O Estado de São Paulo (2020-05-18)

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B6 Economia SEGUNDA-FEIRA, 18 DE MAIO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO


A


s discussões sobre os problemas tra-
zidos pela pandemia estão sendo
muitas e muito ricas. Mas há de tu-
do, desde cavaleiros do apocalipse até Po-
lianas que acham que o mundo é belo e que
sairemos da crise melhor que antes e que a
corrupção realmente está sendo combati-
da. Uma das análises vinda de pesos-pesa-
dos do mercado e que repercutiu bastante
trouxe a ideia de que poderá chegar um dia
em que o dinheiro perderá seu valor total-
mente e que mais valeria possuirmos terra,
ouro, bitcoins e ações de empresas. Em re-
sumo, mais vale a pena ter ativos reais do
que ativos financeiros.
O comentário foi dentro de um contexto
e não foi leviano, mas foi tomado por al-

guns como um presságio e que devemos in-
vestir em ouro e bitcoins. Isso, sim, é leviano,
se não for maldoso. Comprar bitcoins sem-
pre é de muito risco. A moeda virtual abriu o
ano em US$ 7,3 mil, em 11 de março atingiu
US$7,9 mil, mas no dia seguinte caiu 39%.
Sem polemizar, acredito que temos de en-
tender melhor o assunto e propor uma orien-
tação mais correta. Esse tipo de comentário
nasce do fato de que, no combate ao caos eco-
nômico, os bancos centrais buscam estimu-
lar a economia oferecendo liquidez pela re-
compra de títulos. Principalmente o Fed, o
BC americano, está praticando o afrouxamen-
to quantitativo (“quantitative easing”- QE).
Alguns estão interpretando que está haven-
do emissão desproporcional de moeda “no-
va”. Isso não é bem verdade. As emissões
apontadas no site do Fed estão dentro da pro-
gramação. As autoridades monetárias não

são tolas e sabem os efeitos desastrosos que
pode trazer o crescimento da base monetária
sem um crescimento econômico que o justifi-
que. Obviamente se houver emissão de moe-
da de forma desproporcional, poderemos vi-
ver fenômenos como já vividos pela humani-
dade, quando a moeda não consegue com-
prar nada por perder totalmente o seu valor.
Apenas como exemplo, isso ocorreu na Ale-
manha na 2.ª Guerra Mundial, quando o mar-
co chegou a ser impresso somente de um la-
do, porque saía muito caro imprimir dos dois
lados. Mas, segundo a imagem agora coloca-
da, a humanidade estaria mergulhada num
caos total e nenhuma moeda teria valor, por
isso seria melhor ter ativos reais. Assim, tam-
bém, temos de admitir que a característica
fiduciária da moeda seria nula. Em outros
termos, todos os países perderiam totalmen-
te a credibilidade e não haveria moeda de cur-

so forçado em lei. Fim de tudo.
Aí vem a pergunta: nessa condição, de
que adianta ter ouro ou bitcoin? O ser hu-
mano não come e não bebe ouro. Ativos
como esses não atendem nossas necessida-
des básicas. Sem declaração de temporali-
dade, a forma como iremos manter reser-
va de valor e realizaremos transações acre-
dito que serão totalmente transformadas.
Sim, é possível admitir que poderemos
substituir o que hoje denominamos moe-
da. Mas não dá para interpretar tema tão
complexo de maneira simplista, muito me-
nos resumir que ouro e bitcoins serão es-
ses substitutos. E, ainda, que a humanida-
de não tem capacidade de reação a situa-
ções como a que estamos passando.

