O Estado de São Paulo (2020-05-30)

(Antfer) #1

Tiago Queiroz


“Minha casa é esse disco, esse dis-


co é minha casa” – foi com esse


mantra ecoando pelos ladrilhos,


paredes, violões e teclas do pia-


no e sob o impacto da solidão pro-


vocada pelo isolamento social


imposto pela pandemia de coro-


navírus que o músico Meno Del


Picchia compôs, tocou, gravou e


filmou o disco Pele de Água, com


oito músicas. Elas estão sendo


lançadas uma a uma em sua pági-


na no Instagram e em seu canal


no YouTube. O compositor pre-


tende reuni-las depois na plata-


forma BandCamp e esse será seu


quarto disco. O último, Barriga


de 7 Janta, foi lançado em 2016,


contemplado pelo prêmio


ProAC do Estado de São Paulo.


Seu bisavô paterno foi o poeta


modernista Menotti Del Picchia


e o materno, Zicão, compositor


de catira, moda de viola caipira.


Multi-instrumentista, com


paixão pelas quatro cordas do


contrabaixo, nascido em Campi-


nas, criado em Bragança Paulis-


ta, mas sobretudo paulistano, de


seus 43 anos de idade, mora na


capital desde os 18. Já tocou com


Ná Ozzetti, Karina Buhr, Tulipa


Ruiz, Bocato e Metá Metá, entre


outros. Hoje, integra a banda do


pernambucano Otto, mas, como


os demais colegas, teve shows


cancelados.


As canções gravadas nessas se-


manas já habitavam o dedilhado


do seu violão há anos. “O germe


desse disco está em 2017, quando


comecei a compor as músicas,


tanto letra quanto melodia. Esta-


va deixando para um dia gravá-


las, quando diminuísse a rotina


de shows, quando terminasse o


doutorado”, diz ele, que prepara


uma tese sobre o funk paulistano


para ser apresentada em uma ban-


ca, no curso de Antropologia So-


cial da USP. “Aí veio a pandemia,


a quarentena, e comecei a gravá-


las como forma de terapia, de não


enlouquecer em meio a tudo isso.


Foi um processo de enfrentamen-


to da pandemia. Para nós, músi-


cos, está sendo angustiante, não


sabemos quando vai voltar a ter


show, isso gera uma ansiedade ex-


trema, e fazer o disco me ajudou a


lidar com isso”, ressalta.


As músicas de Pele de Água fo-


ram todas compostas de voz, pia-


no, violão e baixo acústico de


uma maneira “bem orgânica”, co-


mo faz questão de definir. “Não


há nenhum instrumento ele-


trônico. Nem metrônomo, eu


usei. Deixei fluir.” Além da músi-


ca em si, também atuou, dirigiu e


filmou clipes ca-


seiros que produ-


ziu para cada can-


ção. “Na minha


pesquisa sobre o


funk na cidade, fil-


mei muito com o


celular, produzi


vários diários de


campo e essa vivência me ajudou


agora na produção dos vídeos”,


diz. Ele pretende – se tudo der


certo – defender no final do ano


sua tese de doutorado, que teve


lances inusitados: como forma


de imersão, ele morou alguns me-


ses em uma comunidade periféri-


ca da zona sul de São Paulo.


As letras tiveram a participa-


ção de amigos: em Meu Ouro é Ou-


tro, fez parceria com Anna Zepa


e, em Número da Sorte, com Poeta


Arruda. “Apesar das letras já esta-


rem escritas, muitas delas falam


de separação, solidão. Temas


que não envelhecem. O disco fala


de aceitar esses sentimentos.


Misteriosamente, apesar de falar


de um outro tipo de solidão (a se-


paração de um grande amor), ele


fala também desse momento, de


aprender a estar sozinho. Ele car-


rega um aprendizado que é atem-


poral e que casa muito bem com


o momento. Não é um disco feito


para a pandemia, mas ele se rela-


ciona com ela”, acredita.


