O Estado de São Paulo (2020-05-28)

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B4 Economia QUINTA-FEIRA, 28 DE MAIO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO


P


rover estabilidade macroeco-
nômica – inflação controlada,
taxa de juros básica baixa,
câmbio menos volátil e, assim, ciclo
econômico mais suave – é responsa-
bilidade da União. Não é tarefa sim-
ples pois, por um lado, a sociedade
pune presidentes que geram instabi-
lidade, mas, por outro, demanda gas-
tos públicos enquanto desconhece
o quanto a estabilidade depende da
disciplina fiscal.
Decisões tomadas pelos demais
Poderes aumentam o fardo da
União. Despesas são criadas e re-
ceitas suprimidas pelo Judiciário e
Legislativo, sem qualquer ônus

aos mesmos. Na bondade com o cha-
péu alheio, a corda acaba estourando
no Executivo, sendo que o desrespei-
to às regras que regem o orçamento
federal – regra de ouro, Lei de Respon-
sabilidade Fiscal e regra do teto – é
passível de enquadramento como cri-
me fiscal, ameaçando o mandato pre-
sidencial.
Um passo foi dado em 2016 para, ao
menos, reforçar a disciplina fiscal des-
ses poderes. A partir de 2020, Judiciá-
rio, Legislativo, Ministério Público e
Defensoria Pública terão de se enqua-
drar na regra do teto. Seus gastos não
poderão crescer além da inflação. No
caso de descumprimento, o órgão não

poderá conceder vantagem, aumento
e reajuste de remuneração de seus
membros e servidores.
Outra inovação veio na Lei de Dire-
trizes Orçamentárias de 2018, que esta-
beleceu que “proposições legislativas
e as suas emendas (...) que, direta ou
indiretamente, importem ou autori-
zem diminuição de receita ou aumen-
to de despesa da União, deverão estar
acompanhadas de estimativas desses
efeitos”.
Já o cumprimento das metas orça-
mentárias continua sendo responsabi-
lidade exclusiva do Executivo. Haven-
do, por exemplo, uma frustração de re-
ceita, o custo do ajuste recai sobre ele
apenas.
O conflito entre Executivo e Legisla-
tivo é tema recorrente, principalmen-
te em países com regime presidencia-
lista. No parlamentarismo, as ações en-
tre esses poderes são mais cooperati-
vas, reforçando a disciplina fiscal.
O sistema político brasileiro alimen-
ta ainda mais o viés ativista do legislati-
vo e a indisciplina fiscal. A elevada frag-
mentação do Congresso e a falta de dis-
ciplina partidária estimulam decisões
individuais de legisladores.

Daí a importância de regras que, res-
peitando a independência dos Pode-
res, limitem seu poder discricionário.
As regras atuais disciplinam a ação do
Executivo, mas nem tanto a dos de-
mais.
Os problemas de coordenação não
terminam aqui. Estados e municípios
são responsáveis por prover serviços
públicos, como saúde e educação, mas
não são devidamente responsabiliza-
dos por suas decisões.
A Lei de Responsabilidade Fiscal
não tem sido plenamente aplicada, em
boa medida por ação do STF. Um exem-
plo é não validar a possibilidade de re-
dução temporária de jornada de traba-
lho com a redução dos vencimentos
nos Estados que não cumprem os limi-
tes para gastos com a folha – a realida-
de da maioria.
O STF também prejudica a discipli-
na fiscal ao autorizar, por meio de limi-
nares, que Estados não honrem suas
dívidas junto à União.
A crise atual exacerba essas tensões.
O socorro a Estados e municípios tota-
lizando R$120 bilhões (metade decor-
re de liminares do STF) e com contra-
partidas tímidas (apenas o não reajus-

te de salários por dois anos, um es-
forço modesto a julgar pelas atuais
expectativas inflacionárias) reflete
a dificuldade de ações cooperativas
em prol da disciplina fiscal.
Para muitos, é dever da União
socorrer os entes subnacionais em
situação de crise, devido à sua capa-
cidade de endividamento. Na dis-
cussão sobre a reforma do pacto
federativo, será necessário rever
esse ponto. Estados e grandes cida-
des poderiam ter seu “tesouro dire-
to”, mas sem garantias e aval da
União.
O desenho atual não tem dado cer-
to, pois os Estados gastam na bonan-
ça e, na crise, tentam passar a fatura
para a União, deixando de enfrentar
seus problemas fiscais estruturais.
Com a dívida pública crescendo
em ritmo explosivo, será crucial dis-
cutir como aprimorar o arcabouço
institucional que, direta ou indireta-
mente, rege os orçamentos públi-
cos, com vistas à disciplina fiscal.

