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A6 Política SEXTA-FEIRA, 29 DE MAIO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO
Matheus Lara
A embaixada de Israel no Brasil
publicou uma nota em sua con-
ta oficial no Twitter em que pe-
de que não se use o holocausto
como parte de discursos políti-
cos e ideológicos. Mesmo que
de forma não intencional, desta-
ca a representação, o uso do ho-
locausto no discurso público
pode banalizar a memória e a
tragédia do povo judeu.
A publicação acontece após o
ministro da Educação, Abra-
ham Weintraub, comparar em
mais de uma publicação a opera-
ção da Polícia Federal no in-
quérito das fake news, anteon-
tem, ao nazismo.
Weintraub disse que a opera-
ção seria como uma versão bra-
sileira da Noite dos Cristais, co-
mo ficou conhecido o 9 de no-
vembro de 1938, quando sinago-
gas, lojas e residências judias fo-
ram atacadas por nazistas e ci-
dadãos alemães. O episódio é
considerado um marco no enri-
jecimento a perseguição do po-
vo judeu pelo regime nazista.
“Houve um aumento da fre-
quência de uso do holocausto
no discurso público, que de for-
ma não intencional banaliza
sua memória e a tragédia do po-
vo judeu. Pela amizade forte de
72 anos entre nossos países, pe-
dimos que a questão do holo-
causto fique à margem da políti-
ca e ideologias”, afirmou a em-
baixada, sem citar Weintraub.
Mais cedo, o cônsul geral de
Israel em São Paulo, Alon Lavi,
repudiou as declarações de
Weintraub. “O holocausto, a
maior tragédia da história mo-
derna, onde 6 milhões de ju-
deus, homens, mulheres, ido-
sos e crianças foram sistemati-
camente assassinados pela bar-
bárie nazista, é sem preceden-
tes. Esse episódio jamais pode-
rá ser comparado com qualquer
realidade política no mundo”,
escreveu Lavi.
Além da mensagem, o cônsul
ainda compartilhou publica-
ções do Museu do Holocausto
de Curitiba. Em uma série de
tuítes, a instituição comparti-
lhou materiais sobre o fato his-
tórico ao qual se referiu o minis-
tro. As publicações foram acom-
panhadas por uma arte com os
dizeres “Não é apenas uma nota
de repúdio”.
O Comitê Judaico America-
no, uma das principais organiza-
ções da comunidade judaica
nos Estados Unidos, pediu um
basta no uso político do holo-
causto por autoridades do go-
verno Jair Bolsonaro. “Chega!
O reiterado uso político de ter-
mos referentes ao Holocausto
por oficiais do governo brasilei-
ro é profundamente ofensivo
para a comunidade judaica e in-
sulta as vítimas e os sobreviven-
tes do terror nazista. Isso preci-
sa parar imediatamente”, disse
a associação no Twitter.
‘Direito’. O ministro comen-
tou as reações a seus comentá-
rios por meio da mesma rede
social. Em mensagem no Twit-
ter, Weintraub afirmou ter di-
reito de falar do holocausto por-
que tem avós, brasileiros, sobre-
viventes de campos de concen-
tração nazistas. “Não falem em
nome de todos os cristãos ou
judeus do mundo. Falo por
mim! Tive avós católicos e avós
sobreviventes dos campos de
concentração nazistas. Todos
eram brasileiros. Tenho direito
de falar do holocausto! Não pre-
ciso de mais gente atentando
contra minha liberdade”.
Caio Sartori / RIO
Cinco deputados que já foram
presos na operação Furna da
Onça assumiram ontem seus
respectivos mandatos na As-
sembleia Legislativa do Rio de
Janeiro (Alerj), após determina-
ção da Justiça. Nenhum deles,
contudo, ligou a câmera do com-
putador ao participar da sessão
virtual da Alerj ontem.
Os parlamentares André Cor-
rêa (DEM), Chiquinho da Man-
gueira (PSC), Luiz Martins
(PDT), Marcos Abrahão (Avan-
te) e Marcus Vinícius Neskau
(PTB) foram presos em novem-
bro de 2018, quando já estavam
reeleitos. Depois de uma série
de decisões judiciais em senti-
dos opostos, coube à Alerj, em
outubro do ano passado, após
votação, decidir pela soltura
dos deputados.
Uma vez soltos, os deputados
passaram a brigar na Justiça pa-
ra assumir os mandatos. On-
tem, a Justiça do Rio acatou de-
cisão do ministro Dias Toffoli,
presidente do Supremo Tribu-
nal Federal (STF), e encami-
nhou ofício à Alerj.
Dos cinco deputados que res-
tabeleceram mandatos, apenas
um deles, André Corrêa, apare-
ceu na sessão virtual – e sem li-
gar a câmera. Outros três se limi-
taram a participar do chat por
mensagem. Chiquinho da Man-
gueira não apareceu.
