National Geographic - Portugal - Edição 231 (2020-06)

(Antfer) #1

Outros não conseguem identificar-se com esse
período distante. Kenta, de 17 anos, é um ávido
jogador de computador. Acha que aquele dia “faz
parte do passado” e nem sabe ao certo quando a
bomba caiu. Supõe que tenha sido em 1964.
Por outro lado, Haruna Kikuno, de 18 anos, es-
tremece quando ouve aviões passar. Diz que leu
livros sobre a bomba quando era criança.


NO VOO entre Hiroxima e Tóquio, apresento-me à
família Hiyama. O pai, Akihiro, de 44 anos, cresceu
em Hiroxima, numa família de destacadas perso-
nalidades políticas. O seu avô, Sodeshirou Hiyama,
foi homenageado com uma estátua pelo seu contri-
buto para o renascimento de Hiroxima. Keiko Ochia,
a avó materna, disse-lhe que uma amiga sua pla-
neara viajar no dia em que Hiroxima foi bombar-
deada, mas adoeceu. Em vez de desperdiçar o
bilhete de comboio, ofereceu-o a Ochia. Pouco
depois, Ochia olhou pela janela e viu a nuvem em
forma de cogumelo. A sua amiga não sobreviveu.
Keiko tem agora um neto, Hiyama, que vive nos
EUA, no estado de Virgínia, onde conheceu Leah


Shimer em 2005. Casaram-se e têm dois filhos: Kai,
um rapaz de 7 anos, e Emi, uma rapariga com 5.
Durante a guerra, Sterling Arthur Shimer, o
avô de Shimer, ajudou a projectar os motores dos
bombardeiros B-29. Foram essas “Superfortalezas
Voadoras” que largaram dezenas de milhares de
toneladas de explosivos sobre o Japão, bem como
bombas incendiárias e, por fim, a bomba atómica
que dizimou Hiroxima.
Entre voos, eu, Hiyama e Leah falamos sobre
a guerra. Kai ouve, tentando perceber. “Mamã”,
pergunta, “o que é uma nuvem-cogumelo? Cabe a
Leah responder. “Poeira e destroços foram lança-
dos pelos ares quando a bomba explodiu”, diz-lhe.
“Foi muito triste. Morreram muitas pessoas.”
“Os ouvidos dele são doces e inocentes”, diz,
mais tarde. “Fico feliz por poder transmitir-lhe
algo sobre isto.” Kai tem mais uma pergunta:
“A América e o Japão ainda são inimigos?”
“Não”, responde a mãe, “são amigos”.
Ditas estas palavras, a família dirige-se
à porta de embarque para não perder
o voo de regresso a casa. j

QUANDO A BOMBA CAIU 41
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