H1%HermesFileInfo:H-1:2020^0531 : DOMINGO,31DE MAIO DE2020 OESTADODES. PAULO
MARIO ANZUONI/REUTERS
Luísa Laval
ESPECIAL PARA O ESTADÃO
Cenas de funcionários utilizan-
do termômetros por aproxima-
ção à entrada de estabelecimen-
tos tornaram-se rotina em todo
o mundo. No Brasil, alguns su-
permercados e farmácias já apli-
cam o procedimento, e a tendên-
cia é de que a prática seja amplia-
da para grandes centros comer-
ciais, como shopping centers e
lojas de departamento. Isso por-
que a recomendação de aferir a
temperatura de clientes e fun-
cionários consta da cartilha de-
senvolvida pela Associação Bra-
sileira de Shopping Centers (A-
brasce). Essa indicação específi-
ca, porém, não está no protoco-
lo para centros comerciais di-
vulgado pelo governo do Esta-
do de São Paulo na quarta-feira
(27), que inclui boa parte dos
itens sugeridos pela Abrasce.
Dos 577 shoppings no País,
cerca de 100 já haviam sido rea-
bertos em mais de 50 cidades,
mesmo antes da abertura gra-
dual definida para São Paulo.
Na capital paulista, no entanto,
permanecerão fechados até o
setor e a Prefeitura acertarem
uma data e as precauções neces-
sárias para evitar o contágio pe-
lo novo coronavírus.
A maior parte dos centros co-
merciais em funcionamento no
País instalou no chão e em esca-
das rolantes indicações para pre-
servar o distanciamento social.
Os shoppings também operam
com horário reduzido e sem ofe-
recer serviços como estaciona-
mento com manobrista e em-
préstimo de carrinhos de bebê.
Eventos estão suspensos. Em di-
versos locais, foram instalados
tapetes com produtos bacterici-
das na entrada dos prédios e há
controle do fluxo de carros e pes-
soas nos shoppings, em banhei-
ros e em elevadores.
O presidente da Abrasce,
Glauco Humai, diz que os me-
ses durante e após a pandemia
serão de recuperação lenta, em
que haverá necessidade de re-
conquistar a confiança do con-
sumidor. “Nesse momento de
retomada, a gente não está preo-
cupado com vendas e fluxo, co-
mo recuperar 70 dias de vendas
em uma semana. Temos até o
compromisso de não fazer pro-
moções para
evitar aglome-
rações. A ideia
é resgatar a
confiança do
consumidor.
Queremos
que ele veja
que é um lu-
gar seguro, confiável e higieniza-
do”, diz Humai. “Olhamos práti-
cas da Ásia, da Europa e dos Es-
tados Unidos. Consolidamos es-
sas práticas junto com profissio-
nais da área da saúde, que confir-
maram a segurança dos nossos
procedimentos.”
Em Roma, por exemplo, a pro-
fissional de comunicação e
marketing Alessandra Olivari
relata que as lojas e supermerca-
dos também limitam a quantida-
de de pessoas circulando pelo
espaço, e muitas filas são organi-
zadas do lado de fora. “Se a loja
for muito pequena, só pode en-
trar uma pessoa por vez ou ha-
ver fluxo reduzido. Em lojas
maiores, funcionários contro-
lam a quantidade de pessoas en-
trando e organizam filas do lado
de fora”, conta Alessandra. “Em
todos os lugares, é fornecido ál-
cool em gel.”
As lojas afixaram cartazes
com regras de distanciamento e
orientações quanto ao uso obri-
gatório de máscaras e álcool em
gel, além de várias oferecerem
luvas descartáveis para clien-
tes. A recomendação de deixar
álcool à disposição dos compra-
dores está tanto na cartilha da
Abrasce quanto no protocolo
do governo de São Paulo.
