National Geographic - Portugal - Edição 231 (2020-06)

(Antfer) #1
LIDERANÇA POLÍTICA 75

ALGUNS PAÍSES fizeram progressos significativos
no que diz respeito à participação das mulheres na
política, sem quotas obrigatórias. A Nova Zelândia,
primeiro país do mundo a conceder o direito de
voto às mulheres, em 1893, ocupa a 20.ª posição
mundial em termos de inclusão de mulheres no
Parlamento. Em comparação, os EUA estão no
81.º lugar, segundo a União Interparlamentar, uma
organização mundial de parlamentos sediada na
Suíça. Contudo, a admissão na política é apenas
parte do desafio. Em alguns países, a existência de
mulheres com papéis decisivos não significa neces-
sariamente maior igualdade de género para as
mulheres desses países. Para algumas mulheres,
como as parlamentares iraquianas, estar no poder
nem sempre significa ter poder.
Em tempos, o Iraque esteve na vanguarda dos
direitos das mulheres no Médio Oriente. A lei ira-
quiana do Estatuto do Cidadão, de 1959, restrin-
giu a poligamia e o casamento infantil, proibiu
os casamentos forçados e melhorou os direitos
das mulheres em matérias como o divórcio, a
custódia parental e o direito sucessório. A Cons-
tituição de 1970, redigida pelo partido secular de
Saddam Hussein, o Baath, consagrou a igualda-
de de direitos para todos os cidadãos. As taxas de
alfabetização, de educação e de participação das
mulheres no mercado de trabalho foram activa-
mente promovidas através de políticas generosas
como cuidados infantis gratuitos e seis meses de
licença de maternidade paga.
Esse progresso foi contrariado pelas sanções
internacionais e por décadas sucessivas de guer-
ra. Hussein foi um ditador brutal e assassino,
mas a sua queda em 2003 abriu caminho à as-
censão de funcionários públicos e parlamentares
religiosos conservadores que tentaram diminuir
os direitos das mulheres. Os partidos políticos
religiosos “não acreditam mesmo na participa-
ção das mulheres em cargos de topo”, diz Hanaa
Edwar, que trabalha na área dos direitos huma-
nos há mais de 50 anos.
Segundo a Constituição iraquiana pós-2003,
um quarto dos lugares parlamentares do país
está reservado às mulheres, mas, como qualquer
mulher sabe, estar presente não significa neces-
sariamente ser ouvido. De acordo com a deputa-
da Noora al-Bajjari, parlamentar de Mossul eleita
pela primeira vez em 2010, os partidos e blocos
religiosos que dominam o Parlamento “acham
que as mulheres só lá estão para compor os nú-
meros e não têm qualquer papel a representar na
tomada de decisões”.

Existem também desigualdades estruturais
historicamente incorporadas nos sistemas po-
líticos meritocráticos com neutralidade de gé-
nero. Estes sistemas sem quotas, como o dos
Estados Unidos da América, podem favorecer
grupos dominantes da sociedade, incluindo ho-
mens brancos e pessoas com recursos financei-
ros consideráveis. A superação de barreiras para
entrar na arena política é um desafio. Aquilo
que as mulheres podem, ou não, fazer quando
alcançam o poder é outro. A inclusão de mulhe-
res num partido ou num Parlamento pode ser
relevante para o tema da igualdade de género,
mas também pode ser meramente simbólica se
as mulheres políticas forem vistas, mas pouco
ouvidas. Existe ainda a questão de quais são as
mulheres com acesso aos corredores do poder e
até que ponto elas representam as outras – de-
safios enfrentados por vários países, incluindo
a Nova Zelândia e o Afeganistão. Apesar da in-
timidação, da violência e de outras barreiras,
mulheres de todo o mundo estão a manter-se
firmes, esforçando-se por conquistar e fortale-
cer o seu poder político.

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