]
CONSULTORA E DOUTORA EM ECONOMIA
PELA USP

ZEINA


LATIF


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Responsabilidade


fiscal para todos


Adriana Fernandes / BRASÍLIA


Contrariando a recomenda-
ção da área técnica, o plená-
rio do Tribunal de Contas da
União (TCU) deu sinal verde
para o governo federal conti-
nuar com a contratação emer-
gencial de militares da reser-
va e aposentados para a redu-
ção da fila do INSS. Os técni-


cos do TCU farão, no entan-
to, monitoramento da atua-
ção dos servidores aposenta-
dos e dos militares no traba-
lho para acabar com a fila.
O relator do processo, minis-
tro Bruno Dantas, indeferiu pe-
dido de cautelar recomendado
pela área técnica do TCU para
suspender por tempo determi-
nado o processo de contrata-

ção. Segundo ele, os indícios de
irregularidades levantados pela
área técnica poderão ser me-
lhor avaliados com maior pro-
fundidade na análise do mérito
do processo. “Não sendo neste
momento justificativa suficien-
te para suspender a contrata-
ção”, afirmou Dantas.
Dantas, inclusive, disse que a
contratação emergencial no

INSS poderá servir de piloto pa-
ra outros processos desse tipo.
O ministro Walton Alencar
Rodrigues aprovou a continui-
dade da contratação, mas pediu
o monitoramento a cada dois
meses. Ele alegou ter grandes
dúvidas sobre essa contrata-
ção, mas justificou que a apre-
ciação do mérito pode demorar
muito tempo. “As minhas dúvi-
das são gigantescas e são mons-
truosas. Eu não sei se os milita-
res terão condições de apren-
der as vicissitudes, os nuances
do exercício do cargo de audi-
tor do INSS para o deferimento
em massa de aposentadorias,
pensões, para o tratamento das
funções típicas do instituto”,
alertou o ministro.
Como mostrou o Estadão, a
área técnica do tribunal defen-
deu a suspensão de todo o pro-
cesso, que está em fase final pa-

ra a contratação dos seleciona-
dos. No parecer, a área técnica
do tribunal considera temerá-
ria a contratação de militar ina-
tivo das Forças Armadas para o
desempenho de atividades ci-
vis na administração pública.
Em janeiro, o TCU questio-
nou o recrutamento dos milita-
res para atuar na fila do INSS. O
ministro Dantas fechou um
acordo com o Ministério da Eco-
nomia para que aposentados do
INSS também pudessem parti-

cipar da seleção.
Na época, diante das dificul-
dades apontadas pelo governo
para a redução da fila, o relator
havia manifestado o entendi-
mento de que, embora não fos-
se o desejado, o recrutamento
de aposentados do INSS e mili-
tares poderia ser aceito excep-
cionalmente. O governo, então,
começou a seleção. A ideia ini-
cial do Ministério da Economia
era chamar 8 mil militares.

Fila. Atualmente, há 1,55 mi-
lhão de benefícios em análise.
Segundo o INSS, 615 mil benefí-
cios que dependem de análise
do órgão. Outros 940 mil já pas-
saram por análise e estão em exi-
gência, ou seja, dependem do se-
gurado enviar documentação
complementar para que o INSS
possa finalizar a análise do re-
querimento.

PANDEMIA DO CORONAVÍRUS


E-MAIL: [email protected]
ZEINA LATIF ESCREVE ÀS QUINTAS-FEIRAS

TCU libera contratação


de militares para o INSS


lAprovação com dúvidas

Adiada para hoje, votação da medida provisória que corta salário. Pág. B5}


“Não sei se os militares
terão condições de
aprender os nuances do
exercício do cargo de
auditor do INSS.”
Walton Alencar
MINISTRO DO TCU

Técnicos do tribunal, porém, farão monitoramento da atuação dos


contratados, o que inclui servidores aposentados, a cada 2 meses

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