O Estado de São Paulo (2020-06-01)

(Antfer) #1

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B4 Economia SEGUNDA-FEIRA, 1 DE JUNHO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO


A


s pessoas perguntam o que fazer
com os investimentos nessa crise. A
resposta correta é buscar preservar
a riqueza a todo o custo, privilegiando a
liquidez. No mundo das finanças, perse-
gue-se o equilíbrio entre risco e retorno.
Como resultado, a recomendação passou
a ser para o investidor jogar parado. A me-

lhor postura é ser conservador, alocando o
dinheiro em aplicações de baixo risco e de
alta liquidez. Assim, quem está fora do merca-
do de capitais, não é hora de entrar; e quem
está dentro, mantenha sua posição mesmo
com prejuízo econômico. Realizar o prejuízo
econômico significa transformá-lo em prejuí-
zo definitivo no bolso.
Aparentemente, a postura de um investidor
mais conservador tem se verificado. Basta ver
os números da caderneta de poupança e do
Tesouro Direto. O medo do desemprego e de
perda de renda têm provocado o crescimento
do saldo desses produtos. Segundo dados do
Banco Central (BC), abril de 2020 foi o mês

com maior saldo líquido em toda a história
da poupança, com saldo líquido positivo de
R$ 30,5 bilhões. Nesse número está parte do
auxílio emergencial do governo, admitindo
que muitos sacaram os R$ 600 imediatamen-
te. No Tesouro Direto, os números também
foram exuberantes, com o ingresso de 33 mil
novos investidores, alcançando 1.247.338 con-
tas e emissão líquida de R$ 1,6 bilhão, maior
valor da série histórica. O maior volume de
compras ocorreu nos títulos com vencimen-
to entre um e cinco anos (58,2%).
No entanto, o ingresso de pessoas físicas
na B3 tem mostrado que o risco também
atrai. Até maio, tivemos um crescimento de

42% em relação a 2019 em volume de con-
tas (mais de 700 mil novas contas), atingi-
do 2,4 milhões de contas de pessoas físicas
e R$ 285,4 bilhões investidos. A participa-
ção de pessoas físicas atinge 19,3% do total
da B3, proporção historicamente alta. Ape-
nas 16,3% são de pessoas com mais de 56
anos de idade, mas com quase 58% do to-
tal investido. Investidores entre 26 e 45
anos de idade são 60% dos investidores,
mas com 23% do valor aportado. Os núme-
ros mostram que há um grupo com apeti-
te de risco e que jogar parado não é uma
estratégia que, apesar de recomendada,
todos estão dispostos a seguir.

Márcio Kroehn


Todo investidor sabe que a Bol-
sa de Valores vive de expectati-
vas e busca antecipar cada um
desses movimentos. Se a pers-
pectiva for de crescimento da
economia, com empresas e seto-
res em expansão, é natural que
as ações ganhem força antes des-
se cenário se confirmar. Quan-
do o presidente Jair Bolsonaro
foi eleito, em 2018, a agenda libe-
ral do ministro Paulo Guedes pa-
ra a pasta da Economia, com o
rígido controle de gastos públi-
cos e a proposta de realização de
reformas em série, empurrou o
Ibovespa para uma valorização,
descontada a inflação, de 27,6%
no primeiro ano do governo.
Mas o coronavírus somado à ina-
bilidade do presidente da Repú-


blica para lidar com a pandemia,
associado à crise de confiança
instalada por ele em Brasília, fi-
zeram o sinal se inverter e os ga-
nhos do principal índice da B
viraram uma perda de 3,53% nos
515 dias de bolsonarismo até o
pregão da última sexta-feira, 29.
“Os números pontuam que o
Brasil é muito suscetível à parte
política e à diretriz da econo-
mia. Todos os países são, mas
aqui parece que é potencializa-
do”, diz o sócio da Arbitral Ges-
tão de Recursos Rodrigo Me-
non. “Se você pegar um governo
não tão radical, seja à direita ou à
esquerda, a bolsa brasileira ten-
de a responder em linha com os
países emergentes, especial-
mente os exportadores de com-
modities como minério, petró-
leo e, claro, agrícola.”
O primeiro mandato do presi-
dente Lula é um ótimo exemplo.
O mundo vivia um ciclo positivo
com as commodities e o Iboves-
pa refletiu esse bom momento,
com um ganho de 32,99% na me-
diana dos quatro anos, desconta-
da a inflação do período. Porém,

quando se compara o Brasil com
seus pares da América Latina, o
Ibovespa foi pior que indicado-
res de México, Colômbia e Peru.
Já no governo Bolsonaro, ape-
sar da queda, o indicador brasi-
leiro está melhor – ou menos
pior – que o de todas as demais
bolsas latino-americanas.