]
PROFESSOR DE FINANÇAS NA FGV/EAESP

Com a redução da
taxa básica de juros,


medida ajuda a


garantir retorno maior


para o investidor


Gestoras reduzem taxas de fundos


]
FÁBIO GALLO

Thiago Lasco


Os sucessivos cortes na taxa Se-
lic são desafiadores para todos
os gestores de fundos de investi-
mento. Afinal, eles fazem mala-
barismo para entregar o retor-
no líquido esperado pelo inves-
tidor. No caso das gestoras inde-
pendentes, que não têm grifes
de peso a seu favor, é ainda mais
importante obter resultados
que conquistem e mantenham
os clientes satisfeitos.
Por isso, algumas dessas casas
vêm reduzindo as taxas de admi-
nistração de seus produtos. Ao
aliviar a mordida sobre os ga-
nhos já enfraquecidos pela Selic
mais magra, melhora o retorno
para o investidor. “Essa discus-
são (sobre redução das taxas) co-
meçou no fim de 2019. Ali, já se
vislumbrava que a Selic chegaria
a 3% ao longo deste ano”, diz
Carlos Lima, sócio e gestor dos
fundos líquidos da Quasar.
“A pandemia precipitou as
coisas, ninguém imaginava a Se-
lic a 2,25% no fim de 2020, mas
já havia de qualquer forma um
cenário de juros baixos por um
período prolongado de tempo.
Todos começaram a se adequar
a esse cenário”, diz Lima.
Em fevereiro, a Quasar redu-
ziu as taxas de administração de
seus dois fundos de renda fixa,
ambos com alocação em crédi-
to privado de longo prazo. No
Quasar Advantage, com liqui-
dez em D+1 (ou seja, é possível
sacar o dinheiro um dia após a
solicitação), a taxa foi reduzida
de 0,50% para 0,40%. Já no Qua-
sar Advantage Plus, com resga-
tes após 30 dias, a taxa caiu de
0,80% para 0,60%.


“Quisemos buscar uma rela-
ção risco-retorno que fizesse
sentido tanto para o gestor co-
mo para o investidor”, explica
Lima. “Uma taxa de 0,50% tem
impacto maior no retorno líqui-
do do investidor com a Selic a
3% do que com a Selic a 7%.”
A Sparta também oferece fun-
dos de renda fixa com crédito
privado. O presidente da gesto-
ra, Ulisses Nehmi, diz que a taxa
de administração é reavaliada
periodicamente. “Olhamos a es-
trutura de custos dos gestores,
o cenário macroeconômico, o
retorno bruto dos ativos e quan-
to o investidor precisa de resul-
tado líquido. O fundo precisa
atender o investidor e ser tam-
bém viável para a gestora”, diz.
Em março, a política de taxas
dos fundos Sparta Top e Sparta
Max foi reformulada. A parcela
dos fundos efetivamente inves-
tida em crédito privado conti-
nuou tendo tarifa cheia, de
0,70% no Sparta Top e 0,80%
no Sparta Max. Já para o mon-
tante de caixa, que é alocado em
papéis do Tesouro Direto, as ta-
xas de administração caíram pa-
ra 0,30% (Top) e 0,35% (Max).
“A parcela alocada é onde es-
tou agregando valor, então vou
cobrar a taxa integral. Já na par-
cela de caixa eu cobro pouco, o
equivalente a um fundo passi-
vo. No varejo há fundos com
tíquetes menores que cobram
taxas enormes só para investir
em título público”, diz Nehmi.

Volatilidade. O carro-chefe da
Garin Investimentos é o fundo
multimercado Garin Special,
que opera juros, câmbio e ações
com participação de derivati-
vos. A taxa de administração
sempre seguiu a praxe do merca-
do: 2%, complementada por ta-
xa de performance de 20% so-
bre o que superasse o CDI. Em
março, a gestora resolveu redu-
zir a taxa de administração de
2% para 1,5%.

“Achamos que fazia sentido
cobrar um pouco menos, já que
esse fundo tem risco e volatili-
dade moderados. Um ganho de
0,5% é relevante para o cotista”,
diz o gestor-chefe Ivan Kraiser.
Ele explica que a taxa de admi-
nistração é importante para
manter as atividades da equipe,
mas boa parte dos ganhos da
gestora vem da taxa de perfor-

mance, que foi mantida em
20%, dentro do que se cobra em
outras casas.
O nível de volatilidade do fun-
do é, na opinião dele, decisivo
para que a taxa de administra-
ção seja mantida ou reduzida.
Afinal, em tese o risco maior
abre espaço para retornos mais
generoso e taxas mais caras.
“Os fundos multimercado
com mais volatilidade perfor-
mam muito acima do CDI, com
estratégias específicas. Se ele
entrega 30% no ano, tanto faz a
taxa ser meio ponto maior ou
menor”, acredita Kraiser.
À primeira vista, quem coloca
na ponta do lápis o impacto das
reduções feitas pelas gestoras
no retorno líquido dos fundos
pode ficar desapontado. Afinal,

