O Estado de São Paulo (2020-06-02)

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%HermesFileInfo:B-1:20200602:B1 TERÇA-FEIRA, 2 DE JUNHO DE 2020 INCLUI CLASSIFICADOS O ESTADO DE S. PAULO


E&N


HÉLVIO ROMERO/ESTADÃO - 6/7/

ECONOMIA & NEGÓCIOS


Alta do dólar pressiona dívida e derruba


lucro das empresas em 70% no trimestre


Moeda americana registrou valorização frente ao real de 29% nos primeiros três meses do ano e foi a maior responsável pelo aumento


nas despesas financeiras das companhias; estudo analisou 183 empresas com ações na B3 que publicaram balanços até ontem


Superávit comercial recua 19,1% em maio


“Lição de casa foi feita, em certa medida, da porteira para dentro.”


Lorenna Rodrigues / BRASÍLIA


A pandemia do coronavírus le-
vou à queda nas exportações e,
em menor volume, nas importa-
ções em maio. Com isso, a balan-
ça comercial brasileira regis-
trou saldo positivo de US$
4,548 bilhões, o menor desde
2015 para o mês. O saldo é 19,1%
abaixo do registrado no mesmo
mês do ano passado – superávit
de US$ 5,624 bilhões. De janeiro


a maio, a balança comercial acu-
mula um saldo positivo de US$
16,349 bilhões, valor 19,5% infe-
rior ao mesmo período do ano
passado. Nessa comparação, as
exportações caem 4,5% no ano
e, as importações, 0,6%.
Em maio, as exportações re-
gistraram queda de 4,2%, amor-
tecida pelo aumento das ven-
das de produtos agrícolas, prin-
cipalmente para a Ásia. A despei-
to das desavenças no campo di-
plomático com os chineses, as
exportações brasileiras para a
Ásia cresceram 27,7% em maio,
com alta de 35,2% nos produtos
exportados para a China.
Já as exportações registra-
ram recuo de 1,6% ante maio de


  1. A queda “moderada” nas


importações foi influenciada
pela nacionalização de duas pla-
taformas de petróleo, no valor
de US$ 2,7 bilhões. Excluindo-
se as aquisições das platafor-
mas, as importações em maio
recuariam 21,7% e a corrente de
comércio, 11,5% (foi 3,1%), en-
quanto o saldo comercial subi-
ria 42,4% (ante recuo de 19,1%).
O presidente da Associação
de Comércio Exterior do Brasil,
José Augusto de Castro, prevê
que o saldo positivo da balança
em 2020 será causado por um
recuo nas importações, já que
as vendas ao exterior continua-
rão em queda. “O superávit do
Brasil em 2020 será o que cha-
mamos de ‘superávit negativo’,
porque vai se dar por fatores ru-
ins”, disse. Para ele, mesmo que
haja uma reabertura gradual da
economia, a demanda por im-
portados seguirá baixa, em ra-

zão do aumento do desempre-
go, que reduzirá o consumo.
Castro também vê um quadro
ruim para as exportações. “O pe-
tróleo aumentou a venda em
quantidade, mas o preço caiu
muito. O minério de ferro teve
queda na quantidade e o preço
subiu um pouco. E a soja tem
alta na quantidade, mas o preço
está caindo e o aumento se deve
mais a uma antecipação dos ex-
portadores, em razão da possí-
vel rivalidade com os EUA (na
disputa pelo mercado chinês).”
O secretário de Comércio Ex-
terior do Ministério da Econo-
mia, Lucas Ferraz, destacou o
crescimento de 5,6% no volume
exportado pelo Brasil, mesmo
em um cenário “extremamente
adverso”. Ele atribuiu a queda
de 4,5% no valor exportado à re-
dução de 15,6% nos preços dos
bens exportados pelo Brasil.

Renato Jakitas


Os sinais de melhora da eco-
nomia doméstica no come-
ço do ano atenuaram os im-
pactos dos primeiros 15 dias
da crise do novo coronaví-
rus nos balanços das compa-
nhias brasileiras de capital
aberto, no primeiro trimes-
tre de 2020. No entanto, a
disparada do dólar, que ga-
nhou força a partir do fim do
carnaval, foi suficiente para
azedar o resultado das ope-
rações. Mesmo com um cai-
xa reforçado em R$ 110 bi-
lhões, na comparação com o
mesmo período em 2019, as
companhias amargaram
uma queda de quase 70% em
seu lucro líquido.
Os dados fazem parte de um
estudo realizado pela Econo-
mática, obtido com exclusivida-
de pelo Estadão. Foram analisa-
das 183 empresas com ações ne-
gociadas na B3 e que publica-
ram seus resultados financei-
ros até às 18h de ontem. O estu-
do, no entanto, exclui da lista a
Petrobrás, JBS, Suzano e Azul,
que, segundo o gerente de rela-
cionamento institucional da
Economática, Einar Rivero, ob-
tiveram prejuízo atipicamente
alto e, por isso, prejudicariam a
análise econômica do período.
Feita a ressalva, a atual tem-
porada de balanços mostra que
as empresas brasileiras melho-
raram significativamente sua
geração de caixa – dinheiro man-
tido à disposição para as recei-
tas de curto prazo. O caixa das
companhias fechou o trimestre
em R$ 329,8 bilhões, ante R$
220 bilhões no mesmo período
de 2019, alta de 49,4%. O lucro
operacional (antes de despesas
com amortização de juros de
empréstimos e impostos) sal-
tou 30% no período. E isso só
foi possível, segundo Rivero,
por causa da melhora registra-
da com as vendas dos produtos
e serviços, que alcançaram o
montante de R$ 336,8 bilhões,
alta de 8,8%. “Os resultados
mostram que, em certa medida,
as empresas fizeram sua lição
de casa da porteira para dentro.