Risco. Mesmo empossados, os
deputados podem ser cassados
no futuro próximo. Está nas
mãos da Mesa Diretora da Alerj,
desde o início deste ano, um pe-
dido de cassação dos parlamen-
tares feito pelo PSOL. Com a
posse dos deputados, o texto de-
ve ser encaminhado em breve
ao Conselho de Ética, a quem
cabe dar seguimento ou não à
reivindicação.
Deflagrada em 2018 pela Polí-
cia Federal do Rio, a operação
Furna da Onça teve como foco a
participação de deputados esta-
duais do Rio em esquemas de
corrupção, lavagem de dinhei-
ro, loteamento de cargos públi-
cos e uso de mão de obra tercei-
rizada em órgãos da administra-
ção estadual. No dia 8 de novem-
bro daquele ano, a operação
cumpriu 19 mandados de prisão
temporária, três de prisão pre-
ventiva e 47 de busca e apreen-
são, todos expedidos pelo Tri-
bunal Regional Federal da 2.ª
Região (TRF-2).
Primeira-dama do Rio
passa mal e é hospitalizada
Israel critica citação de Weintraub ao nazismo
Camila Turtelli
Tânia Monteiro / BRASÍLIA
Diante do acirramento da cri-
se entre o presidente Jair Bol-
sonaro e o Supremo Tribunal
Federal, coube ao chefe do Le-
gislativo, o senador Davi Alco-
lumbre (DEM-AP), o papel de
bombeiro para tentar apazi-
guar os ânimos. O parlamen-
tar foi ao Palácio do Planalto
dizer a Bolsonaro ser preciso
“pacificar o País” e que os con-
frontos diários não levariam
a lugar algum. Como respos-
ta, ouviu do presidente mais
reclamações sobre a atuação
de ministros da Corte.
O encontro, fora da agenda,
ocorreu horas após Bolsonaro
ameaçar descumprir decisões
do Supremo Tribunal Federal.
Segundo interlocutores do Palá-
cio do Planalto, a reunião teve
momentos tensos e, inicialmen-
te, contou com a participação
dos ministros André Mendon-
ça (Justiça) e José Levi (Advoca-
cia-Geral da União).
Antes de se reunir com Bolso-
naro, Alcolumbre conversou
com o presidente da Câmara,
Rodrigo Maia (DEM-RJ), e mi-
nistros do Supremo. O recado
que levou ao presidente foi de
que algumas atitudes do chefe
do Executivo tem causado des-
conforto, como a participação
frequente nos fins de semana
em atos que pedem o fechamen-
to do Congresso e do STF.
O presidente do Senado tam-
bém relatou a Bolsonaro que
mais uma vez houve incômodo
com a conduta do ministro da
Educação, Abraham Weintraub,
que na quarta-feira comparou
uma operação contra apoiado-
res do presidente ao nazismo. A
comunidade judaica reagiu on-
tem (mais informações nesta pági-
na). Alcolumbre é judeu.
Em outro episódio que acir-
rou a crise com o STF, Wein-
traub defendeu em reunião mi-
nisterial no mês passado a prisão
dos magistrados da Corte. Após
a declaração se tornar pública, o
ministro da Educação foi convo-
cado para prestar depoimento.
Anteontem, o governo entrou
com um habeas corpus para que
ele não precise comparecer.
Ponte. O encontro com Alco-
lumbre fez parte de um esforço,
que envolveu também minis-
tros do próprio governo, para
reconstruir pontes com o Supre-
mo. Bolsonaro tem uma relação
mais próxima com o presidente
da Corte, ministro Dias Toffoli,
que está internado com suspei-
ta de covid-19.
Com isso, Alcolumbre fez a
interlocução com o presidente
em exercício do STF, ministro
Luiz Fux, e indicou a Bolsonaro
que o clima do outro lado da Pra-
ça dos Três Poderes estava
ruim para ele.
A avaliação é de que os ata-
ques que o presidente faz aos mi-
nistros Alexandre de Moraes e
Celso de Mello atingem todos os
demais integrantes da Corte, su-
gerindo que poderia partir do co-
legiado uma resposta coletiva.
“O Congresso atua em prol
do Brasil, como intermediário
na construção da paz, e em fa-
vor dos brasileiros, nesta qua-
dra difícil da história nacional”,
publicou o presidente do Sena-
do no Twitter no início da noite.
