O Estado de São Paulo (2020-05-26)

(Antfer) #1

%HermesFileInfo:B-4:20200526:
B4 Economia TERÇA-FEIRA, 26 DE MAIO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO


N


unca tudo foi tão temporá-
rio. Mesmo antes da covid-
19, transitoriedade, agilida-
de e flexibilidade já eram temas re-
correntes nas análises do mercado
de trabalho que vinha se mostrando
em franca transformação. Ativida-
des ganharam outro ritmo com os
avanços tecnológicos e a digitaliza-
ção. Projetos se tornaram mais fre-
quentes e o modo de trabalho ágil se
transformou na nova forma de acele-
rar entregas. Nesse novo mundo,
também novas necessidades e com-
petências emergiram fruto de de-
mandas urgentes, de mudança nas
prioridades, de alternância nos pro-
blemas e de crescente rapidez na
busca de soluções.
O mercado de trabalho precisou
se adaptar e a reforma trabalhista
foi nessa direção, garantindo ao se-
tor privado maior flexibilidade. O

setor público, mais uma vez, ficou para
trás. A forma de contratação continua
a mesma, os contratos de trabalho con-
tinuam sendo quase que vitalícios e a
gestão de pessoas se vê comprometida
por estruturas de carreiras que em na-
da valorizam o mérito e tampouco ala-
vancam competências. Mas há agora
uma chance de avançarmos na direção
de flexibilizações também lá. Não é
uma reforma administrativa como a
que precisaremos enfrentar mais ce-
do, antes do que mais tarde. Mas já é
um primeiro passo nessa longa jorna-
da que nos espera.
Me refiro aqui à Medida Provisória
nº 922, pautada pelo presidente Rodri-
go Maia para análise pela Câmara dos
Deputados. A motivação da MP é a
atualização da legislação que rege a
contratação temporária no âmbito do
setor público. Embora já previsto na
Constituição Federal e regulamenta-

do pela Lei 8.745, esse regime de con-
tratação demanda uma urgente atuali-
zação. Ao ampliar as hipóteses que jus-
tificam a contratação temporária e pos-
sibilitar a contratação de servidores pú-
blicos aposentados e de militares da
reserva para o desempenho de ativida-
des temporárias, a MP 922 vai nessa
direção. Afinal, qual a justificativa para
a contratação de servidores estatutá-
rios para o desempenho de atividades
temporárias ou emergenciais – que
por definição se extinguem uma vez
atingidos seus objetivos – quando es-
ses servidores gozam de estabilidade
funcional e detêm vínculos empregatí-
cios que duram cerca de 60 anos? A
pergunta é simples mas a resposta cer-
ta, que é a contratação temporária, co-
loca gestores à mercê dos ministérios
públicos que insistem na abertura de
concursos públicos e na contratação
de servidores estatutários para o exer-
cício de toda e qualquer função públi-
ca, por mais transitória e simples que
seja a atividade.
Se aprovada, a MP 922 viabilizará a
atuação pontual e tempestiva do Esta-
do em ações que garantam um melhor
funcionamento da máquina como,
por exemplo, na redução de proces-
sos acumulados – caso dos pedidos de
aposentadorias no INSS; no atendi-

mento a situações de emergência hu-
manitária – como vimos ocorrer em
Roraima com os refugiados venezuela-
nos; nos projetos específicos de pes-
quisa e desenvolvimento ou mesmo
na atenção emergencial em casos de
calamidade pública que são, por natu-
reza, temporários e transitórios e não
justificam a contratação de servido-
res estáveis.
Estabelece-se assim o necessário res-
paldo jurídico para que essa agilidade
também contribua para evitar um in-
chaço ainda maior da máquina públi-
ca, com as conhecidas consequências
sobre os gastos públicos. Isso poderá
ser estendido para todas as esferas da
Federação, caso uma importante
emenda seja acatada, além de alguns
outros importantes avanços, se outras
duas emendas também forem incorpo-
radas ao texto final. Estas últimas res-
gatam alguns dos instrumentos de ges-
tão de pessoas que foram se perdendo
ao longo do tempo no setor público. É
o caso da emenda que propõem a exi-
gência de avaliação geral da política de
pessoal temporário, recolocando pla-
nejamento e dimensionamento corre-
to dessa força de trabalho na pauta e
também a de avaliação de desempe-
nho anual desses trabalhadores tempo-
rários. Garante-se assim que a qualida-

