O Estado de São Paulo (2020-05-19)

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H2 Especial TERÇA-FEIRA, 19 DE MAIO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO


SONIA RACY


DIRETO DA FONTE


Colaboração
Cecília Ramos [email protected]
Marcela Paes [email protected]

divirta-se


Marina Vaz


Um pianista finlandês. Uma can-
tora norte-americana. Um con-
trabaixista japonês. Um flautista,
uma violista e dois violinistas ale-
mães. Além de serem músicos
profissionais que tocam em dife-
rentes grupos, eles têm em co-
mum o fato de viverem em um
conjunto de prédios no bairro de
Charlottenburg, em Berlim. Com
apresentações canceladas por
conta da pandemia, decidiram se
reunir para tocar a Ode à Alegria,
de Ludwig van Beethoven.
Sempre aos domingos, os ar-
tistas aparecem em suas respec-
tivas janelas e varandas para um
concerto. Primeiro, ocorrem al-
guns solos e duos voltados para
o pátio interno do edifício, com
repertório variado. Depois, é ho-
ra de apresentar a composição
de Beethoven para quem passa
pela rua. Vez ou outra, um ciclis-
ta desacelera, e para pra ouvir.
Uma mulher, do outro lado da
via, arrisca alguns sons, tentan-
do acompanhar a voz da sopra-
no. E uma vizinha, sempre reclu-
sa, abre uma fresta de sua vidra-
ça só para ver e escutar.
A ideia de unir os músicos,
que, até então, não eram pes-
soas tão próximas, foi do flautis-
ta Jochen Hoffman, integrante
da Deutsche Oper e morador
do terceiro andar. E a escolha
do repertório foi oportuna – a
emblemática Ode à Alegria, que
integra a Nona Sinfonia, já esta-
va sendo lembrada em homena-
gens aos profissionais da saúde,
em outras janelas do país.
“Eu sempre brinquei que a
gente tinha de ter um projeto
juntos. Então, quando Jochen
me convidou para fazermos al-
go, eu topei na hora”, conta a
violista alemã Julia Linder, que
já se apresentou com orques-
tras como a Komische Oper e a
Gewandhaus de Leipzig. “Eu fi-
co realizada de ver o quanto is-


so traz de alegria aos vizinhos.
Ao mesmo tempo, para mim,
também é uma forma de cura
pessoal neste momento tão tris-
te, tão difícil.”
A escolha da peça de Beetho-
ven trazia, entretanto, um desa-
fio. Era preciso um arranjo que
contemplasse os instrumentos
tocados pelos moradores do
prédio. Foi aí que Julia e seu ma-
rido, o jornalista brasileiro Gui-
lherme Conte, resolveram con-
vidar para a tarefa o compositor
Leonardo Martinelli, que vive
em São Paulo. “A combinação
de músicos era um tanto inco-
mum”, observa Martinelli, que,

naquele final de março, sentia a
perda de duas importantes refe-
rências no meio da música
clássica, vítimas da covid-19 – a
maestrina Naomi Munakata e o
maestro Martinho Lutero Gala-
ti. “Disse que faria, sim, o arran-
jo, até como uma forma de pro-
cessar esse luto e honrar a causa
artística desses dois maestros.
Fiz em apenas um dia, tomado
por sentimentos antagônicos”,
relembra o músico, que, em de-
zembro do ano passado, es-
treou uma ópera sua no Thea-
tro São Pedro, O Peru de Natal,
baseada no conto homônimo
de Mário de Andrade.

Para Martinelli, apresenta-
ções artísticas mais espontâ-
neas e informais como essas car-
regam outros significados. “São
ações poderosas, pois estabele-
cem um tipo muito especial de
conexão entre o artista e seu pú-
blico. Não se trata mais de um
simples lazer, de um programa
a ser feito no fim de semana. É
um exercício de luta e vida para
todas as partes, seja o músico ou
quem o escuta – procurando
não apenas a música, mas um
sentido de existência diferente,
que não encontramos em con-
certos ou shows que íamos an-
tes da pandemia.”
Nas primeiras apresentações
no condomínio, uma das dificul-
dades era os artistas ouvirem
uns aos outros. Enquanto a so-
prano norte-americana Sarah
Fuhs cantava no térreo, por
exemplo, os instrumentos que a
acompanhavam estavam três ou
quatro andares acima. Além dis-
so, o grupo não utiliza qualquer
tipo de amplificação de som – ex-
ceto quando o finlandês Sami
Väänänen, marido de Sarah, toca
piano, já que o instrumento fica
distante das janelas, no meio da
sala. Para melhorar a sintonia en-
tre os músicos, a saída foi Väänä-
nen assumir o posto de regente,
a partir do pátio do edifício.
Com o isolamento social, Sa-
rah acredita que as pessoas têm
ainda mais vontade de ficar co-
nectadas com os outros. “Acho
que artistas certamente podem
ajudar a suprir essa necessida-
de, agora mais do que nunca –
pode-se ganhar menos dinhei-
ro, mas as recompensas emocio-
nais provavelmente nunca fo-
ram tão intensas e gratifican-
tes”, diz ela. “Shakespeare já sa-
bia, e agora todos estamos expe-
rimentando isso: o mundo intei-
ro é um palco, incluindo o para-
peito da janela.”
A orquestra de vizinhos já
tem até nome – Homecastle
Symphony Berlin – e acaba de
ganhar um canal próprio no
YouTube (bit.ly/hcsymphony).

lA Dotz lançou a campanha
Doe Dotz – Para Estar Junto, Não
Precisa Estar Perto, em prol de
hospitais administrados pelo
Instituto de Responsabilida-
de Social Sírio-Libanês.

lA Campari e a Heineken es-
tão na plataforma Brinde do
Bem, que ajuda bares e restau-
rantes fechados na quarente-
na. As empresas vão doar o do-
bro do valor arrecadado na ini-
ciativa, em que consumidores
podem comprar vouchers de
R$25 a R$100 e resgatar em
consumo até o final do ano.

lA Fracttal está disponibili-
zando um software gratuito
para auxiliar unidades de saú-
de brasileiras na pandemia.