Direto ao ponto. Nos shop-
pings que já reabriram, o tempo
médio de permanência dos
clientes diminuiu de 75 para 25
minutos, de acordo com o presi-
dente da Associação Brasileira
de Lojistas de Shopping
(Alshop), Nabil Sahyoun. “Co-
mo as pessoas estão ficando
pouco tempo,
dificilmente
haverá, princi-
palmente nos
próximos dois
meses, conges-
tionamento
no shopping.
Então, há bai-
xo risco de contaminação.”
Sahyoun reforça outros cuida-
dos para lojistas. Por exemplo:
em locais em que não há paga-
mento sem toque, a recomenda-
ção é plastificar e higienizar
com mais frequência as máqui-
nas de cartão. Também há a re-
comendação de instalação de la-
vabos e de frascos de álcool em
gel nos estabelecimentos.
“Toda referência que a gente
tem hoje foi buscada lá fora, co-
mo na China, que recomeçou
com mais antecedência. Tam-
bém tiramos modelos usados na
Europa e nos Estados Unidos”,
conta o presidente da Alshop.
“Existem grupos e lojas que têm
estabelecimentos no exterior.
Então, isso tende a ser padroni-
zado e há facilidade de intercâm-
bio de experiências. Muitas mar-
cas têm de seguir padrões inter-
nacionais de segurança.”
Em Santa Catarina, seis shop-
pings do grupo Almeida Júnior
estão abertos desde 22 de abril.
A empresa afirma que colocou à
disposição álcool em gel em vá-
rios pontos dos shoppings e más-
caras de algodão para todos os
funcionários da administração e
dos lojistas, além de ter determi-
nado espaçamento de mesas
nas praças de alimentação e res-
taurantes para garantir o distan-
ciamento social de 1,5 metro.
Funcionários colocam vasos de
flores para demarcar as mesas
que não podem ser usadas, a fim
de resguardar a distância.
O grupo afirma que o fluxo
médio de pessoas no último
mês, após a reabertura dos shop-
pings, foi de 43%, comparado
com o mesmo período do ano
passado. A companhia também
diz que a conversão do fluxo em
vendas tem sido muito maior
por conta do comportamento
conservador do consumidor,
que vai ao shopping para efe-
tuar compras
nas lojas que
deseja, e não
para passear.
Roupas em
quarentena.
Dentro das lo-
jas de shop-
pings, a ideia é instalar demarca-
ções no solo e higienizar os pro-
dutos. No caso de roupas, lojis-
tas são orientados a implemen-
tar sistemas similares aos usa-
dos em países europeus, como
Itália e Espanha, borrifando pro-
dutos desinfetantes e deixando
peças “em quarentena”, até que
elas possam ser experimenta-
das novamente. No comércio
de calçados, recomenda-se que
os clientes recebam meias des-
cartáveis para experimentar os
sapatos.
O professor de Epidemiolo-
gia Matemática da Fundação Ge-
túlio Vargas (FGV) do Rio de Ja-
neiro, Flávio Coelho, explica es-
se processo de desinfecção de
roupas e recomenda ainda que
lojas aumentem o número de
provadores, permitindo distri-
buir melhor as pessoas no am-
biente e, assim, evitar filas.
“No caso da prova de roupas,
as lojas devem ter algum meca-
nismo de rotação, como sepa-
rar algumas peças que serão de-
sinfetadas após a prova. Não
precisa ser uma lavagem, para
não desgastar, mas pode ser um
spray com uma substância antis-
séptica”, afirma. “Um processo
de quarentena da peça alguns
dias depois já bastaria para evi-
tar esse contágio. Isso não ne-
cessariamente afetaria o custo
do produto, mas as lojas teriam
de colocar mais pessoas monito-
rando isso, porque não é um pro-
cesso simples.”
