Piauí - Edição 152 [2019-05]

(Antfer) #1

premissa, seria preciso reconhecer a fragilidade dos pretensos
revolucionários de esquerda.


Assegurar a derrota dessa suposta revolução, tão facilmente vencida,
justificaria conservar o poder na mão dos militares durante 21 anos? Se a
partir da posse de Ernesto Geisel na Presidência, em 1974, a linha dura
passou a ser a força desestabilizadora, a esquerda pode ser
responsabilizada pelo fato de o regime militar ter durado mais onze
anos?


O emprego do verbo “transmutar” indica que as “armas” teriam sido
substituídas pelos “livros”. Na verdade, a produção intelectual precedeu
a luta armada, manteve-se ativa e continuou fecunda após a derrota das
ações guerrilheiras. Nos poucos casos em que essa troca de armas por
livros ocorreu, o que haveria a recriminar? Livros por acaso não seriam
instrumentos legítimos de atuação política?


A hegemonia cultural da esquerda, entre 1964 e 1968, por acaso “apagou
o passado”? Há evidências em contrário na produção do período. Mas


essa fugaz “espécie de floração tardia”, como foi chamada,[2] teria
significação equivalente à hegemonia da Rede Globo, indiscutível a partir
da década de 80, quando a emissora se tornou líder de audiência? Com
alcance nacional, apesar da queda de audiência observada desde 2004, a
emissora se mantém até hoje na liderança. Em 2017, a campanha
promocional feita pela própria Globo anunciava que ela tinha audiência
diária de 100 milhões, incluindo as plataformas digitais.


A Globo, porém, sequer é mencionada em 1964: O Brasil entre Armas e
Livros. Para o discurso simplista do panfleto da Brasil Paralelo, ao
contrário da frágil esquerda, a emissora não se presta ao papel de inimigo
público nº 1. A narração de Valerim e Ferrugem, assim como as
intervenções de Carvalho e cia., dependem de um oponente direto menos
poderoso e mais bem definido, real ou imaginário, para conseguir se
manifestar.


Chega-se extenuado ao fim do panfleto audiovisual, mas ainda há uma
derradeira tentativa de identificar os responsáveis pelas mazelas que nos
afligem há décadas. Com o dedo indicador apontado, o narrador acusa:

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