Antes da reunião de Alcolum-
bre no Palácio do Planalto,
Maia criticou as ameaças feitas
por Bolsonaro. “As declarações
de hoje (ontem) do presidente
são muito ruins. Vão no cami-
nho contrário de tudo o que a
gente começou a construir”,
afirmou, em entrevista na Câ-
mara. “Qualquer cidadão pode
recorrer de decisão de qualquer
ministro do STF, mas tem que
ser pelos caminhos legais, não
pela forma de tentar intimidar
ou acuar outro Poder”, comple-
tou. / COLABOROU JULIA LINDNER
Desaprovação
ao governo sobe,
diz Datafolha
RIO
A advogada Helena Witzel, mu-
lher do governador do Rio, Wil-
son Witzel (PSC), foi internada
de emergência ontem pela ma-
nhã. Alvo da operação da Polí-
cia Federal, anteontem, a pri-
meira-dama do Estado teria ti-
do um pico de pressão.
Em nota, o governo do Rio
afirmou que ela sentiu um
“mal-estar”. Helena foi levada
ao Hospital Central Aristarcho
Pessoa, no Rio Comprido, zona
norte. Witzel a acompanhou.
Segundo o Palácio Guanabara,
a primeira-dama foi examina-
da, liberada e passa bem.
A primeira-dama é considera-
da personagem central na inves-
tigação do Ministério Público
sobre o suposto esquema de cor-
rupção na Saúde durante a pan-
demia. Na manhã de terça-fei-
ra, endereços ligados ao casal fo-
ram alvo de buscas e apreen-
sões após a deflagração da Ope-
ração Placebo. O MPF mira con-
tratos do escritório de Helena
com uma empresa investigada
na Lava Jato. A suspeita é de que
ela não tenha prestado os servi-
ços pelos quais foi paga – o valor
é de R$ 540 mil.
A defesa afirma que a HW As-
sessoria Jurídica efetivamente
prestou os serviços, tendo recebi-
do honorários, emitido nota fis-
cal e declarado regularmente os
valores na declaração de impos-
to de renda do escritório. /C.S.
DIDA SAMPAIO/ESTADÃO–18/2/
Para embaixada, uso do
fato histórico no discurso
político ‘banaliza a
memória do povo judeu’;
ministro diz ter direito
Educação. Ministro comparou ação da PF ao holocausto
NA WEB
Blog do Fausto.
Furna da Onça e
outras ações da PF
estadao.com.br/e/blogdofausto
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Mesmo empossados, os
cinco parlamentares
ainda correm risco de
serem cassados no
Conselho de Ética
Deputados presos
na Furna da Onça
reassumem mandatos
LEOPOLDO SILVA/AGÊNCIA SENADO
Alcolumbre pede
a Bolsonaro para
reduzir ataques
Senador se reuniu com Bolsonaro após chefe do Executivo falar em
não cumprir ordem do STF, mas ouviu novas críticas dele à Corte
Agenda. Davi Alcolumbre durante sessão deliberativa; presidente do Senado conversou com Rodrigo Maia antes de se encontrar com Jair Bolsonaro
Gabriel Caldeira
A desaprovação ao governo do
presidente Jair Bolsonaro che-
gou ao nível recorde de 43%, se-
gundo pesquisa telefônica fei-
ta pelo instituto Datafolha no
início desta semana. Essa é a
parcela da população que consi-
dera a gestão ruim ou péssima.
Já os que a veem como ótima
ou boa são 33%.
Em relação à pesquisa ante-
rior, feita há um mês, a desa-
provação subiu cinco pontos
porcentuais, mas a aprovação
se manteve estável. Houve di-
minuição da parcela que vê o
governo como regular, de 26%
para 22%.
A pesquisa foi realizada após
a divulgação do vídeo da reu-
nião ministerial em que Bolso-
naro falou da necessidade de
proteger sua família e que, se-
gundo o ex-ministro Sérgio Mo-
ro, demonstrou ingerência inde-
vida na Polícia Federal. Entre
os que assistiram ao vídeo, a de-
saprovação ao governo ficou aci-
ma da média: 53%.
No segmento dos entrevista-
dos que ganham mais de dez sa-
lários mínimos, as opiniões so-
bre o governo são mais extrema-
das: 49% o qualificam como
ruim ou péssimo, e 42% o veem
como bom ou ótimo. No meio
do caminho, apenas 8% optam
pela classificação de regular.
Mulheres. A divisão dos entre-
vistados por escolaridade mos-
tra que a maior desaprovação
ocorre entre os que têm curso
superior: 56% – 20 pontos por-
centuais a mais do que na faixa
que cursou apenas o ensino fun-
damental.
Na divisão por gênero, a insa-
tisfação com a gestão é maior
entre as mulheres: 46%, em
comparação com 41% entre os
homens. Nas diferentes re-
giões, as maiores taxas de desa-
provação estão no Nordeste
(48%) e no Sudeste (45%).
O Datafolha fez as pesquisas
por telefone para evitar aborda-
gens pessoais, em razão da pan-
demia de covid-19. Como a me-
todologia é diferente, o institu-
to alertou que os dados devem
ser analisados com cautela.