Piauí - Edição 152 [2019-05]

(Antfer) #1

V


ale complementar essa análise com os estudos de Paolo Gerbaudo,
professor do King’s College, de Londres, sobre populismo e redes
sociais. Segundo ele, a arquitetura das redes sociais – a maneira
como são desenhadas – propicia o desenvolvimento de lideranças
populistas e de mensagens sensacionalistas. A visualização da
informação é prioritariamente definida pelo número de interações que a
publicação gerou nos primeiros minutos seguintes à postagem. Ou seja,
ela favorece o compartilhamento de conteúdo inflamável. Por isso,
muitas celebridades das redes são originalmente trolls: perfis que adotam
um comportamento que viola regras básicas de convivência. Um
governante que queira se manter “ultrarrelevante” nas redes sociais
precisa gerar grande número de reações às suas postagens.


Foi com o intuito de manter a capacidade de digital influencer que
Bolsonaro criou uma nova categoria de ministros: os ministrolls.
Abraham Weintraub, Damares Alves e Ernesto Araújo cumprem essa
função, assim como outras figuras paraministeriais, como Filipe Martins,
Olavo de Carvalho, Carlos e Eduardo Bolsonaro. Quanto mais
barbaridades eles dizem, mais interações geram e maior é a relevância
cibernética do governo. A nomeação dos ministros ditos mais
“ideológicos” atende eficientemente às necessidades do perfil virtual, ao
mesmo tempo que compromete a execução de políticas públicas.


Donald Trump conseguiu equacionar o dilema entre as figuras do perfil
virtual e do presidente graças ao Partido Republicano, que ofereceu a ele
quadros e capacidade de governar. Como disse Marcos Nobre (“O caos
como método”, piauí_151, abril), aqui são as Forças Armadas que
cumprem a função de vertebrar o governo. O cientista político Sergio
Fausto escreveu algo parecido nesta revista (“O ponto a que chegamos”
piauí_149, fevereiro), ao dizer que o governo atual é composto por duas
forças – a do “liberalismo econômico e da racionalidade burocrático-
militar”, ou seja, Paulo Guedes e os militares, de um lado, e “o
conservadorismo militante e não raro insensato”, de outro. A tensão entre
“olavetes” e militares, tão citada na mídia, seria, portanto, o reflexo da
tensão essencial entre o perfil das redes sociais e o presidente.


Os analistas argumentam que a capacidade de governar será conferida
por essa combinação de técnicos liberais e militares. Mas um olhar mais

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