O Estado de São Paulo (2020-05-31)

(Antfer) #1

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O ESTADO DE S. PAULO DOMINGO, 31 DE MAIO DE 2020 Especial H3


Leandro Karnal


l]
ESCREVE ÀS QUARTAS-FEIRAS E AOS DOMINGOS

Sem intervalo


Luiz Carlos Merten


Desde que surgiu num persona-


gem inspirado em James Dean


em Thelma & Louise, de Ridley


Scott, de 1991, Brad Pitt rapida-


mente se converteu em astro. A


união com Angelina Jolie trans-


formou o casal na dupla mais
famosa de Hollywood. Mais tar-
de, houve toda aquela confusão,
o divórcio litigioso. A novidade

é que parecem estar voltando.
Em 2007, só dava a dupla
“Brangelina” na mídia. Foi
quando ele fez O Assassinato de
Jesse James pelo Covarde Robert
Ford. O western de Andrew Do-
minik passa neste domingo, 31,
às 22 h, no Cinemax. Pitt faz o
lendário pistoleiro. O cinema
contou muitas vezes a história
de Jesse James. Um dos intér-
pretes mais famosos foi Tyrone
Power, na versão dirigida por
Henry King, de 1939.
Na versão de Dominik, Jesse
James está preocupado com to-
das as pessoas que acredita que

querem matá-lo. O assassino
será alguém de quem não des-
confia. Amizade e traição. Co-
mo e por que Gerald Ford ma-
tou Jesse James? Como wes-
tern, o filme está longe de ser
convencional. É lento, intros-
pectivo, mais drama – tragé-
dia – que aventura. Tudo
bem com Pitt. A surpresa é
Casey Affleck. Ele era apenas
o irmão de Ben Affleck, mas
foi nesse filme, como Robert
Ford, que se revelou o ator
excepcional que é (e recebeu
o Oscar de 2016 por Manches-
ter à Beira-Mar).

Jogador Nº 1/
Ready Player Oner
(EUA, 2018.) Dir. de Steven Spielberg, com
Tye Sheridan, Olivia Cooke, Ben Mendelsohn,
T.J. Miller, Simon Pegg, Mark Rylance.

Luiz Carlos Merten


É nostálgico o futuro distópico
do filme que Spielberg adaptou
do livro de Ernest Cline. Em
2045, a humanidade prefere vi-
ver no universo virtual do game
Oasis. Quando morre o inven-
tor, começa – no game – a dispu-
ta pela fortuna que ele deixou.
Grandes efeitos e um jovem
ator eficiente, Tye Sheridan, no
duplo papel de Wade e Parzifal,
seu avatar no jogo.
GLOBO, 13H37. COL., 139 MIN.

D


rusila Camargo e Maria An-
tônia Palhares são duas ex-
celentes filósofas. Cursa-
ram a graduação quase ao mesmo
tempo na USP. Ambas realizaram
dissertação e tese na mesma institui-
ção e terminaram por morar na
França para estudos de pós-douto-
rado. Drusila tornou-se referência
na obra do matemático e lógico bra-
sileiro Newton Carneiro Affonso da
Costa. Maria Antônia abraçou o em-
pirismo inglês e virou a mais abaliza-
da tradutora do escocês David Hu-
me na língua portuguesa.
Quase a mesma idade, mesma al-
ma mater, proximidade acadêmica:
tudo levaria a supor que o rio da ami-
zade fluiria solto entre as duas ilhas
de sólido conhecimento. Nada mais
falso. Por vários motivos, desde a
graduação, ambas desenvolveram
poderosa ojeriza. Odiavam-se, seria
mais correto afirmar. Os orientan-
dos sabiam que não poderiam fazer
curso com a rival. Os dois grupos

formaram partidos distintos, mutua-
mente excludentes e que desconfia-
vam dos neutros. Os próximos a Maria
Antônia batizavam os seguidores da
outra como “drusílios”. Os que eram
orientados por Drusila passaram a
usar a personagem “Tonha da Lua” (da
novela Mulheres de Areia) para descre-
ver Maria Antônia. Despontava nos
corredores da FFLCH da USP uma ver-
dadeira escola teatral: os grupos imita-
vam a rival, ora com frases formadas
de absurdos lógicos ou com a voz de
Marcos Frota na segunda versão da no-
vela, simulando alguém com proble-
mas cognitivos. Os orientandos forma-
ram um exército de haters. Não havia
chance de conciliação. Drusila era Car-
tago e Maria Antônia encarnava Roma:
só haveria espaço para um império do
Mediterrâneo Ocidental na Cidade
Universitária. Delenda!
Curioso: ambas eram produtivas co-
mo autoras e pesquisadoras e, igual-
mente, apreciadas como professoras.
As duas escreviam para os maiores jor-

