Piauí - Edição 152 [2019-05]

(Antfer) #1

Da mesma forma, seria interessante se a mulher grávida não fosse
considerada vulnerável feito um bebê, mas, sim, um adulto inteligente e
autônomo, capaz de compreender o que está acontecendo com o corpo e
de fazer escolhas embasadas. Que durante o pré-natal as informações lhe
fossem fornecidas honestamente e com base nas mais recentes evidências
científicas, a fim de que ela possa decidir o melhor caminho a tomar para
si e para o bebê.


A autonomia da mulher deveria ser respeitada. Se, depois de informada,
ela desejar ter uma cesariana eletiva, que tenha seu desejo atendido e
possa agendar a cirurgia a partir das 39 semanas. Se desejar um parto
vaginal humanizado, que não precise dispor de tanto dinheiro,
determinação ou conhecimento para consegui-lo. Em ambas as situações,
ninguém deveria tomar o nosso lugar e ditar o que devemos fazer e
querer em matéria de direitos reprodutivos e de saúde.


Ao contrário do que certos obstetras fazem parecer, não somos crianças
tolas nem donzelas indefesas em busca de salvação. Somos capazes de
gestar e parir pequenas pessoas cabeludas.


Ninguém aqui é “mãezinha”.


P.S.: No segundo dia após o parto, notei que Mabel estava com uma
remela endurecida em um dos olhos. Não tínhamos algodão no quarto do
hospital e tentei tirar o muco sólido com um lencinho umedecido em
água, mas não consegui. Telefonamos então para o berçário e o que se
seguiu foi o momento mais patético de toda essa jornada: “Boa tarde,
aqui é do 677, precisamos de uma enfermeira para tirar uma remela do
bebê.” Depois que esse procedimento de altíssima complexidade foi
executado, pedi que ela deixasse algumas bolas de algodão para
quaisquer eventualidades. Meu pedido foi negado.


Mesmo depois de parir um bebê de 3 quilos e meio, eu ainda não era
qualificada.

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