O Estado de São Paulo (2020-05-31)

(Antfer) #1

%HermesFileInfo:B-4:20200531:


B4 Economia DOMINGO, 31 DE MAIO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO


JOSÉ ROBERTO


MENDONÇA DE BARROS


A


pós três meses de distancia-
mento social, muitos Esta-
dos e municípios iniciam
uma cuidadosa volta à normalida-
de. Embora em poucos lugares se
tenha decretado o fechamento total
(lockdown), o confinamento come-
çou a mostrar resultados onde a pan-
demia se iniciou, que é o Estado de
São Paulo. Em particular, no municí-
pio da capital o processo está mais
avançado, como se pode verificar pe-
lo comportamento de uma curva
que mostra a evolução da média mó-
vel de sete dias de novos óbitos, que
parece estar se estabilizando. Um
indicador adicional é que a pressão

sobre o número de leitos de UTI dispo-
níveis amenizou.
Durante esse período, um número
limitado, porém relevante, de setores
teve desempenho satisfatoriamente
bom. São eles:


  • O agronegócio, que foi capaz de
    colher uma safra recorde e encami-
    nhá-la para os mercados.

  • A logística, incluindo a chamada
    última milha, que é a entrega no ende-
    reço do comprador final.

  • O comércio exterior, especialmen-
    te na exportação de produtos agríco-
    las, que tem batido recordes. Em boa
    parte, isso se deve à automação de ter-
    minais e sistemas de despacho de cami-


nhões e trens, que acabou com boa par-
te do congestionamento nos portos.


  • O sistema financeiro, no qual a ge-
    neralização do “home banking” é ante-
    rior ao “home office”. Nenhuma tran-
    sação deixou de ser feita.

  • O segmento de telecomunicações e
    de tecnologia da informação (TI), inclu-
    indo as empresas de base tecnológica.

  • Os setores do comércio ligados a
    alimentação, higiene, limpeza e farma-
    cêutica, bem como suas indústrias for-
    necedoras.

  • Os serviços de saúde e assistência,
    inclusive com expressiva elevação de


emprego e de recursos provenientes
de doações do setor privado.
Esses segmentos têm algumas carac-
terísticas comuns: todos tiveram muita
agilidade na introdução de protocolos
para evitar a difusão do vírus, sem parar
a produção e colocar em perigo a saúde
dos funcionários. Todos atendem às ne-
cessidades básicas das famílias.

Têm sido objeto de inovações tecno-
lógicas, elevação da produtividade e re-
dução de custos. Isso é chave. No caso
da saúde, são muitos os exemplos: de-
senvolvimento e produção de equipa-
mentos e serviços, inclusive respirado-
res, equipamentos auxiliares nos trata-
mentos e em cirurgias, desenvolvimen-
to de novos testes, nacionalização na
produção de certos sais etc.
Vários desses segmentos têm se be-
neficiado da desvalorização cambial,
especialmente porque os itens não co-
mercializáveis, como salários e logísti-
ca, ficaram mais baratos em dólares.
Por exemplo, pela primeira vez na his-
tória, a logística de grãos em Mato
Grosso ficou mais barata que a logísti-
ca do Meio-Oeste americano.
Existe uma clara indução para a ado-
ção de processos automatizados, até pa-
ra garantir o distanciamento social e evi-
tar o contato com cartões e dinheiro ou
automação de segurança residencial.
Durante esse período, muitas opor-
tunidades novas se tornaram visíveis,
desde as decorrentes da expansão da
área da saúde aos diversos serviços
prestados a distância e a possibilidade
de nacionalização de vários materiais

e equipamentos.
É uma chance que não podere-
mos perder, desde que a nova produ-
ção já se inicie minimamente com-
petitiva dada a desvalorização da
moeda brasileira. Entretanto, se for
para pedir subsídios em Brasília, se-
rá melhor nem começar.

* * * * * *
O que mais impressiona na grava-
ção da reunião ministerial é a total
falta de propósito, de agenda e de
rumo. Uma sucessão de falas desar-
ranjadas, patéticas e algumas aluci-
nadas, incluindo armar grupos de
militantes. O maior problema do
País, o coronavírus, não foi nem se-
quer mencionado.
É impossível dar certo qualquer
empreendimento com esse corpo di-
retivo. Especialmente, o Brasil.
E não se pode dizer que isso é por
conta do STF.