de do trabalho desses servidores se-
ja medido e avaliado, resgatando o
conceito há muito perdido no servi-
ço público no Brasil, onde o resulta-
do – e não o processo – deve nortear
o trabalho.
Todos essas questões ficaram ain-
da mais evidentes no atual momen-
to. Agilidade, flexibilidade, rapidez
de resposta, simplificação dos pro-
cessos e temporariedade são carac-
terísticas necessárias para que pos-
samos, como Estado, dar a resposta
que a população precisa. Se isso tu-
do já era importante antes para ga-
rantir ganhos de eficiência na máqui-
na pública agora, em tempos de pan-
demia, tornou-se imprescindível pa-
ra que possamos salvar vidas. Dado
que o governo não soube usar o tem-
po para atualizar nossa máquina pú-
blica lá atrás, enviando a proposta
de reforma administrativa, que ao
menos o Congresso use o entendi-
mento da temporariedade para
aprovar a MP 922 e fazer uma parte
desse dever de casa tão atrasado.

]
ECONOMISTA E SÓCIA DA CONSULTORIA
OLIVER WYMAN. O ARTIGO REFLETE
EXCLUSIVAMENTE A OPINIÃO
DA COLUNISTA

E-MAIL: [email protected]
ANA CARLA ESCREVE ÀS TERÇAS-FEIRAS

ABRÃO


Venda de carros deve se


manter fraca em maio


*Válido somente para assinatura digital completa ou impresso (fins de semana e todos os dias). Imagens meramente ilustrativas.

Saiba mais emclube.estadao.com.br


ou no app doClube+Estadão


Quer fazer parte doClube+Estadão?


Acesse assine.estadao.com.br ou ligue para 0800 770 2166*


Aprenda sem


sair de casa


Membro do clube tem


desconto exclusivo:


25%OFF na plataforma


de cursos online


Aprenda a treinar, cozinhar,


apresentar e muito mais.


Temporariedade


Cleide Silva


Pelos resultados da primeira
quinzena, as vendas de veícu-
los novos neste mês devem fi-
car próximos às de abril. Com
55,7 mil unidades comerciali-
zadas, foi o menor volume


mensal para o setor em 21
anos. Com quedas recorde e
estoques altos, as montado-
ras estão retomando gradual-
mente a produção sem ter ain-
da conseguido resolver o pro-
blema de liquidez.
As fabricantes reclamam do

problema desde o início da crise
e agora a preocupação aumenta
diante da falta de perspectivas
de um acordo com o governo pa-
ra a liberação de linha de crédito
com juros mais acessíveis ante
aos cobrados no mercado.
As montadoras afirmam ne-

cessitar de R$ 40 bilhões para
manter operações nos próxi-
mos três meses. O dinheiro se-
ria para pagar fornecedores e
dar suporte às concessionárias,
permitindo a atuação desses
segmentos até o arrefecimento
da pandemia do coronavírus.
A proposta das empresas é
que o governo, por meio do BN-
DES, convença bancos priva-
dos a liberarem crédito com ju-
ros e prazos acessíveis para o
momento de crise. Em troca,
oferecem como parte das garan-
tias R$ 25 bilhões que têm em
crédito a receber do governo fe-
deral e dos Estados por impos-
tos dos quais são isentas, mas
têm de recolher por uma “aber-
ração do sistema jurídico ”, afir-
ma o presidente da Associação

Nacional dos Fabricantes de
Veículos Automotores (Anfa-
vea), Luiz Carlos Moraes.
Ele ressalta que a falta de li-
quidez é problema de todos os
setores, não só do automotivo.
Ele defende uma solução sistê-
mica, que seria o governo assu-

mir o risco da garantia para to-
dos. “Nem todo mundo vai dar
calote e, mesmo que alguns
deem, a conta será menor do
que, por falta de condições, as
empresas deixarem de recolher
impostos, demitirem funcioná-
rios (que terão de receber o salá-
rio-desemprego), além do au-
mento da informalidade”, diz.
“O governo tem de tomar
uma decisão”, diz Moraes, res-
saltando que empresas de to-
dos os portes estão com dificul-
dades de obter crédito. O R$ 1,
trilhão liberado pelo Banco Cen-
tral não chega à ponta por causa
da preocupação dos bancos
com o calote, afirma Moraes.
Quando liberam, é com juro “ab-
surdo”, que chega a 20% ao ano,
e curto prazo de carência.

PANDEMIA DO CORONAVÍRUS


lConta menor

Petrobrás vê alta gradual do petróleo. Pág. B5 }


“Nem todo mundo vai dar
calote e, mesmo que alguns
deem, a conta será menor
do que, por falta de
condições, as empresas
deixarem de recolher
impostos e demitirem
funcionários.”
Luiz Carlos Moraes
PRESIDENTE DA ANFAVEA

Resultados dos primeiros 15 dias do mês apontam para número


semelhante ao de abril, que registrou pior desempenho em 21 anos

Free download pdf