O Estado de São Paulo (2020-05-21)

(Antfer) #1

Júlia Corrêa


Se, mais do que nunca, estamos
precisando usar a criatividade pa-
ra lidar com os desafios impos-
tos pela pandemia, a possibilida-
de de nos conectarmos com a ar-
te pode ser uma boa forma de,
mesmo confinados, ampliarmos
os nossos horizontes. Diferentes
iniciativas surgidas nos últimos
dias apostam tanto no incentivo
à produção dos artistas quanto
na divulgação de suas obras pela
internet, para que o público tam-
bém possa encontrar novos estí-
mulos neste momento.
Idealizada por três publicitá-
rios espanhóis – Emma Calvo,
José Guerrero e Irene Llorca –, a
página do Instagram The Covid
Art Museum (@covidartmu-
seum) está em atividade desde
19 de março e conta hoje com
quase 100 mil seguidores. “Nos
primeiros dias de quarentena na
Espanha, nós notamos como ar-
tistas e amigos estavam compar-
tilhando criações ligadas à pan-
demia nas redes sociais”, relata
Irene. Foi assim que o trio perce-
beu se tratar de um fenômeno
interessante e que as obras me-
reciam ser compiladas.
“A arte sempre se mostrou
uma grande testemunha de ca-
da era. Vendo essas obras, é pos-
sível entender mais sobre os
sentimentos e pensamentos de
quem viveu este período, e nós
esperamos que, no futuro, es-
ses trabalhos possam vir a ser
interesse de estudos e aprendi-
zados”, complementa a idealiza-
dora, que conta ainda que o Bra-
sil é um dos países mais engaja-
dos no projeto.
Foi com proposta semelhan-
te que Luiza Lorenzi Adas, de 23
anos, usou os recursos do Insta-
gram para criar a página Museu
do Isolamento Brasileiro (@mu-
seudoisolamento), que busca di-
fundir obras produzidas por ar-
tistas de todo o País durante a
quarentena. Formada em rela-
ções públicas e interessada em
comunicação estratégica para a
atração de público para museus,
Luiza já mantinha a página Flo-
rindoLinhas, em que fala sobre
arte de modo acessível e divulga
atividades da área.
“Quando o isolamento come-
çou, passei a me questionar co-
mo a arte poderia se manter vi-
va. Conversei com artistas so-
bre como o momento poderia
dificultar ainda mais a sua visibi-
lidade. Enquanto eu refletia,
descobri o The Covid Art Mu-
seum. Então pensei: ‘Por que eu
mesma não posso fomentar o
ecossistema da arte brasilei-
ra?’”, relata Luiza.
Criado há duas semanas, o
museu já conta com 10 mil segui-
dores e 400 publicações. Ela ex-
plica que a diferença de sua ini-
ciativa para a que lhe serviu de
inspiração é que as obras com-
partilhadas por ela não necessa-
riamente trazem reflexões rela-
cionadas diretamente à pande-
mia. “Alguns artistas fazem
críticas mais ligadas ao momen-
to, mas tem muitos abordando
as suas experiências pessoais, a
sua individualidade neste mo-
mento de isolamento”, explica.
A mescla de diferentes tipos
de arte – como imagens digitais,
fotografias e pinturas em aquare-
la – é um dos aspectos levados
em conta por Luiza em sua cura-
doria. Sua preocupação também
se estende à diversidade de reali-
dades em que essas obras são pro-
duzidas. Por viver em São Paulo,
acaba atraindo, naturalmente,
mais obras criadas no Sudeste,
mas ela vem buscando contem-
plar outras regiões do País.
Ela conta que a repercussão
da iniciativa se deu de modo
rápido e orgânico. “Na página
FlorindoLinhas, eu tenho cerca
de 7 mil seguidores. Comparan-
do com influenciadores, não é


um número tão alto, mas meus
seguidores são muito engaja-
dos. Quando você se envolve
com o mundo das artes, encon-
tra pessoas que querem ajudar.
Assim que anunciei, muitos co-
meçaram a divulgar em seus sto-
ries, e a página do museu alcan-
çou um público grande. No iní-
cio, os artistas enviavam as
obras usando hashtag e mensa-
gens diretas, mas não dei conta.
Precisei criar um formulário pa-
ra poder organizar o material.”
Luiza explica que o fim da qua-
rentena não implicará, necessa-
riamente, o fim das atividades.
“O projeto foi muito feliz de ter o
nome que tem, pois se encaixa
neste atual momento, mas tam-
bém tem relação com artistas
que não têm um espaço para ex-
por, que refletem e trabalham iso-
ladamente. É uma forma rápida e
fácil de reunir essas produções,
um museu que vai até você.”

