O Estado de São Paulo (2020-05-18)

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H2 Especial SEGUNDA-FEIRA, 18 DE MAIO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO


SONIA RACY


DIRETO DA FONTE
Colaboração
Cecília Ramos [email protected]
Marcela Paes [email protected]
Sofia Patsch [email protected]

O Brasil se preparou tardia-
mente para o combate ao co-
ronavírus e a situação só pio-
ra com o “bate-cabeça” po-
lítico, segundo Pedro Pas-
sos, um dos três sócios fun-
dadores do grupo Natura, re-
conhecendo a grave situa-
ção. Há possibilidade de Jair
Bolsonaro sofrer impeach-
ment? “Sem uma liderança
que una o País, não consegui-
remos enfrentar essa crise”,
se limita a responder, duran-
te entrevista, por Skype, se-
mana passada, à coluna, o
também ex-dirigente do IE-
DI e atual presidente do
SOS Mata Atlântica.

O capitalismo, segundo o
empresário, “promoveu ri-
queza, melhorou a qualida-
de de vida de milhões, prin-
cipalmente em alguns paí-
ses emergentes. Mas não re-
solveu tudo”. Isso vai mu-
dar, inclusive por meio do
aumenta da solidariedade
no mundo pós pandemia?
“Acho que sim, porque a
gente já percebeu que rique-
za com desigualdade é igual
à pobreza”.

O que fez a Natura para aju-
dar a combater a pandemia?
Segundo Passos, com 50 mil
funcionários espalhados pe-
lo mundo, ela aumentou pro-
dução de produtos de higie-
ne pessoal e adaptou linhas
para o álcool gel. E com in-
tuito de divulgar informa-
ções sobre a covid-19, está
usando e incentivando sua
rede de 6 milhões de consul-
toras e representantes.

Aqui vão os melhores mo-
mentos da conversa.

lComo você está vendo essa
pandemia? Acredita em isola-
mento vertical, horizontal?
É uma crise gravíssima que
atingiu a dimensão global
em muito pouco tempo. O
Brasil poderia ter reagido an-
tes, uma vez que foi uma das
últimas re-
giões atingi-
das. Mas a si-
tuação no
Pais vem se
complicando
cada vez mais
com o bate-cabeça político e
falta de estratégia do gover-
no federal, que aparente-
mente, não acredita na ciên-
cia.

lE outros países, como estão
reagindo?
Mais uma vez sentimos fal-
ta de organismos multilate-
rais que em situações como
esta pudessem orientar
coordenar a ação global. Por-
tanto, vemos cada país se de-
fendendo do seu jeito, com
a sua própria abordagem, e
a OMC dando recomenda-
ções sem condições de
atuar mais efetivamente. É
possível que depois dessa
pandemia, dessa crise eco-

nômica colossal, que vamos en-
frentar, a governança global te-
nha que ser repensada para
atender alguns temas centrais
do século XXI.

lQuais seriam?
A desigualdade é um tema que
não será resolvido isoladamen-
te em cada país. Mudanças cli-
máticas é outro tema transver-
sal. O problema dos fluxos mi-
gratórios. E por aí vai. Acho
que vamos passar por essa revi-
são, eu espero... Alguns pensa-
dores acreditam que não, que
o mundo vai se radicalizar ain-
da mais, que a globalização vai
ser mais afetada, que vamos
ver reforçados o nacionalismo
radical e o isolacio-
nismo. Ou seja um
desmonte da globa-
lização, enquanto
que outros acham
que teremos um ca-
minho mais suave
de reconstrução de um novo
consenso mundial. Lembran-
do que, quando construímos
novos consensos, por exem-
plo, depois da Segunda Guer-
ra, por meio de ONU e outros.
Conseguimos criar um longo
período de paz e de prosperida-
de. Torço para que essa hipóte-
se prevaleça.

lPodemos considerar essa pan-
demia uma terceira guerra mun-
dial sem tiros?
Não saberia dizer, mas vejo que
esta crise coloca em questiona-
mento muito do modelo de de-
senvolvimento e das premissas
que vínhamos adotando até ho-
je. Então acredito que teremos
mudanças pela frente.

lAcredita em mudanças de go-
verno, governos mais conscien-
tes, governos mais operantes?
O Estado tem que ser eficien-
te, prover os serviços essen-
ciais. Enfim, atuar naquilo que
é relevante para sociedade e es-
timular a iniciativa privada a
trabalhar em prol da socieda-
de. Como? Com inovação,
com geração de emprego, com
muito investimento em solu-
ções criativas.

lNo caso do Brasil, qual o princi-
pal entrave?
Hoje nós temos um estado dis-
funcional. Um estado que tem
um orçamento grande e amar-
rado e que foi tomado por gru-
pos de interesses corporati-
vos, de dentro do próprio esta-
do, protegendo altos salários e
situações anacrônicas em rela-
ção à sociedade. Mas também
há interesses do setor privado,
que tem subsídios e incentivos
fiscais distorcidos. Precisamos
começar a trabalhar com um
Brasil que trata os brasileiros
como iguais.

