National Geographic - Portugal - Edição 231 (2020-06)

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tado Novo e as restrições impostas pela Segunda
Guerra Mundial impuseram contornos específi-
cos e determinísticos à nossa arquitectura”, defen-
de Maria João de Oliveira. “Normalmente apelida-
da de ‘tradicionalista’ ou até de ‘regionalista’ é na
arquitectura de Raul Lino que podemos encontrar
alguns elementos tímidos de biomimetismo nas
construções arquitectónicas – nas abóbadas, na
agregação volumétrica da composição geométri-
ca ou na implantação estratégica do construído
na paisagem natural... Ainda assim, não se pode
dizer que Raul Lino nos deixou uma arquitectura
com traços significativos de biomimetismo.”
As sementes de um biomimetismo aplicado à
arte, mesmo que não assumido, devem ser procu-
radas noutras áreas. “O biomimetismo em Portugal

Esta inteligente solução estrutural é um exem-
plo claro de biomimética inspirada num orga-
nismo ou numa unidade estrutural da natureza.
Neste caso, as cúpulas de ETFE imitam bolhas
de sabão e moléculas de carbono. Essas formas
permitiram uma grande adaptabilidade a uma
topografia irregular e uma disposição variável de
tamanhos e alturas. Outro exemplo semelhante
é o Estádio Olímpico de Munique, obra de Frei
Otto, inspirado nas asas das libélulas.
Por outro lado, os dois arranha-céus cobertos
de vegetação do Bosco Verticale de Milão, obra de
Boeri Studio, não imitam um organismo, mas um
ambiente, imitando as diferentes interacções de
um ecossistema. Utilizam a vegetação como ele-
mento construtivo e englobam várias medidas ins-
piradas no funcionamento natural para conseguir
máxima eficiência. O edifício de apartamentos
BIQ de Hamburgo, na Alemanha, desenvolvido
pela empresa internacional de engenharia Arup,
pretende reproduzir o comportamento da nature-
za, ou seja, a interacção entre os organismos e o
ambiente. Na sua fachada de vidro, são cultivadas
micro-algas produtoras de biomassa, que por sua
vez se transforma num biogás que sustenta ener-
geticamente o conjunto das habitações.
Outros designs foram concebidos com fórmulas
muito mais biomórficas, como o Pavilhão Qua-
dracci do Museu de Arte de Milwaukee, nos Esta-
dos Unidos, projectado pelo arquitecto Santiago
Calatrava. Esta estrutura complexa foi inspirada
nas asas de uma ave, abrindo e fechando ao longo
do dia como um chapéu-de-sol gigante que forne-
ce sombra ao espaço inferior.
Dois edifícios de culto religioso também colhe-
ram inspiração no biomimetismo. Um, o Templo
de Lótus de Nova Deli, obra do arquitecto iraniano
Fariborz Sahba, da empresa de engenharia Flint &
Neil, simula uma flor de lótus entreaberta. O outro
é a Sagrada Família, do universal Antoni Gaudí,
cujo interior, com as suas colunas ao estilo de ár-
vores e as suas abóbadas ramificadas com vitrais
verdes e dourados que permitem a entrada da luz
entre as folhas, reproduz o efeito de uma floresta
de pedra. Além de imitarem a natureza, estes dois
espaços geram uma atmosfera contemplativa e de
reflexão que procura uma relação interactiva en-
tre o público e a edificação.
Em Portugal, o movimento ainda não recolheu
adeptos suficientes para se expressar na arqui-
tectura. “Portugal tem, como sabemos, um delay
temporal nos seus movimentos de arte. A partici-
pação na Primeira Grande Guerra, a criação do Es-


© VON SCHLAICH

Inspirado por Frank Lloyd Wright e Mies van der
Rohe, cuja máxima era “menos é mais”, o arquitecto
alemão Frei Otto construiu formidáveis estruturas
inspiradas em elementos naturais, como conchas,
teias de aranha ou bolhas. Em 2015, poucos dias antes
de morrer, conquistou o prestigiado Prémio Pritzker.
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