Piauí - Edição 152 [2019-05]

(Antfer) #1

A despeito de tudo isso, no Brasil, as episiotomias ainda são executadas
em 53,5% dos partos vaginais, segundo a pesquisa Nascer no Brasil, da
Fundação Oswaldo Cruz. O manual da OMS chega inclusive a citar as
altas taxas no país, e alega que “o uso rotineiro ou liberal da episiotomia
pode estar ligado à excessiva medicalização [do parto], com o
fundamento de garantir lucros financeiros para os profissionais”. Muitos
obstetras se referem a essa intervenção cirúrgica como “um piquezinho”
ou “um cortezinho”, na tentativa de torná-la tão inocente quanto uma
picada de injeção.


Diante da minha cara de paisagem, a Obstetra do Convênio me explicou
que a “episio” era indispensável em um parto vaginal, do contrário meu
períneo jamais seria o mesmo. “Tem gente que diz que os músculos
voltam ao lugar, mas não voltam!”, ela garantiu.


Como eu não estava disposta a ter minhas partes íntimas cirurgicamente
retalhadas só por uma questão de hábito, resolvi que era hora de buscar
uma alternativa à Obstetra do Convênio. Mas entre os médicos que se
dedicavam ao parto humanizado, poucos topavam atuar no hospital que
o meu plano de saúde cobria, o Hospital e Maternidade Santa Joana, em
São Paulo. O estabelecimento tem uma das taxas de cesárea mais altas da
cidade: em 2017, 87,8% dos nascimentos por lá foram cirúrgicos, segundo
a Secretaria Municipal de Saúde.


(Por e-mail, a assessoria de imprensa do Grupo Santa Joana declarou que
o hospital é um centro de alta complexidade focado em gestação de alto
risco, prematuridade e bebês de alto risco. “Por isso, gestantes com
complicações materno-fetais são avaliadas com máximo rigor para que o
desfecho de uma gravidez com intercorrências seja de sucesso. Em
decorrência dessas complicações, a indicação médica é uma cesariana,
buscando preservar a saúde e a segurança do binômio.”)


Depois de muito procurar, acabei encontrando uma médica – vamos
chamá-la aqui de Obstetra Humanizada – que estava credenciada nesse
hospital. Ela atendia em um bairro nobre e cobrava 500 reais pela
consulta. Àquela altura, eu já estava com 25 semanas de gestação – das
quarenta geralmente previstas.

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