Piauí - Edição 152 [2019-05]

(Antfer) #1

Logo na entrada, expliquei que não queria contratar uma equipe
multidisciplinar para o parto. Não só por ser muito caro, mas porque não
queria ter tanta gente estranha ao meu redor. Se pudesse escolher,
gostaria de ter um parto calmo, reservado, sem precisar mobilizar meia
dúzia de profissionais em um grande espetáculo de parturição. Falei que
gostaria de ter anestesia à disposição, que estava desempregada e não
tinha condições de bancar um parto gourmet, que não queria que tudo
isso fosse um fator de ansiedade e que, apesar da minha depressão de
tantos anos, estava me sentindo ótima e animada com a gravidez.


Voltei para casa arrasada. Contrariando as expectativas, a Obstetra
Humanizada mal pareceu ter me escutado. Disse que fazia questão de
trabalhar com uma enfermeira e pediu para a secretária me passar um
orçamento com muitos zeros à direita. Só ela cobrava quase 10 mil reais,


ou 250 laudas,[4] para acompanhar o parto. A enfermeira, mais 87 laudas.
A lista completa contava com um anestesista, uma pediatra da sala de
parto, uma pediatra de visitas e um médico auxiliar. A despesa total com
a equipe chegava quase aos 25 mil reais, e sem a doula. Também me
informou que eu deveria marcar consultas quinzenais em alternância
entre ela e a enfermeira, o que acrescentaria ainda mais zeros a essa
conta.


Indiferente à minha disposição de seguir inflando sem grandes
preocupações, me recomendou fazer exercícios aeróbicos e sessões de
fisioterapia para o assoalho pélvico. Além disso, mandou que eu cortasse
todo o açúcar da dieta. Disse que comer doces afetaria o sistema nervoso
do bebê, e deu a entender que eu seria responsável pelo distúrbio de
ansiedade que minha filha carregaria pelo resto da vida, caso eu insistisse
em tomar sorvete.


Como se não bastasse, pediu um teste de curva glicêmica, que é feito
pelos laboratórios apenas na parte da manhã. Respondi que tenho um
caso severo de atraso de fase do sono (distúrbio do ritmo circadiano que
afeta todo o metabolismo, sobretudo o ciclo vigília-sono), o que significa
que só consigo dormir naturalmente por volta das seis da manhã. Fui
recebida com o costumeiro “arrã”. Tentei ser positiva e comentei que
devia haver algum laboratório que fizesse esse exame à tarde. Ela disse
que não, e acrescentou que era um exame imprescindível. Numa última

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