Os vídeo foram feitos com a


câmera emprestada de um ami-


go. A casa, um simpático sobradi-


nho remanescente de uma outra


São Paulo, em uma calma rua do


bairro da Pompeia, serve como


fundo e personagem de suas pro-


duções. “Tanto eu como ela fo-


mos personagem das narrativas.


Produzir os filmes tornou a histó-


ria toda não só musical, mas ima-


gética também”, diz. Sem um ro-


teiro amarrado, o músico fez to-


madas de seu dia a dia nesse pe-


ríodo – em alguns momentos,


atua em situações


imaginárias: faz


as vezes de um tra-


balhador saindo


de casa, o trânsi-


to, a volta para o


lar, situações cor-


riqueiras de um


passado recente


que tanto se alterou.


Em outras situações, utilizou


imagens desfocadas, elementos


da natureza como o por do sol


que se esvai com delicadeza ou


os fios elétricos cobertos de vege-


tação em frente à sua casa. Ima-


gens de anotações, poesias, le-


tras e ideias para futuras can-


ções, escritas nos azulejos da co-


zinha – ele se abraça, encena uma


dança improvisada em um estrei-


to corredor, anda de bicicleta,


prepara o café e picha a parede de


sua própria residência com uma


frase libertadora. Em alguns mo-


mentos, nos mostra cenas da noi-


te, da bruma enevoada da madru-


gada. Períodos de insônia, en-


frentada por muitos que atraves-


sam esses dias. Um universo de


euforia, solidão, alegria e amor


contido na casa, no disco.


Sem intervalo


Música*


Adriana Del Ré


Os 20 mil fãs que conseguiram


ingressos para estar na O2 Are-


na, em Londres, naquele 10 de


dezembro de 2007, foram teste-


munhas de um momento his-


tórico: a reunião do Led Zeppe-


lin. Havia quase três décadas


que o vocalista Robert Plant, o


guitarrista Jimmy Page e o bai-


xista John Paul Jones não su-


biam juntos ao palco. Juntaram-


se ao baterista Jason Bonham


que ocupou o lugar do pai, John


Bonham, morto em 1980.


Quem estava ali acompanhou o


que deve ter sido, de fato, o últi-


mo show de uma das maiores


bandas de rock da história.


Devidamente registrado, o


show Celebration Day, como foi


batizado, poderá ser visto a par-


tir deste sábado, 30, às 16h (horá-


rio de Brasília), no canal oficial


da banda no YouTube, e ficará


disponível por 72 horas. Um pre-


sente da banda em tempos de


pandemia. Em 2012, a gravação


do concerto foi lançada em ver-


sões DVD, Blu-Ray e CD.


A reportagem do Estadão


fez a cobertura do show em


Londres. E viu no palco uma


banda em plena forma, como


se nunca tivesse parado. Um


Led Zeppelin catártico, que


não deu brecha para melanco-


lia, saudosismo, ou sentimen-


tos do gênero, celebrando sua


obra, extasiando a plateia. No


repertório, sucessos como


Black Dog, Kashmir e Whole Lot-


ta Love. E também um dos


clássicos-mor na voz de Plant,


Stairway to Heaven. De arrepiar.


SOLIDÃO EM


‘PELE DE ÁGUA’


‘PRODUZIR O FILME


TORNOU A HISTÓRIA


NÃO SÓ MUSICAL,


MAS IMAGÉTICA’


Mudança de Hábito/


Sister Act


(EUA, 1992.) Dir. de Emile Ardolino, com

Whoopi Goldberg, Maggie Smith, Har-

vey Keitel, Wendy Makkena, Kathy Naji-

mi, Mary Wickes.

Luiz Carlos Merten


Não é preciso ser Slavoj Zi-


zek para perceber as possibi-


lidades dessa comédia com


música, em que a corista


Whoopi Goldberg testemu-


nha crime e se esconde no


convento, como freira. Ela or-


ganiza coral de religiosas que


louvam o Senhor cantando


pop. Grande diversão, com


mensagem subliminar. Sexo


e religião.


