que tal
só puxar conversa com ela, respeitosamente?
Também vale dizer que, antes da elaboração
da segunda tópica, o ego era confundido com a
própria consciência humana. E contribui para
essa identificação a ideia de ele lidar com as
percepções conscientes que adquirimos pelos
sentidos – e que vão nos dar o contexto do mun-
do externo. “A percepção tem, para o ego, o
papel que no id cabe ao impulso”, afirma Freud.
Apesar dessa identificação com a consciên-
cia, a batalha interna para refrear os estímu-
los cheios de tesão do id deixou claro para
Freud que grande parte desse nosso “eu”
ainda opera nas trevas do inconsciente.

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