Nas livrarias, o presidente da
Alshop recomenda que sejam
fornecidas luvas descartáveis
caso os consumidores queiram
manusear os li-
vros. “Antiga-
mente, não se
permitia que
você pegasse e
folheasse o li-
vro, o que foi
normalizado
depois como
estratégia de venda”, diz Sa-
hyoun. “Agora, um funcionário
pode pegar o livro e mostrar a
capa para o interessado, algo
que pode ser suficiente para
muitos, ou distribuir luvas des-
cartáveis para o cliente que fi-
zer questão de manipular o li-
vro. Essa é a melhor forma de
orientar os consumidores.”
Enquanto permanece a incer-
teza quanto à reabertura total
do comércio na maioria das ca-
pitais do País, empresários dos
setores de varejo preparam
seus estabelecimentos para se
adequarem às normas de pre-
venção ao novo coronavírus e a
futuras epidemias. Muitas des-
sas inovações são inspiradas
em experiências de outros con-
tinentes que já passam pelo pro-
cesso de reabertura e são ade-
quadas à realidade brasileira. Es-
pecialistas tentam buscar o mo-
delo do “novo normal” do con-
sumo, em que os conceitos de
necessidade, finanças, higiene,
espaço e locomoção ganham
um novo significado.
Pagamento por aproximação.
Segundo Carlos Denner, coor-
denador do laboratório de análi-
se de dados e desenvolvimento
de software Sociedados, da Uni-
versidade de Brasília (UnB), a
pandemia gera a oportunidade
para o uso de tecnologias já exis-
tentes mudarem o modelo de
negócio tradicional. Ele partici-
pa de um projeto de pesquisa na
Universidade de Quebec, no Ca-
nadá, e diz que a prática do paga-
mento sem toque (com uso de
cartões ou smartphones), por
exemplo, já é utilizada em mas-
sa no país.
“Corriqueiramente, no co-
mércio, as pessoas (no Canadá)
não tocam em máquinas. Você
aproxima seu cartão e já está pa-
go”, diz Denner. “No Brasil, a
tecnologia já estava disponível,
mas as pessoas não tinham mui-
to incentivo para usar. Agora,
haverá. Alguns conhecidos, do-
nos de pequenas fábricas de de-
senvolvimento de software, já
me relataram aumento de de-
manda por conta da crise.”
VOLTA?
COMO SERÁ A
NESSE MOMENTO DE
RETOMADA, A IDEIA É
RESGATAR A CONFIANÇA
DO CONSUMIDOR
LOJAS DE ROUPA
DEVERÃO COLOCAR
PEÇAS ‘EM QUARENTENA’
APÓS SEREM PROVADAS
NA
Caderno 2
Clint Eastwood chega aos 90 anos PÁG. H14
O governo de São Paulo anunciou na quarta-feira o plano
de retomada gradual da economia, e algumas regiões do
Estado poderão abrir, com restrições, escritórios, comér-
cio de rua e shoppings a partir de amanhã. Os setores res-
tantes terão de seguir um cronograma de fases e protoco-
los de segurança. Lá fora, EUA e países da Ásia e da Euro-
pa também afrouxaram as regras de isolamento, ainda
que o vírus demande um vaivém de medidas de restrição.
Os exemplos internacionais podem trazer pistas de como
a volta ao “novo normal” pode ser por aqui – de ideias so-
fisticadas, como robôs que medem a temperatura em um
shopping na Tailândia, a outras mais simples, como círcu-
los na grama para delimitar o distanciamento correto em
parques, vale tudo para garantir a segurança da popula-
ção e dos prestadores de serviço, ainda que com a volta às
atividades venha também o receio de sair de casa e en-
frentar multidões – o que pode ser bem comum neste mo-
mento, dizem especialistas ouvidos pelo Estadão.
Shoppings e outros
setores adotam
regras de segurança
Como escolas, hotéis e outros
setores estão se adaptando
QUARENTENA
PÁGS. H6 a H9
ATHIT PERAWONGMETHA / REUTERS
De olho. Temperatura de clientes na tela de loja em Tóquio
FRANCK ROBICHON / EFE
Tecnologia. Robô ‘oferece’
álcool em gel na Tailândia