Os anos para esquecer. A tur-
bulência é um fator mais presen-
te na correlação entre política e
bolsa de valores desde janeiro
de 2011, quando a presidente
Dilma Rousseff assumiu seu pri-

meiro mandato, em 2011. Nes-
ses 10 anos, o País viu nascer a
dicotomia entre os que estão no
poder e os que estão fora dele,
passou por mais um processo
de impeachment e assistiu à pri-
são do ex-presidente Lula, co-
mo consequência das investiga-
ções da operação Lava Jato. O
grande momento para o Iboves-
pa é, justamente, durante o pe-
ríodo de Michel Temer, quando
o índice teve um ganho media-
no de 16,3% e deixou todas as
bolsas das Américas para trás.
“No segundo mandato de Fer-
nando Henrique Cardoso, a ren-
tabilidade da Bolsa no Brasil
também foi bastante significati-
va”, afirma Einar Rivero, geren-
te de relacionamento institucio-
nal e comercial da Economáti-
ca, que fez o levantamento his-
tórico com a rentabilidade dos
principais indicadores das bol-
sas mais importantes da Améri-
ca Latina e dos Estados Unidos
especialmente para o E-Investi-
dor/Estadão. “Mas dentro do go-
verno Dilma tivemos um desem-
penho muito pífio, mostrando

uma queda bastante significati-
va, principalmente no primeiro
mandato, quando a mediana foi
de -13,4%.”

Fator TEC. Um outro ponto a
ser observado é o setor das em-
presas que compõem os índices
de cada país. Durante o ciclo po-
sitivo das commodities, o Brasil
surfou a onda com as
ações de Petrobrás e
Vale, principalmen-
te, puxando o de-
sempenho do Ibo-
vespa. Mas, nos úl-
timos tempos, as
empresas de tecno-
logia são as que têm
sido a força por trás
dos melhores desempe-
nhos nos mercados acionários.
E a Bolsa brasileira é carente de
companhias que liderem trans-
formações digitais ou a inova-
ção de um segmento.
“Um terço do Ibovespa é for-
mado por ações de bancos. A
nossa Bolsa tem um peso relati-
vamente grande nesse setor,
que possui uma relação direta

entre a disponibilidade de crédi-
to e o desempenho do PIB”, diz
o analista independente de in-
vestimentos Marco Saravalle.
“O investidor tem cada vez
mais valorizado empresas de
growth, ou seja, que crescem
muito mais rápido do que a ativi-
dade econômica, como é o caso
das empresas de tecnologia.”
Esse é um dos fatores de-
terminantes para o des-
colamento das bol-
sas americanas em
comparação às de-
mais.
Nos últimos
anos, as ações que
formam o acrônimo
FAANG (Facebook, Ap-
ple, Amazon, Netflix e
Google) têm carregado o índice
S&P 500. Somente neste ano,
esses cinco papéis acumulavam
24% dos ganhos absolutos no
ano até a semana passada, ante
uma queda de 7% do indicador.
Para o investidor, olhar no retro-
visor é uma maneira de concluir
se o copo está meio cheio ou
meio vazio.

]
FÁBIO GALLO

●O desempenho das bolsas de valores da América Latina e dos Estados Unidos desde a eleição de Fernando Henrique Cardoso, em 1994


COPO MEIO CHEIO OU MEIO VAZIO?


FONTE: ECONOMATICA INFOGRÁFICO/ESTADÃO

FHC
1º mandato 2º mandato

(1) NASDAQ - COMPOSITE

RETORNO MÉDIO ANUAL DESCONTADA A INFLAÇÃO, EM PORCENTAGEM


(2)S&P 500 (3)DOW JONES INDEX (4)IBOVESPA (5)ÍNDICE PREC Y COTIZ (MÉXICO) (6)S&P MERVAL (ARGENTINA) (7)SP/BVL PERU GENERAL (8)COLCAP (COLÔMBIA) (9)IPSA (CHILE)









0

10

20

30

40

50

60

70

80

1234

567 89

1,

Jan/95 até dez/98 Jan/99 até dez/

Lula
1º mandato 2º mandato
Jan/03 até dez/06 Jan/07 até dez/

Dilma
1º mandato 2º mandato
Jan/11 até dez/

Temer

Ago/16 até dez/18 A partir de jan/

Bolsonaro

Jan/15 até ago/

4,47 32,99 6,4 -13,4 -0,46 16,3 -3,

123
4 5

678
9 1234 567 89 1

23
4 567 89 123

4 567 89
123

4
567

8
9 1234

56
7

8
9 123

4 567 89

lCorrelação

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Por que a política pesa tanto na Bolsa


Expectativa e atitudes do


governo têm um peso


maior para o Brasil


em comparação a


outros países


“Se você pegar um governo
não tão radical, seja à
direita ou à esquerda, a
Bolsa tende a responder em
linha com os países
emergentes, especialmente
os exportadores de
commodities”
Rodrigo Menon
SÓCIO DA ARBITRAL GESTÃO DE
RECURSOS
30%
DO IBOVESPA É
FORMADO POR
EMPRESAS DO
SETOR BANCÁRIO

Nessa crise, o melhor


é jogar parado, mas a


prática é diferente

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