Piauí - Edição 152 [2019-05]

(Antfer) #1

Uma das violências mais comuns é a realização da episiotomia sem o
consentimento da paciente. Alguns médicos vão além e incluem no
pacote básico do parto normal o chamado “ponto do marido”, um ponto
extra realizado ao término da sutura para deixar a vagina mais apertada e
supostamente aumentar a satisfação sexual masculina. Isso ocorre em
detrimento da saúde da paciente, pois pode haver lesão de nervos da
área, perda de elasticidade, estreitamento excessivo e infecção. Não são
poucas as mulheres que alegam ter passado a sentir dor nas relações
sexuais, algo que pode durar o resto da vida. Por vezes, tais
procedimentos são realizados sem analgesia e mesmo quando a paciente
informa sua recusa. “Quem manda aqui sou eu”, declararam alguns dos
médicos citados no dossiê.


“No caso brasileiro, a questão da episiotomia é marcadamente um
problema de classe social e de raça”, escreveu Simone Diniz, professora
da Faculdade de Saúde Pública da USP, com pós-doutorado em saúde da
mulher. “Enquanto as mulheres brancas e de classe média, que contam
com o setor privado da saúde, em sua maioria serão ‘cortadas por cima’
na epidemia de cesárea, as mulheres que dependem do SUS (mais de dois
terços delas) serão ‘cortadas por baixo’, passarão pelo parto vaginal com
episiotomia.” Em certos casos, a incisão é tão grosseira que é chamada
jocosamente de “cesárea de vagina”, “hemibundectomia lateral direita”
ou “AVC vulvar” (nos casos em que faz a vulva e a vagina ficarem
tortas).


Uma ex-funcionária de uma maternidade em Vitória (ES) conta, no dossiê
da rede Parto do Princípio, que uma vez assumiu o plantão e encontrou
três puérperas chorando de dor. Ao consultar seus prontuários, descobriu
que todas tiveram parto normal com episiotomia, mas que não foi
prescrita nenhuma medicação para dor, pois o médico dizia que “normal
não dói, é coisa da cabeça delas”.


Também é considerada violência obstétrica a violação de direitos
garantidos por lei à gestante, como a presença de um acompanhante no
pré-parto, parto e pós-parto imediato (tanto em hospitais públicos quanto
privados). Muitos estabelecimentos impedem sua entrada sob as mais
variadas justificativas, como falta de estrutura, regras internas e “o
médico não deixou”. Outros consideram a presença do acompanhante

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