Batalhas e concursos. Há qua-
se dois meses, com a necessida-
de de isolamento social, o Sesc
24 de Maio transpôs para a sua
página do Instagram o projeto
Batalha de Ilustradores, que cos-
tumava ocorrer no Espaço de
Tecnologia e Artes da unidade. A
cada semana, artistas profissio-
nais e amadores são desafiados a
criar uma ilustração a partir de
um novo tema, que deve ser com-
partilhada com a hashtag #bata-
lhadeilustradores24 em posta-
gens, marcando também a pági-
na @sesc24demaio.
Após educadoras da unidade
elegerem as duas melhores ilus-
trações, as obras são publicadas
nos stories da página, sempre às
terças-feiras, às 18h, para uma
votação final do público. A obra
vencedora é publicada, então,
na quarta-feira, às 20h, na linha
do tempo, cuja caixa de comen-
tários fica aberta para o criador
interagir com o público. Nessa
mesma ocasião, é divulgado o
tema da edição seguinte. Para
concorrer, os artistas devem
compartilhar a ilustração até se-
gunda-feira, às 18h.
A última edição, por exem-
plo, teve como tema A Viagem
dos seus Sonhos. A vencedora
foi Fer Rodrigues, com uma ilus-
tração inspirada na cultura de
Salvador. Da anterior, que tinha
como proposta a releitura de
uma obra de arte, o vencedor foi
Wellington Martins, que to-
mou como referência a estatue-
ta Vênus de Willendorf para
questionar padrões sociais. Em
andamento, a edição desta se-
mana sugere aos participantes
criarem suas ilustrações inspi-
radas em seu personagem favo-
rito de um livro ou de um filme.
A feira ArtRio, cuja 10.ª edição
está prevista para setembro,
também apostou em concursos
online. Por meio de chamadas
abertas em seu Instagram (@ar-
trio_art), promoveu a Mostra
Fotográfica Retratos da Quaren-
tena, que contou com duas edi-
ções. A proposta foi incentivar
fotógrafos amadores e profissio-
nais a produzir registros das mu-
danças no cotidiano provoca-
das pela pandemia. As fotos sele-
cionadas podem ser conferidas
no site e nas redes da feira.
Já o Mobile Photo Festival,
concurso que incentiva a produ-
ção de fotografias feitas pelo ce-
lular, previa apresentar as
obras dos vencedores de sua sé-
tima edição em uma exposição
no Museu da Imagem e do Som
(MIS) a partir deste mês. Dian-
te da pandemia, a iniciativa con-
centrou suas ações na internet,
incluindo na categoria Ensaio o
tema A Vida em Quarentena.
Enquanto não há uma nova da-
ta para a exposição, é possível
conferir as fotografias na pági-
na do Instagram @mobgraphia,
assim como nas plataformas di-
gitais do museu.

EM REDE


NA


Iniciativas online incentivam a produção e a


divulgação de obras durante a quarentena


Caderno 2


Ícone do jazz, pianista Chucho Valdés fará live PÁG. H6


QUARENTENA


ARTE


Detalhes. Artistas brincam com objetos do atual momento Museu do Isolamento. Iniciativa contempla arte brasileira

Criatividade. The Covid Art Museum reúne trabalhos de artistas ao redor do mundo, com reflexões sobre a pandemia

AINA GIRÓ DE PEDRO

DONNA ADI

CHAD BATKA/NYT-22/10/2015

MARCIA DE MORAES

%HermesFileInfo:H-1:20200521:H1 QUINTA-FEIRA, 21 DE MAIO DE 2020 (^) O ESTADO DE S. PAULO

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