Mas quando encostaram a barri-
ga no balcão dos bancos e dos
credores, viram as despesas au-
mentarem muito”, afirma.

Dólar. A maior responsável
por essa explosão nas dívidas,
que dizimou R$ 39 bilhões em

lucro operacional, foi a escala-
da do dólar. Do primeiro pregão
de janeiro ao último de março, o
dólar comercial à vista sofreu
uma valorização frente o real de
29%, saindo da cotação inicial
de R$ 4,02 para R$ 5,19. Foi a
terceira maior valorização tri-

mestral do dólar desde a ado-
ção por parte do Banco Central
do câmbio flutuante, em 1999,
só perdendo para o terceiro tri-
mestre de 2002 e o primeiro tri-
mestre de 1999.
Dados produzidos pela Fipe,
indicam que as grandes empre-

sas brasileiras – com o capital
aberto e fechado – têm 58% de
sua dívida total fixada em moe-
das estrangeiras. De acordo
com o BC, a dívida total em dó-
lar das empresas no Brasil está
em US$ 482 bilhões. “Do ponto
de vista do que passou, pode-
mos dizer que o dólar afetou
fortemente nos balanços das
empresas brasileiras. Olhando
para o futuro, para o segundo
trimestre, é difícil imaginar um
novo tombo nesse patamar”,
afirma o coordenador do Cen-
tro de Estudos de Mercado de
Capitais da Fipe (Cemec-Fi-
pe), Carlos Antonio Rocca.
“Mas isso não deve ser tomado
com algo tão positivo. A redu-
ção drástica do consumo duran-
te a crise vai trazer para as em-
presas um outro desafio,
que será na receita com
venda, que deve cair tre-
mendamente nos balan-
ços do segundo trimes-
tre”, afirma.

Resultados. Por setores, as em-
presas financeiras, de papel e ce-
lulose e energia tiveram seus ba-
lanços mais afetados pelo au-
mento das despesas financei-
ras. A Klabin, por exemplo, re-
gistrou no primeiro trimestre
um aumento de 8% com as recei-
tas com vendas, na comparação
com igual período do ano ante-
rior, mas viu suas despesas com
dívidas saltarem de R$ 597 mi-
lhões para R$ 6 bilhões em 12
meses. Com isso, amargou um
prejuízo líquido de R$ 3,2 bi-
lhões.
O diretor financeiro e de rela-
ções com investidores da Kla-
bin, Marcos Ivo, explica, contu-
do, que esse é um prejuízo mera-
mente contábil, um resultado
que incomoda no balanço, mas
não diretamente no bolso da
empresa. “Nossa dívida é alta
em dólar, cerca de 89% do total,
mas é de longo prazo, em mé-
dia, 9,4 anos, e mais de 50% de
nossa receita também é dólar.
Com isso, temos um hedge na-
tural”, afirma. Hedge é o nome
que se dá aos instrumentos de
proteção à variação de câmbio
adotados pelas companhias.
“Nossa relação é bem equilibra-
da, no final das contas, somos
credores em dólar”, diz.
Outra que viu saltar sua des-
pesa financeira foi a Rumo, em-
presa de logística ferroviária
controlada pela Cosan. Esse in-
dicador passou de R$ 324 mi-
lhões em 2019 para R$ 531 mi-
lhões em 2020, fator que ajuda a
explicar o prejuízo de R$ 272 mi-
lhões no período, ante lucro
líquido de R$ 26 milhões no pri-
meiro trimestre de 2019. Para o
diretor financeiro da empresa,
Ricardo Lewin, além de ques-
tões pontuais, como um volu-
me de maior de chuva em mar-
ço, que prejudicou a operação
para empresa no Porto de San-
tos, a empresa também modifi-
cou a forma de mensurar os gas-
tos com proteção cambial. “Is-
so trouxe um resultado
negativo no trimestre,
mas que não deve se re-
gistrar no próximo ba-
lanço”, afirma o exe-
cutivo.

Einar Rivero, gerente de relacionamento institucional da Economática

PANDEMIA DO CORONAVÍRUS


● Saldo de maio das exportações e importações brasileiras

EM QUEDA

FONTE: SECEX/MINISTÉRIO DA ECONOMIA INFOGRÁFICO/ESTADÃO

MAI MAI
2019

JAN
2020

EM BILHÕES DE DÓLARES

-2,

0,

2,

4,

6,

8,

4,

‘90% dos setores têm protocolo de retorno’, diz secretário do Ministério da Economia. Pág. B3}


No mês passado, as


exportações brasileiras


caíram 4,2%, enquanto
as importações


tiveram recuo de 1,6%


FELIX LEAL- AEN

Câmbio. Klabin registrou prejuízo de R$ 3,2 bilhões no 1.º trimestre, em função do aumento com despesas financeiras

● Aumento da dívida das empresas comeram os bons resultados do primeiro trimestre

LUCRO LÍQUIDO EM QUEDA

EM MILHÕES DE REAIS

Lucro líquido final

Geração de caixa

Receita com vendas

Lucro antes de impostos e dívidas

Despesas financeiras

1º/TRI/2019 VARIAÇÃO

10.

220.

309.

30.

25.

1º/TRI/

3.

329.

336.

39.

58.

-69,6%

49,4%

8,8%

27,7%

129,8%

0

FONTE: ECONOMATICA INFOGRÁFICO/ESTADÃO
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