lDa classe empresarial, da ini-
ciativa privada, o que é que você
espera?
Em primeiro lugar, espero a de-
fesa intransigente dos valores
democráticos e maior compro-
misso com o País, sem conces-
sões. Tenho a impressão que a
classe empresarial vai estar
diante de um consumidor dife-
rente, com a sociedade exigin-
do que as empresas tenham
um papel que vá além da eco-
nomia. Sejam agentes, para ge-
ração de prosperidade, mas
também para estabilidade so-

cial, para ajudar no assunto da
desigualdade. Temas como
saúde, ética, meio ambiente,
sustentabilidade, serão mais
cobrados da classe empresa-
rial.

lSerá demanda do consumidor?
Já é uma demanda da crescen-
te da sociedade e ela vai se ace-
lerar de forma muito evidente.
Portanto, nos levará a uma mu-
dança no entendimento do pa-
pel da empresa. A empresa que
foi definida algum tempo atrás
como uma máquina de com-
promissos com seus acionis-
tas, na verdade, passa a ser
uma máquina para promover
desenvolvimento social que in-
clui acionistas, mas inclui
consumidores, colaborado-
res, etc.

lPrecisamos trabalhar nessa
vertente, as políticas econômi-
cas precisam endereçar essa
nova demanda?
A pobreza extrema que vemos
no Brasil, com grande parcela
da população sem as necessida-
des básicas atendidas, além de
inaceitável do ponto de vista
humano, é um obstáculo ao
crescimento da produtividade
e por consequência ao desen-
volvimento do País. Esta é
uma agenda que se impõe aos
policy makers de todas as li-
nhas de pensamento.

lO que aconteceu com o capita-
lismo que gerou tão mais desi-
gualdade?
A partir da globalização, ele
promoveu muita riqueza, me-
lhorou a qualidade de vida de mi-
lhões de pessoas principalmente

em alguns países emergentes.
Mas não resolveu tudo. Esta in-
clusão se deu de forma desigual
e muitos ficaram para trás princi-
palmente nos países que não en-
tenderam a necessidade de se in-
tegrar ao mundo.

lA solidariedade vai aumentar?
Acho, porque a gente já perce-
beu que riqueza com desigualda-
de é igual a pobreza.

lE as lideranças empresa-
riais?
Essa é outra transformação
que o Brasil precisa enfrentar.
O setor privado cobra refor-
mas, eficiência do estado, mas
não mexe no seu próprio siste-
ma de
repre-
senta-
ção.
Che-
gou a
hora
dessa discussão vir para a me-
sa. A legislação que suporta a
escolha das lideranças das fe-
derações e confederações vem
da época de Getúlio Vargas,
carrega uma série de vícios do
passado e não está adequada
às necessidades de um mundo
moderno.

lO que é que você acha do Siste-
ma S?
Ele se desviou, em parte, de
sua finalidade principal e tam-
bém precisa ser reformulado.
Não deveria estar ligado às fe-
derações e confederações. Po-
de sim ser uma instituição au-
tônoma. Em que se possa,
num processo de transição, re-
duzir as contribuições parafis-

cais que recebe.

lComo o Brasil está enfren-
tando a crise econômica?
Agora temos que priorizar o
atendimento à saúde e à pre-
servação da renda daqueles
que estão sofrendo com a re-
dução da atividade econômi-
ca. É a prioridade zero e é ine-
vitável um impacto importan-
te nas contas públicas. Mas
temos que ter o cuidado ne-
cessário de não introduzir
despesas permanentes que ti-
rem a confiança de que pode-
remos voltar a agenda de
equilíbrio fiscal no futuro.
Neste sentido, a falta de coor-
denação entre os poderes e a
crise política que vivemos po-
tencializa os problemas que
teremos pela frente. Medidas
populistas vão nos custar
muito caro.

lO Brasil ocupa a 124ª posi-
ção, entre 190ª paises do
ranking do Banco Mundial,
para se fazer negócios. Co-
mo mudar isso?
Não vamos sair dessa se não
fizer o que tem que ser feito.
Não há atalhos. Mas existe
um ingrediente novo nesta
abordagem. A questão social
precisa ser encarada para va-
ler. São vergonhosos nossos
indicadores sociais. Educa-
ção, saúde, renda, habitação
e saneamento não podem
ficar assim.

lHá possibilidade de Bolsona-
ro vir a sofrer impeachment?
Sem uma liderança que una
o País não conseguiremos
enfrentar essa crise.

‘Riqueza com desigualdade é igual à pobreza”


Blog: estadão.com.br/diretodafonte Facebook: facebook.com/SoniaRacyEstadao Instagram: @colunadiretodafonte

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