comparando os montantes líqui-
dos no bolso do investidor sob a
taxa nova e a antiga, a diferença
não é tão grande assim (ver qua-
dro acima).
Entretanto, para a coordena-
dora do Centro de Estudos em
Finanças da FGV-EAESP, Clau-
dia Yoshinaga, a importância da
redução das taxas de administra-
ção não deve ser desprezada.
“Não podemos esquecer que
esses tipos de fundos de investi-
mentos têm rentabilidade mui-
to incerta. O gestor de crédito
privado pode, sim, fazer boas
compras. Mas o retorno que o
investidor vai ter não é garanti-
do, os resultados expressos nas
simulações podem não ser al-
cançados”, pondera. “A única
coisa garantida é o quanto o ges-

tor vai cobrar de taxa. Por isso, o
cliente tem, sim, de batalhar por
taxas de administração meno-
res”, afirma Claudia.

Novas reduções. Especialistas
ouvidos pelo E-Investidor obser-
varam que boa parte dos movi-
mentos de redução nas taxas de
administração já ocorreu, princi-
palmente a partir do segundo se-
mestre de 2019. Agora, salvo
ajustes pontuais, não há muito
espaço para novos cortes. Por is-
so, cabe ao investidor avaliar se
o retorno efetivamente entre-
gue pelo fundo justifica a taxa de
administração cobrada.
No caso dos fundos multimer-
cado convencionais, que operam
bolsa, dólar e juros, Sylvio
Fleury, diretor de relações com o
mercado da Ativa Investimen-
tos, entende que a habitual “po-
lítica do 2x20” (2% de administra-
ção e 20% de performance sobre
o que ultrapassar o benchmark)
só se justifica em fundos que en-
treguem ganhos recorrentes.
“Em um multimercado que
não sai do trivial, não vale a pena
pagar essa taxa. A 2%, o gestor
tem de saber correr risco. Se ele
comprar só LFT (título público
conhecido como Tesouro Se-
lic), o fundo vai render 33% do
CDI, 1% ao ano. Ele tem de fazer
por onde, justificar o que está
sendo cobrado do cliente.”
Para o analista de fundos da
Guide Investimentos, David
Sousa Rocha, ainda que a redu-
ção das taxas de administração
seja necessária para ajudar os
fundos a entregar o objetivo de
retorno proposto, os gestores já
chegaram ao limite. “Uma hora
a Selic voltará a subir. Quando
isso acontecer, vai ser duro para
o gestor aumentar a taxa de ad-
ministração, um gesto mercado-
logicamente difícil. Então, ele
pensa a longo prazo. Não pode
reduzir a taxa a quase zero, se-
não depois fica muito complica-
do voltar a aumentar”, diz.

EINVESTIDOR.ESTADAO.COM.BR

Na web
APONTE A CÂMERA DO SEU CELULAR
PARA O QRCODE AO LADO OU ACESSE:

lEm queda

OBS.: A SIMULAÇÃO UTILIZA AS TAXAS ATUAIS DE CARREGAMENTO DOS FUNDOS, AS CURVAS DE JUROS DE 1 E 2
ANOS E O RETORNO LÍQUIDO SEM DESCONTAR O IMPOSTO DE RENDA

●Entenda como uma pequena mudança na taxa de administração faz diferença na
rentabilidade de dois fundos de investimento de perfis diferentes

QUANTO PESA NO BOLSO

Quasar Advantage FI Renda Fixa
Crédito Privado Longo Prazo

FUNDO

PERFIL DE RISCO
META DE RETORNO
APLICAÇÃO MÍNIMA

PATRIMÔNIO LÍQUIDO

APLICAÇÃO

TAXA DE
ADMINISTRAÇÃO

Retorno

Conservador
105% a 110% do CDI

R$ 500
R$ 868 milhões

1 ANO 2 ANOS

104.650 112.

1 ANO 2 ANOS

104.545 111.

0,4% 0,5%

Quasar Advantage Plus FI Renda
Fixa Crédito Privado Longo Prazo

Moderado
115% a 120% do CDI

R$ 500
R$ 508 milhões

1 ANO 2 ANOS

105.650 114.

1 ANO 2 ANOS

105.

113.

0,6% 0,8%

EM REAIS

FONTE: GESTORA INFOGRÁFICO/ESTADÃO

R$ 100
mil

O fim do dinheiro


2%
é a taxa de administração
normalmente cobrada para
fundos multimercados, mas
a Garin reduziu a cobrança
para 1,5% em março
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