nais de São Paulo em louvados artigos
de divulgação científica. O único incon-
veniente era quando alguém tocava no
nome da outra. Despontava a deusa Nê-
mesis. Parecia que a inteligência e a
filosofia eram afogadas em uma lama
sulfurosa. Os olhos se transformavam,
as mãos se crispavam e a voz de ambas
perdia o equilíbrio emocional.
O tempo passou e surgiu a aposenta-
doria. Duas brilhantes carreiras coroa-
das de conquistas e agraciadas com o
título final de professoras eméritas da
USP. Cerimônias lindas e, como man-
da o bom senso, realizadas em datas e
prédios bem distantes.
O destino é sempre bizarro. Depois
de reuniões no antigo prédio da reito-
ria, aconteceu de uma pegar o elevador
do quarto andar e a outra no terceiro.
Hora do lusco-fusco, pressa: nenhuma
percebeu até ser tarde demais. Cons-
trangimento profundo, quase físico.
Mas... eu falava de destino bizarro. Não
há acidente que não possa ser piorado.
Segundos após a constatação constran-
gedora, a energia entrou em colapso
no edifício. Agora, no escuro, as rivais
estavam condenadas a desfrutar da
companhia uma da outra. Drusila sol-
tou a primeira frase com verbo: “Ocor-

rer uma desgraça assim em uma sexta-
feira!”. A outra vociferou: “Eu não sou
uma desgraça! Você que é vergonha da
Filosofia brasileira”. As primeiras fra-
ses foram seguidas de 20 minutos de
acusações, ou melhor, insultos. Am-
bas temiam pelo momento em que
uma delas partisse para o ataque físi-
co. Cada uma se encostou em um can-
to do breu. Maria Antônia segurava li-
vros junto ao rosto para evitar um soco
furtivo. Drusila retirou os óculos com
a mesma preocupação. No meio da tor-
rente de ódio, uma delas fez a pergunta
que não queria calar: “Por que você me
odeia tanto?”. Instalou-se súbito silên-
cio. Odiavam-se há décadas, riam-se
uma da outra, ironizaram tudo, po-
rém, confrontadas com a questão origi-
nal, não tinham clareza do primo mobi-
le, o primeiro motor que colocara todo
o sistema da raiva em movimento. Por
que se odiaram? O silêncio foi ainda
mais constrangedor. Duas mulheres
brilhantes, de imenso sucesso e com
vida amorosa satisfatória. Não pode-
ria ser inveja ou cobiça, ambas tinham
em grau próximo o que (Acho que se-
ria: próximo do que) era notável na ou-
tra. As mães do ódio não sabiam quem
era o pai. Partenogênese?

A pane elétrica seguia criando cir-
cunstâncias. Maria Antônia refle-
tiu muito e proferiu a frase, hones-
ta enfim: “Você é uma mulher bri-
lhante. Eu sempre invejei seu... ca-
belo. Como você pode chegar a essa
idade com esse cabelo”? Drusila foi
alvejada pela sinceridade e disse
que o seio da rival era impecável.
Ali estava o não dito, o recalcado de
tantos anos. Surgira um pai enver-
gonhado. Sim, o cabelo de Drusila
era de um brilho intenso. O seio da
outra teria feito Hume entrar em
combustão espontânea. Depois
das frases, silêncio absoluto.
Quando, enfim, a energia voltou,
ambas saíram em silêncio. Combate-
ram estereótipos do feminino toda a
vida. Na rua, preocupados, os mari-
dos estavam nos carros aguardando.
Ao chegar junto ao titular de medici-
na da USP, a esposa ouviu o dr. Palha-
res reclamar da reunião de departa-
mento. “Aquele canalha do Paul Gus-
tavo, o careca da nefrologia, fez ou-
tra piadinha em sala sobre mim.” Ma-
ria Antônia sorriu ao imaginar qual a
parte do corpo do rival que incomo-
dava ao marido. Boa semana para
aqueles que não invejam ninguém.

A disputa


Brad Pitt, em


um western


muito pouco


convencional


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