]
ECONOMISTA E SÓCIO DA MB ASSOCIA-
DOS. ESCREVE QUINZENALMENTE

E-MAIL: [email protected]

Na China, preço


do minério


dispara 24%


Matheus Piovesana


O aumento no número de ca-


sos da covid-19 no Brasil é um


fator de preocupação para a


economia brasileira, mas


também acende sinal de aler-


ta do outro lado do mundo.
Na China, principal parceiro
comercial do País, os preços do
minério de ferro dispararam
24% nos últimos 30 dias com os
negociadores temendo que a si-
tuação da pandemia por aqui

provoque interrupções na ca-
deia de fornecimento do mate-
rial – o que atrapalharia ou, no
mínimo, tornaria mais cara a re-
tomada da segunda maior eco-
nomia do mundo, primeira a en-
trar e a sair da crise causada pe-
lo novo coronavírus.
O Brasil não é o principal forne-
cedor de minério à China: esse
posto é da Austrália, que vende
aos chineses 63% do minério que
eles consomem. Entretanto, a
australiana Rio Tinto compete
de perto com a brasileira Vale no
mercado mundial. A Rio Tinto es-
pera produzir de 324 milhões a
334 milhões de toneladas de fi-
nos de minério em 2020; a brasi-
leira Vale, entre 310 milhões e
330 milhões de toneladas.
O mercado para ambas tem
se aquecido à medida que a Chi-
na retoma suas atividades no
pós-covid e, em maio, a tonela-

da do minério no porto chinês
de Qingdao ficou consistente-
mente acima dos US$ 90. Na
sexta-feira, deu um salto de 5%
e chegou a US$ 102. “O grande
ponto tem sido o Brasil se tor-
nar um epicentro da doença e as
operações da Vale serem parali-
sadas”, diz, sob condição de
anonimato, o analista de um
grande banco de investimento.
Ao peso da Vale na cadeia
mundial de minério de ferro se
soma, no curto prazo, um fator
sazonal que já havia reduzido,
até março, os embarques para a
China. O primeiro trimestre,
que em geral tem produção me-
nor no Brasil por conta das chu-
vas, foi ainda mais prejudicado
pela pluviometria em 2020. O
fator, que já havia aparecido
nos balanços de Vale, CSN e Usi-
minas, foi confirmado pela di-
vulgação do Produto Interno

Bruto pelo IBGE na sexta-feira.
A indústria extrativa no País
cresceu 4,8% em um ano, mas a
alta foi puxada pelo setor de pe-
tróleo e gás, que compensou a
queda na mineração. A produ-
ção da mineradora no primeiro
trimestre já havia dado uma pis-
ta do resultado. De janeiro a
março, a Vale extraiu 18,2% me-
nos minério em suas minas que
no mesmo período de 2019,
marcado pela tragédia de Bru-
madinho (MG).

Concorrência. Na semana pas-
sada, a China criou barreiras al-
fandegárias adicionais ao miné-
rio de ferro australiano, o que
despertou, no país da Oceania,
temores de que o produto brasi-
leiro seja liberado muito mais
rápido nos portos chineses. Adi-
cionalmente, as críticas da Aus-
trália à maneira como Pequim
lidou com a covid-19 têm leva-
do tensão à relação entre os
dois países. Mas, em eventual
cenário de problemas na mine-
ração brasileira, os chineses difi-
cilmente teriam para onde cor-
rer. “A China não deve impor
novas restrições à Austrália por-
que não conseguiria comprar
minério de outra região”, diz Da-
niel Sasson, analista de commo-
dities do Itaú BBA. Ou seja: pro-
blemas no Brasil podem abrir
mais espaço para o minério aus-
traliano no mercado chinês.

Se for para pedir subsídios


em Brasília, será melhor


nem começar


PANDEMIA DO CORONAVÍRUS


lEm alta


Algumas lições


da covid-19


Equipe econômica avalia programa de renda mínima. Pág. B5 }


US$ 102
foi a cotação da tonelada do
minério de ferro no porto chinês
de Qinqdao na última sexta-feira,
um salto de 5% ante o preço
médio em maio

Negociadores temem que crise da covid-19


no Brasil interrompa fornecimento ao país

Free download pdf