JANELAS


SINFÔNICAS


RESPONSABILIDADE
SOCIAL

Moradores de um condomínio em Berlim se unem para tocar Beethoven


No dia 24, Bruno Fagundes faz aniversário e já tem planos para a “festa” em quarentena.
“Vou comemorar em isolamento, mas já estou planejando um grande videoconferência para
comemorar e beber com meus amigos”, diz ele, que assim como outros atores, está com a
profissão “100% travada”. “Minha quarentena tem altas reflexões, dias mais difíceis, outros
melhores e alguns com muita ansiedade. Estou fazendo um curso de roteiro e lendo muito”, diz.

POLAROID
O projeto Polo Cultural organiza
o concurso de poesias Tâmaras -
Poesias para Depois do Amanhã
com o tema Reflexão em Tempos
de Pandemia. Serão três categorias
voltadas para poetas, estudantes e
iniciantes. A expectativa é ter 300
participantes e as inscrições vão até


  1. O coletivo Slam das Minas SP
    faz parte da equipe de curadores.
    “Um concurso de poesia destinado
    aos escritores independentes e
    periféricos evidencia a nossa
    necessidade como artistas mais
    afetados nessa pandemia.
    Estamos sem emprego e precisamos
    sobreviver", diz a escritora Pam
    Araújo, integrante do Slam.


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Música do bem


A Associação Brasileira de Músi-
ca e Artes fará leilão de peças
doadas por artistas em prol de
quatro ONGS – elas apoiam pro-
fissionais da cadeia cultural. O
leilão já começou e os arrema-
tes vão até 15 de junho.

Na lista, consta violão de Rober-
to Menescal, uma jaqueta de
couro de Paulo Ricardo, guitar-
ra de Jorge Vercillo e peça do
figurino de Victor Kley.

Pós-pandemia?


A Editora Sextante conseguiu
os direitos de publicação no Bra-
sil do livro The Good Life – que
traz uma das mais longevas pes-
quisas de Harvard sobre felici-
dade e bem-estar.

Escrito por Robert Waldin-
ger, tem previsão de lançamen-
to em 2021.

Pós-pandemia 2


O livro traz detalhes de estudos
comprovando que as pessoas
mais felizes e bem sucedidas são
aquelas que cultivaram boas re-
lações com amigos, familiares,
parceiros e colegas de trabalho.

Título provisório? Na tradução
do original para o português se-
rá: A Boa Vida.

Petro cultura


O concurso de Arte e Caricatu-
ra em homenagem aos 250 anos
de Beethoven – criado pela Or-
questra Petrobras Sinfônica –
tem 2,8 mil inscritos. O resulta-
do sai dia 29.

Petro saúde


A Petrobras está destinando R$
1 milhão para dar suporte a
39 centros de manutenção de
ventiladores coordenados pelo
Senai. Quer viabilizar a restaura-
ção de pelo menos 100 desses
equipamentos.

Arte na covid-19


Ante a pandemia, a Sotheby’s
ampliou seu calendário de
vendas online em 2020 con-
seguindo um crescimento de
370% na comparação ao mes-
mo período no ano passado.

No que se refere ao Brasil, a
representante da casa de
leilões no País, Katia Mind-
lin, destaca o sucesso no arre-
mate da obra do artista Lucas
Arruda, a Sem Título. O preço
estimado girava entre US$
115 mil até US$ 200 mil e o
quadro sai por US$ 350,000,
“após disputa feroz entre oi-
to interessados”.

Boa, a intenção


O Projeto de Lei Covid rece-
beu o ‘selo’ urgente, ontem,
na Assembleia paulista, e in-
clui 30 proposições.

Entre elas, chama atenção a
que cria um auxílio emergen-
cial de R$ 300,00 por mês a
mulheres vítimas de violên-
cia doméstica.

À coluna, Vinicius Camari-
nha, relator do PL, diz que a me-
dida se dá ante o aumento de
30% de violência contra a mu-
lher em SP, na pandemia.

Novo rodízio?


Enquanto isso, Doria quase
enfartou players do merca-
do financeiro ao avisar, on-
tem, também ser a favor da
antecipação de feriados. Do-
mingo, Bruno Covas, por
exemplo, fez proposta. O
mercado mundial de ações
está bombando.

Vai que dá?


Projeto de lei, no Congresso,
obriga uso de máscara afetan-
do o território nacional. Pre-
vê detenção de 15 dias a um
ano e multa para o infrator.
Dúvida: quem fiscaliza quem?

SILVANA GARZARO/ESTADÃO

Fachada. De
um lado, os
músicos; do
outro, os vizinhos

FOTOS GUILHERME CONTE

Voz. A soprano Sarah Fuhs canta voltada para o pátio interno

SILVANA GARZARO/ESTADÃO
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