National Geographic - Portugal - Edição 231 (2020-06)

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área marinha protegida é um pouco similar ao de-
pósito de valores num banco, na expectativa de
que sejam bem cuidados e possam crescer. “Serão
essenciais para ajudar a recuperar os stocks de pei-
xe sobreexplorados”, acrescenta.
O Parque Marinho Professor Luiz Saldanha é
uma das poucas áreas marinhas protegidas a nível
europeu que têm um programa de monitorização
de longo prazo que permite avaliar os efeitos das
medidas de conservação e a sua eficácia. Ao abri-
go dessa intervenção, a pequena pesca local bene-
ficia da existência do parque. Contrariamente ao
lamento mais ouvido nas sessões de 2003, não se
registam perdas de valor das vendas em lota e as
pequenas embarcações mais dependentes deste
parque marinho têm aqui um acesso exclusivo.
Apesar da sua criação em 1998, a área protegida
apenas entrou em funcionamento pleno em 2009,
com a promulgação do plano de ordenamento.
O balanço, portanto, faz-se só com uma década de
implementação. “Por um lado, existe mais cons-
ciencialização sobre a importância de proteger esta
área única no país e um benefício para a pequena
pesca local e conservação das espécies: comprova-
mos um aumento de efectivos e de biomassa”, diz
Emanuel Gonçalves. “Por outro lado, ainda persis-
tem actividades ilegais que prejudicam o esforço
colectivo de proteger esta área marinha nacional.”
A luz da manhã irrompe na baía de Sesimbra e,
por momentos, imagino o rei Dom Carlos no iate
Amélia nas primeiras campanhas oceanográficas
realizadas em Portugal. De certa forma, a grande
aventura oceanográfica moderna portuguesa co-
meçou também aqui, com esse projecto informal.
Num mar cor de estanho, vamos percorrendo
tranquilamente as milhas que nos separam de
mais um ponto de mergulho. Cada lugar da cos-
ta é um paraíso que queremos explorar. No fundo
rochoso coberto de gorgónias, um polvo espreita
curioso no seu esconderijo e deixa-se tocar. Quase
no fundo, com a coluna de água sobre mim, esta
espécie de cumprimento lembra-me uma frase de
Jacques-Yves Cousteau: “As pessoas protegem o
que amam e só amam o que conhecem.” j

“Há alguns anos, fui ameaçado de forma muito
grave por um pescador”, conta. “O caso chegou a
tribunal. Hoje, temos uma relação cordial e de res-
peito mútuo. Os pescadores compreendem a im-
portância do parque e hoje actuam como vigilan-
tes. Quando detectam uma embarcação de pesca a
actuar de forma incorrecta, comunicam connosco.”
A missão de vigilância não detecta irregularida-
des. Do ponto de vista jornalístico, é uma decep-
ção. Do ponto de vista conservacionista, regres-
samos ao porto de Setúbal com a consciência do
dever cumprido e de que o Parque Marinho Pro-
fessor Luiz Saldanha começa, de facto, a consoli-
dar-se como uma inevitabilidade.


AS VANTAGENS DE UMA ÁREA PROTEGIDA bem-su-
cedida fazem-se sentir na economia local. Sesimbra
é, há muito, a capital informal das actividades suba-
quáticas em Portugal. Os centros de mergulho
enchem-se todos os fins-de-semana com mergulha-
dores que afluem à pequena vila em busca de um
vislumbre da exuberância da vida marinha.
Com um mar quase sempre tranquilo, Sesimbra
é o lugar de eleição para mergulhadores mais ou
menos experientes. E ninguém quer mergulhar
num deserto subaquático. Os dados secos dos
censos de vida marinha materializam-se também
para estes utilizadores das águas locais. Generali-
zou-se a percepção de que existe mais vida mari-
nha e até mais diversificada. No passado, quando
a caça submarina era abundante, os peixes tinham
medo dos mergulhadores. Hoje deixam-se apro-
ximar. Constata-se essa certeza numa imersão
no destroço do River Gurara, no cabo Espichel.
A sensação é parecida com o interior de um aquário.
No périplo por estas águas, falta ouvir um dos
“pais” do Parque Marinho. Emanuel Gonçalves é
agora vice-presidente do MARE – Centro de Ciên-
cias do Mar e do Ambiente e administrador da Fun-
dação Oceano Azul. Ao fim de 22 anos, sente que
valeu a pena o esforço empreendido numa batalha
que chegou a parecer perdida. “As áreas marinhas
protegidas são instrumentos de gestão do oceano
que permitem alcançar objectivos de sustentabili-
dade e conservação da natureza”, diz. “E a ciência
mostra que, quando implementadas de forma efi-
caz e em áreas fortemente protegidas, produzem
mais peixe, peixes maiores e maior diversidade.
Desta forma, cria-se um banco de capital natural
que quanto maior for e mais protegido estiver, me-
lhores resultados vai ter.”
Nas palestras e entrevistas, Emanuel Gonçalves
utiliza com frequência a metáfora do banco. Uma


O tubarão-azul poderá ter
uma zona de maternidade
em redor do parque marinho.
“Durante a Primavera e
o Verão, temos filmado
inúmeros juvenis da espécie.”
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