MEGAPIX, 13H30. GLOBO, 13H55.

Filmes na TV


TIAGO QUEIROZ /ESTADÃO

Músico. Também


gravou vídeos


TOUCHSTONE PICTURES

SHOW DA


REUNIÃO DE


LED ZEPPELIN


NO YOUTUBE


Eliana Silva de Souza


Ainda dentro de casa


No dia 7, o Multishow vai


fazer a alegria dos fãs de


Manu Gavassi, com a trans-


missão da live Festa em Ca-


sa. Nesse dia, a cantora e


atriz estará ao vivo, das 19h


às 20h30, na emissora e no


canal Música Multishow, no


YouTube. Diretamente de


São Paulo, Manu promete


animar a noite com uma per-


formance intimista de suces-


sos que marcaram sua car-


reira musical, como Planos


Impossíveis, Garoto Errado,


além do lançamento mais


recente, áudio de desculpas.


Sinal aberto


A Band começa a exibir, a


partir deste sábado, 30, às


23h, a série Law & Order:


Investigação Especial. Cria-


da por Dick Wolf, a atração


mostra o trabalho investiga-


tivo do detetive Elliot Sta-


bler (Christopher Meloni) e


de sua parceira, Olivia Ben-


son (Mariska Hargitay). A


dupla procura desvendar


crimes variados e, no primei-


ro episódio, o desaparecimen-


to de uma jovem será o cen-


tro das atenções.


Tintas e pincéis


Estreia neste sábado, 30, às


22h, na TV Cultura, a série A


Arte da Rússia, que vai inte-


grar a faixa Cultura Mundo.


Em três episódios, a produ-


ção da BBC é escrita e apre-


sentada pelo historiador e


radialista britânico Andrew


Graham-Dixon. Na primeira


parte do documentário, as


raízes em Bizâncio, as obras


do pintor Andrei Rublev e ain-


da a visita ao mosteiro funda-


do por Ivan, o Terrível.


Novidade por aí


Evaristo Costa estreia o CNN


Séries Originais, que começa


a ser exibido neste domingo,


31, às 19h. O programa sema-


nal vai exibir documentários


jornalísticos. O primeiro vai


tratar sobre a busca pela cu-


ra do novo coronavírus, e


também o início da série


Bush, sobre uma das famílias


mais poderosas do planeta,


que já elegeu dois presiden-


tes americanos.


DESTAQUE A Noite dos Mortos-Vivos/


Night of the Living Dead


(EUA, 1968.) Dir. de George A. Romero,

com Duane Jones, Judith O'Dea, Russell

Streiner, Karl Hardman, Marilyn Eastman,

Keith Wayne.

Em 1968, Romero iniciou sua


série de mortos-vivos com fundo


social, para retratar os EUA de


seu tempo. Grupo isola-se numa


fazenda, que logo em seguida é


sitiada pelos zumbis. No ar, a ques-


tão dos direitos, que inflamava a


'América'. O racismo, portanto.


TEL. CULT, 22H. P&B, 96 MIN.

Eu Te


Amo


(Brasil, 1981.) Dir. e roteiro de Arnaldo Ja-

bor, fotografia de Murilo Salles, com Sonia

Braga, Paulo César Pereio, Vera Fischer,

Tarcisio Meira.

O filme do meio na trilogia entre


quatro paredes do diretor. Um ho-


mem e uma mulher, cada um com


sua história. Uma noite de sexo, a


possibilidade de um grande amor.


O casal se grava em vídeo. Jabor


antecipando que o mundo e o cine-


ma iam mudar.


C. BRASIL, 23H40. COL., 110 MIN.

OUTRA


Bisneto do modernista, o músico Meno Del Picchia


lança disco ‘orgânico’, com voz, baixo, piano e violão


TIAGO QUEIROZ/ESTADÃO

Terapia. Meno criou as letras em 2017 e as melodias surgiram como alívio para a pandemia


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H6 Especial SÁBADO, 30 DE MAIO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO

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